Jane Cordero
Passamos o resto do caminho em silêncio, cada um encarando a sua frente. Na verdade, estou usando o meu campo de visão a meu favor e observando discretamente ele dirigir.
Ele tá dirigindo com uma mão só...
Fico tão distraída com a vista que só percebo que chegamos quando ele sai do carro, sai rapidamente antes que ele abra a porta para mim.
Entramos na casa na árvore, ele acende as luzinhas e nos sentamos um de frente para o outro.
Silêncio.
Como entrar nesse assunto?
Já sei.
– O que exatamente você ouviu para achar que nós somos irmãos?– olho atentamente em seus olhos.
Ele abre a boca e depois fecha, hesitando antes de responder.
– Minha mãe falando que ele devia tratar melhor a filha dele e ele dizendo que você– aponta para mim– não é filha dele.
– Aaaah... Sua mãe nunca te contou nada?
– Não... E... o que você tinha pra me contar?
– É verdade– suspiro –, quer dizer, a parte de eu ser filha do Guilherme, não a parte de que nós somos irmãos.– quando digo isso o brilho parece voltar a seus olhos– Minha mãe teve um caso com ele anos atrás que me gerou, eles tinham um passado. Minha mãe me contou tudo ontem, eu ainda tô processando.
– Uau, nossa. Tá, e o restante? Por que não somos irmãos? Eu fui adotado e não tô sabendo?
Solto um riso.
– Não, você não foi adotado. Na verdade, você é filho biológico do meu pai– fecho os olhos, me confundindo –, o Michael.
Ele arregala os olhos ao mesmo tempo que sorri, é engraçado.
Sei que essa felicidade não é só por causa do Michael.
– O Michael é um ótimo pai, melhor que o Guilherme, até pra mim.
– Um pai maravilhoso, eu sempre vou ver ele como meu pai independente de tudo, a verdade é dolorosa...
– É... Nossa, sinto muito. Ninguém merece o Guilherme como pai.
– Pois é...
A tensão no ar trouxe um pouco de silêncio.
– Parando pra pensar... É.– ele solta um riso– Temos um irmão em comum mesmo que não sejamos.
– Nossa é verdade.
Rimos juntos com essa descoberta.
Ele está se referindo ao meu, quer dizer, nosso irmão mais novo, o Maven, que é filho da minha mãe e do nosso pai.
– Posso confessar uma coisa meio óbvia?– meu coração se acelera, já imaginando o que ele vai falar, assinto. – Eu tô muito feliz e aliviado de saber que não somos irmãos.– diz me olhando atentamente e meu coração acelera mais ainda.
Ficamos nos encarando, eu sem coragem de fazer e falar nada.
Nossos olhares começam a alternar entre lábios e olhos. Meu coração parece que vai sair pela boca.
De repente a única coisa que passa pela minha mente é beijá-lo. Continuo parada sem coragem de fazer nada.
A frase que minha mãe sempre diz quando quer fazer algo invade a minha mente: "só se vive uma vez".
Tomada por uma coragem que desconheço, fecho os olhos quando puxo a gola de sua camisa e selo nossos lábios.
Fico parada esperando ele corresponder, vamos ignorar o fato que é porque não sei beijar.
Seu braço me abraça pela cintura, me puxando um pouco para mais perto. Nossos lábios entram numa dança sincronizada e eu aproveito cada segundo.
Com a minha mão livre, descanso meu braço por trás de seu pescoço. Nossos pernas se entrelaçam, nossos joelhos parecem elétricos.
Me sinto a pessoa mais feliz do mundo.
Sua língua pede passagem suavemente e eu a deixo passar, encaixo meus movimentos nos seus.
Obrigada tutoriais do YouTube por me ensinar como corresponder nesses momentos.
Não consigo conter a vontade de sorrir, eu ficaria assim por horas.
Nos separamos quando ficamos sem fôlego, com as testas encostadas aproveitando a vista.
– Eu esperei tanto tempo por isso, Solzinho.– sem saber o que responder apenas continuo sorrindo.
Abelhas invadem meu estômago.
[...]
– Como foi o encontro hoje, filha?– mamãe entra animada no quarto depois de bater na porta.
Largo o celular na mesinha de cabeceira e me sento na cama, com um sorriso enorme no rosto. Mamãe se senta à minha frente.
Comecei a lembrar de todos os detalhes e meu sorriso sumiu.
– Quando a gente tava no restaurante, bem na hora que eu ia contar tudo pra ele, cê acredita que a dona Laura apareceu.
– Ah não.– fez cara de desgosto – E aí?
– Ele disse que a gente tinha umas coisas pra resolver pra nos tirar daquela situação. E ainda, mãe do céu, ele pagou a conta quando eu fui ao banheiro.
– O Michael fazia isso nos nossos primeiros encontros, o Pedro deve ter aprendido com ele. – ela sorriu orgulhosa – E depois?
– Ele me levou pra casa na árvore, eu contei tudo pra ele...– pausa silenciosa – Rimos quando percebemos que temos um irmão em comum, ele confessou que ficou feliz e aliviado quando descobriu que não somos irmãos e ficamos nos encarando...
Me olhou com a sobrancelha levantada.
– Sabe aquilo que você fala que só se vive uma vez?– ela assentiu – Eu tava com vontade de beijar ele...
– VOCÊ BEIJOU ELE!?– seus olhos brilhavam e em seu rosto estava um sorriso genuíno, assenti envergonhada – E como foi? Você gostou?
– Eu quase não saí de lá.– falei cobrindo os olhos com as mãos.
Ela me olhou com os olhos arregalados.
– Aconteceu mais alguma coisa?– dessa vez foi eu que arregalei os olhos.
– NÃO, não. Relaxa mãe, ainda é muito cedo pra isso...
Uma batida soa na porta e depois Maven a abre.
– Ah, que bom que vocês estão juntas. Eu quero contar uma coisa, compartilhar um segredo.
– Senta aqui. – mamãe foi mais para a ponta da cama e bateu no espaço entre nós.
Ele se sentou entre nós e inspirou profundamente.
– Eu nem sei como começar...
– Só fala de uma vez. – soltei, curiosa.
– Eu... tô gostando de uma pessoa...– ele disse encarando o chão.
Arregalei os olhos, animada:
– Deixa eu adivinhar, Thomas?– o filho da Nicole, a melhor amiga da mamãe.
– Como cê-cê sabe?– ele parecia surpreso.
– Ah, Maven, pelo amor. Vocês vivem grudados, era meio óbvio.– falei dando de ombros.
– Sério?
– É, até eu percebi e olha que eu sou meio desligada das coisas. Mas assim– mamãe olhou para mim e depois voltou seu olhar para ele, e segurou em suas mãos –, você sabe que tem nosso total apoio, né?– ele assentiu.
– Eu sei e é muito importante pra mim, obrigado, mesmo.
Mamãe nos juntou em um abraço triplo.
– Eu amo tanto vocês, meus bebês.– eu e Maven rimos juntos.
– Nós também.