Borges
Volto pra boca, passando as mãos no meu rosto e logo desço do carro, ajeitando minha camisa no meu corpo, troquei de roupa depois de tomar um banho pra ver se relaxava. Travo meu carro, ouvindo até o barulho me irritando, papo reto mermo. Ando devagar, sentindo meu corpo relaxado, mas a cabeça tensa pelo jeito que eu deixei ela.
Troco as chaves de mão, passando a mão pelo meu cavanhaque, já sentindo os fios crescendo pelos lados, hoje à noite eu vou fazer, porque ela gosta feito. Olho pra frente vendo os caras do mermo jeito que eu deixei e logo assobio pro Choco vim até aqui, porque eu tô querendo distância de muvuca. Ele me olha e bate no ombro do Braz, fazendo ele acordar e os dois vem na minha direção.
Ajeito a arma nas costas e puxo um baseado, acendendo com o isqueiro quadrado. Acendo rápido, vendo a fumaça subir e logo os dois chegam perto de mim, bato minha kenner no chão, ouvindo o barulho e logo eles param na minha frente.
Choco: Fala, meu pitbull enraivado, fala que hoje eu tô animado - ele fala todo agitado e o Braz me olha com a cara de sono - Tá muito lindo hoje viu?
Eu: Ãhm, tô ligado - resmungo baixo, olhando pro cara do reflexo e ele não me olha de volta, apenas coça os olhos e ajeita a bandoleira do fuzil - Quero os dois comigo indo na concessionária, contenção tá ocupada resolvendo as parada da invasão, tá ligado?
Choco: Ainda, pô, comprar uma nave novinha, deixar forte mermo - ele pula na coluna do Braz e eu franzo as sobrancelhas, sentindo a fumaça fazer meus olhos arderem.
Braz: Vamo de moto, Choco - ele fala sério e se vira pra trás, caminhando até à XRE preta e o Choco manda beijo pra mim, indo atrás dele.
Fumo meu baseado, pensando um pouco sobre tudo que aconteceu nesses últimos dias e logo puxo meu celular pra mandar mensagem pra chorona. Tô ligado que falei besteira pra ela, ainda mais naquele momento, tinha nada a ver eu falar aquele bagulho, papo reto.
Todo bandido tem noção que o tempo é curto pra caralho, a gente entra nessa vida sabendo dos perigos e tudo que envolve o crime. Aceita quem quer, eu nem tive escolha, meu pai era traficante, eu seria o que? Estudar era um caralho, bagulho era o crime desde pequeno, nasci pra ser herdeiro, tava no sangue que eu ia assumir o império do seu Jorge. Mas não achei que seria do jeito que foi, matei ele e conquistei o meu com o meu próprio esforço.
A morte ela é inevitável, eu posso evitar por diversos meios, tô com a contenção justamente pra isso, mas não posso tomar controle de tudo, achando que meu peito é de aço. Mas eu erro quando falo sobre essa parada com gente que tá do meu lado, com a minha mãe eu já desisti de falar, porque ela custa a entender e com a pretinha eu não vou falar mais, porque já vi como ela fica apavorada, ver ela chorando pelo que eu falei me deixou mexido pra caralho.
Depois de tempo jogo a bituca pro lado, pegando as chaves da minha Evoque de novo, destravo e passo pela frente da boca, ouvindo as vozes dos caras lá dentro, tá geral convocando reunião pra planejar a invasão lá no Barbante, eu deixo nas mãos deles, só quero fazer o trabalho sujo e já era, pô.
Eu: Pega a frente e eu vou atrás, mas ajeita as armas pra não ficar aparente, hein porra? - falo com o Choco, apontando a glock cromada na direção dele - Vamo rápido e em dois tamo voltando.
Choco: Tô ligado, Toloce e Cuzinho vai seguir atrás e eu vou com o Braz na frente, tá ligado? - ele fala mais alto lá da outra calçada, levanto meu polegar e caminho até o meu carro, olhando a esquina cheia de moleque fazendo o plantão dessa rua de cá.
Olho os dois magrelo subindo na XRE vermelha e os outros dois vão na frente passando com a moto preta pelo meu carro. Entro na Evoque sentindo o cheiro da minha pretinha e logo passo a visão pra frente, vendo o tal do Toloce conversando com o Cuzinho, eles dão risada de alguma coisa e eu passo a mão no cavanhaque, sentindo um pouco de raiva.
