Cena 7

7 1 0
                                    

A bordo da galera de Pompeu, junto do Cabo Miseno. Música. Entram dois ou três criados com uma mesa posta.

PRIMEIRO CRIADO — Vão chegar, homem! Vão chegar! Muitos desses caules estão com a raiz podre; o menor vento os lançará por terra.

SEGUNDO CRIADO — Lépido já está muito corado.

PRIMEIRO CRIADO — Fizeram-no beber o resto de todas as garrafas

SEGUNDO CRIADO — Quando eles beliscam reciprocamente suas disposições, ele grita: "Não prossigais!" reconcilia-os com suas súplicas e a si próprio com a bebida.

PRIMEIRO CRIADO — Suscitando com isso dissídio ainda maior entre ele e a própria discrição.

SEGUNDO CRIADO — Ora, isso acontece quando se tem o nome na companhia dos grandes homens. Prefiro um caniço que não me sirva para nada a uma partazana que eu não possa levantar.

PRIMEIRO CRIADO — Ser convidado para uma alta esfera e não ser visto mover-se, quando ela se desloca, é ser como essas órbitas sem olhos que deformam lastimosamente os rostos.

(Toque de trombetas. Entram César, Antônio, Lépido, Pompeu, Agripa, Mecenas, Enobarbo, Menas e outros capitães.)

ANTÔNIO — Assim fazem. Do Nilo a altura tomam por meio de umas marcas na pirâmide. Pela marca mais alta, média e baixa sabem se vai haver falta ou abundância. Quanto mais sobe o Nilo, mais promete. Quando reflui, o semeador espalha na lama e lodo os grãos, vindo a colheita pouco tempo depois.

LÉPIDO — Tendes por lá serpentes esquisitas.

ANTÔNIO — É verdade, Lépido.

LÉPIDO — Vossa serpente do Egito nasce do vosso lodo pela ação de vosso sol, o mesmo acontecendo com o crocodilo.

ANTÔNIO — É o que se dá, realmente.

POMPEU — Sentai-vos! Vamos ao vinho! À saúde de Lépido!

LÉPIDO — Não me sinto tão bem como quisera, mas nessas coisas nunca fico de fora.

ENOBARBO (a parte) — Enquanto não vos pondes a dormir. Mas receio muito que até lá ficareis dentro.

LÉPIDO — Não, é certo. Ouvi dizer que as pirâmides de Ptolomeu são coisas extraordinárias. Sim, foi o que me disseram.

MENAS — Pompeu uma palavra.

POMPEU — Segredai-ma. Que aconteceu?

MENAS — Deixa o lugar, meu chefe, para me ouvires uma palavrinha.

POMPEU — Espera um pouco. Vinho para Lépido!

LÉPIDO — De que jeito é o vosso crocodilo?

ANTÔNIO — Parece-se muito consigo mesmo, senhor, e é da largura que lhe é própria. Sua altura não passa da que ele tem, movimentando-se ele com seus próprios membros. Vive do que o alimenta e, uma vez dispersados os elementos, transmigra para outra parte.

LÉPIDO — De que cor é ele?

ANTÔNIO — De sua própria cor.

LÉPIDO — É uma serpente muito esquisita.

ANTÔNIO — Perfeitamente; e suas lágrimas são úmidas?

CÉSAR — Essa descrição o satisfaz?

ANTÔNIO — Sim, depois dos brindes de Pompeu. Fora disso, é um verdadeiro epicuro.

POMPEU — Ide enforcar-vos! Para que falar-me? Fazei o que vos disse. Que é da taça que vos pedi há pouco?

MENAS — Se por tudo quanto te fiz quiseres atender-me, deixa a cadeira e vem.

Antônio e Cleópatra (1607)Where stories live. Discover now