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Caipora

Um dia eu estava indo catar cupuaçu selvagem, era quase 18h quando entrei na mata perto da estrada de terra. Eu e meu amigo de infância fomos adentrando a mata cada vez mais, conhecemos a floresta como a palma da nossa mão pois fomos criados praticamente dentro dela. Porém, mesmo conhecendo levamos um facão, pra cortar nosso caminho e nos proteger caso necessário.

As curicas e os papagaios sempre nos observando e compartilhando informações entre si, gritos e gritos de pássaros conversando.

Ja estava ficando tarde e pergunto pra meu amigo se já era a hora de ir, tínhamos dois baldes quase cheios. Ele disse que não, porque tinha um pé de tucumã e que queria pegar uns. Então fomos até lá, sentados comendo um tucumã descascado ouvimos o canto de um pássaro diferente, tão diferente que as curicas ficaram em silêncio para ouvir. Um Uirapuru Verdadeiro cantava.

Um canto tão majestoso, como um solo onde todos param e escutam o cantor místico. E quando ele para nenhum barulho é feito na mata densa, um silêncio ensurdecedor é instalado, o ar fica cada vez mais pesado. E então, outro canto é escutado. Mas não era um canto comum e sim um assobio, um assobio de aviso, aviso de algo muito maior.

Sempre ouvíamos histórias de barulhos assim, um aviso da chamada Caipora, um ser místico que habita nas florestas e protege os animais de caçadores. E para anunciar sua chegada, grita um assobio para espantar quem conhece a história. E quem não sair da mata assim que ela expulsa, a pessoa sofre uma morte sofrida e violenta.

Então pego o meu balde e corro por nossa trilha, meu amigo está bem atrás de mim, correndo e olhando pra trás. Sons de galhos e barulho de folhas sendo esmagadas é ouvido por trás, onde não há ninguém. Ventos fortes mexem o topo das árvores, a noite chega cada vez mais forte, é quase uma escuridão total, então abro mais uma trilha com o facão onde acredito ser a direção leste.

Parecia nunca chegar na beira da estrada, então corto com mais força os matos ao nosso redor, onde cada vez chega mais perto o assobio. É quando alguns cipós enroscam em minha não fazendo com que solte o facão e o balde com as frutas. E meu amigo imediatamente joga o balde dele para me ajudar a sair daquelas raízes.

Sem fruta e nem facão, fomos correndo por meio dos espinhos e urtigas na noite escura da floresta. Corremos apenas mais alguns metros e conseguimos chegar na beira da estrada. Onde corremos em direção da cidade, até os assobios cessarem.

No fim percebemos que na floresta, quem manda é ela, e nós só obedecemos.

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⏰ Última atualização: Dec 09, 2023 ⏰

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