Não gostei de ver esse viado conversando com a minha mulher, ele sabe que dentro do crime ninguém olha pra mulher de vagabundo, quando eu falo ninguém é ninguém mermo, principalmente se for gente de dentro do crime. Bagulho é esse, ninguém olha pra mulher de ninguém, principalmente se for a minha.
Ligo a Evoque girando o volante pro lado, ligo o ar e vou saindo pela rua estreita, virando na esquina que tá cheia de envolvido, eles levantam o fuzil quando eu passo e eu apenas buzino duas vezes pra não deixar no vácuo. Acelero meu carro, ouvindo o ronco do motor e vou dirigindo até à concessionária, ouvindo uma música no volume baixo, tava tocando Ret, mas eu tirei logo, aquele fudido me botou na merda mermo, todo mês é menos 100 mil na minha conta e isso é culpa dele.
Depois de mais ou menos 1h na estrada, eu estaciono no estacionamento da concessionária, ouço os sons de pneu de carro subindo a subida do local e o som fica mais aparente, por causa do local fechado. Olho ao redor vendo o chão todo cinza, típico de estacionamento de condomínio e logo vejo um Civic preto parando ao lado do meu carro. Guardo as chaves no bolso da minha calça e logo vejo uma morena descendo do carro, ela bate a porta se encostando em mim e se vira por cima do ombro, sem ter me visto aqui.
Xx: Aí, me desculpa, moço, nem tava prestando atenção - ela fala com vergonha e eu fico parado, olhando pra ela, que tá usando um macacão verde musgo que fica na medida do corpo dela - Me desculpa de verdade - ela sorri e eu mantenho a postura, concordando.
Eu: Tranquilo - travo minha Evoque e faço a volta no carro, caminhando pra outra subida, que é onde tá a entrada da concessionária, os caras tão na parte de fora pra não dar suspeita, eu entrei sozinho.
Olho a BMW num preto cromado, meu reflexo fica até aparente na lataria do carro, analiso o interior vendo os bancos na cor preta e passo a língua nos lábios, me vendo dentro dela, vou rodar o RJ com a minha pretinha e vai ser nessa porra aqui. Ergo meus olhos pra frente, vendo a mulher do estacionamento conversando o cara que tava me atendendo, ele fala com ela e me olha, apenas gesticulo com a cabeça e o idoso vem até onde eu tô, me olhando com um sorriso no rosto.
Manoel: Gostou do carro, Sr. Borges? - ele fala animado, mas eu sei que é pela comissão, apenas balanço minha cabeça, cruzando meus braços, vendo a morena atrás dele - Então é seu, tá no valor de 230 mil, mas se o senhor quiser fazer uma troca na Evoque o preço cai bastante - eu passo a língua no cantinho dos lábios e nego, ouvindo ele resmungar algo que eu não escuto.
Eu: Quero do jeito que tá, só quero que troque as rodas, manda colocar um aro maior, quero aquele que o senhor me mostrou, tá lembrado? - pergunto com a minha voz grossa e ele confirma, apertando minhas mãos, olho a mulher admirando o carro e volto a falar com o senhor - Vou fazer a transferência e o carro é meu.
Manoel: Vou organizar a papelada, se quiser já pode entrar no seu carro! Fez uma ótima compra, a Evoque eu falei a mesma coisa e tu não se arrependeu, digo o mesmo da BMW - confirmo e viro pro lado, vendo os caras pelo vidro transparente, o senhor vai até uma salinha, indo conferir toda a papelada, eu fico aqui esperando pra poder vazar.
Troco o apoio de perna, olhando as mensagens da pretinha reclamando comigo porque pode tá grávida, dou risada e logo mando um pix pra ela, apagando a tela do meu celular em seguida. Ouço o som do salto alto pisando no chão e a morena de antes olha meu carro e depois me olha sorrindo.
Xx: O carro é lindo, não sei se é mais bonito que o outro lá no estacionamento, mas é lindo - ela fala sorrindo e eu me viro pro lado, vendo uns carros saindo da concessionária, volto minha atenção pra ela e vejo seu olhar descendo pras minhas duas mãos, não vê aliança e sorri fraco, ajeitando o cabelo liso todo preto - O cheirinho de novo vai embora quando tu entrar, teu perfume vai ficar impregnado no carro - ela dá risada e eu vejo o Braz me olhando lá de fora pelo vidro transparente, mas logo me viro respondendo ela.
