capítulo 9

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— POV: Cristal

Eu estraguei tudo. Se desde o início eu tivesse feito as coisas do jeito certo, não estaríamos assim. Poderia ser que eu fosse morta naquele depósito, sim, mas pelo menos eu teria tentado. Agora é tarde demais.

- Eu falei que ela não ia querer falar comigo — Eu falo quando Selena volta ao local em que eu parei, onde a Renata deixou claro o que ela pensava.

- Dá um tempo pra ela, patroa. Ela só precisa...

- Pensar? — Pergunto.

- As coisas vão se resolver — Ela tenta me consolar enquanto andamos de volta ao meu carro.

Eu quero acreditar que ela está certa mas, agora, não sei se consigo. Ficamos em completo silêncio até que eu deixo Selena na garagem. Ela se despede, mandando que eu fique bem. Como se fosse fácil assim.

Dirijo sem rumo até que me encontro no caminho do Mirror Park. Reconheço a rua onde acredito ter sido abordada. É horrível lembrar de tudo aquilo mas, sinceramente, é pior ainda pensar que eu poderia ter tido um encontro incrível com a Renata, talvez até pedido ela em namoro, para no fim ter tratado ela mal por conta dos meus medos.

Quando eu percebo, já estou atravessando a ponte, parando na ilha em que nos beijamos tempos atrás. Me encosto em uma árvore e abro o celular. Venho checando o Dark Chat incansavelmente desde que saí daquele depósito, temendo que ele decida divulgar as fotos de qualquer forma e que, assim, eu tenha feito aquela merda por nada.

Sinto um nó na garganta e fecho os olhos. Eu quero que a Selena esteja certa. Eu preciso que ela esteja.

     Escuto passos e, de reflexo, minna mão vai ao cabo da glock no meu bolso. Renata está do outro lado da ponte. Ela está parada, como se tivesse acabado de perceber que eu estou ali.

- Oi — Eu consigo dizer, sentindo o nó na minha garganta aumentar.

- Oi — Ela responde e começa a se afastar.

- Espera — Eu falo e ando até o início do meu lado da ponte — A gente pode conversar, por favor?

     Ela fica em silêncio, mas pelo menos está parada.

- Se você não quiser, tudo bem. Eu vou embora. Mas eu realmente preciso falar com você, Renata.

     Ela respira fundo e começa a andar na minha direção. Tento controlar minhas emoções. Não vou conseguir explicar nada direito se eu começar a chorar. Se controla, Cristal.

     Renata para na minha frente, apoiando-se na lateral da ponte. Cruzo os braços, repensando as minhas palavras.

- Eu não queria ter falado aquilo, muito menos daquela forma. Desculpa, de verdade. Eu... eu estava com medo do que poderia acontecer. Eu tenho medo de arriscar a vida das meninas, a minha e principalmente a sua. Eu não posso te perder, Renata.

- Do que você tá falando, Cristal? — Renata pergunta, confusa — Como assim arriscar nossa vida?

     É aí que vem a parte difícil. Tudo que queria era proteger a Renata e, ao contar o que aconteceu, eu vou estar fazendo o completo oposto. Mas ela merece saber e, como a Selena falou, nós podemos lidar com isso. Eu posso proteger ela de outras formas.

- Eu fui sequestrada, Renata. Eu não tinha ido pensar nem nada assim. Eu acho que foi o mesmo cara que me levou pra ilha e... ele me ameaçou e ameaçou todas vocês caso eu não terminasse com você — A medida que eu vou falando, sinto meus olhos começarem a embaçar, as lágrimas caindo contra a minha vontade — Eu não queria, Renata. Eu juro que eu não queria, mas eu precisava te proteger e eu achei que essa seria a melhor decisão. Eu me arrependo muito e eu entendo se você não quiser mais nada comigo, mas eu quero. Eu quero tudo com você, Renata.

     Ela não fala nada, como se estivesse processando o que eu falei. Tento limpar o meu rosto mas não consigo parar de chorar. Normalmente eu odeio chorar em público mas, nesse momento, não me importo o suficiente.

- Você tá bem? — Ela pergunta e eu concordo com a cabeça. O silêncio retorna.

     Renata se aproxima, se encostando ao meu lado. Ela continua em silêncio e eu faço o mesmo. Não tem mais nada que eu possa falar, é tudo decisão dela. Se a Renata decidir que nós acabamos, então é isso. Esse pensamento me deixa nervosa, mas me esforço para me acalmar.  Quando estou chorando menos, Renata começa a falar.

- O que a gente teria feito se tivesse vindo pra cá?

- Quê? — Eu pergunto.

- Se nada disso tivesse acontecido. Se a gente tivesse realmente se encontrado aqui.

     Ela está olhando para baixo, sem muita expressão. Nós teríamos conversado, teríamos rido e nos beijado e talvez eu conseguisse reunir coragem suficiente para perguntar se ela queria oficializar o relacionamento.

- Eu... eu não sei — Respondo.

- Eu teria te pedido em namoro — Renata fala e eu sinto as minhas pernas falharem — Você teria aceitado?

É estranho que eu nunca tenha pensado que isso poderia acontecer. Sei o que a Renata sentia (ou ainda sente?) por mim, mas nunca cogitei que seria ela quem tomaria essa iniciativa. Ela passou mais de um ano ficando com a Mimi e não houve um pedido, ela e a Mari eram muito complicadas e ela sempre foi de pegar todo mundo. Bem, eu também era, mas isso é irrelevante. A questão é que eu sempre achei que se isso virasse um namoro real, teria que ser por minha causa.

Agora, Renata está aqui, dizendo que teria me pedido em namoro se tivesse tido a oportunidade. Talvez eu tenha a subestimado um pouco.

- Sim, teria sim — Eu respondo. Não estou mais chorando, mas sinto que a qualquer momento posso desabar.

- Eu quero que isso dê certo, Cri. Quero muito. Mas não tem como um namoro funcionar se você ficar escondendo as coisas de mim, mesmo que seja com boas intenções — Renata fala.

- Eu sei, me desculpa. Isso não vai mais acontecer.

Renata finalmente olha para mim. A luz do fim do dia ilumina o seu rosto. Em outra situação, talvez eu me perdesse nesse olhar brilhante. Agora, porém, consigo ver mágoa nesse olhar. Não só isso. Ainda reconheço a forma apaixonada como Renata me observa, mas não parece a mesma coisa.

- Você tá bem mesmo, né? Não vai acontecer nada com você? — Ela pergunta, preocupada.

- Tô sim. Acho que não vai acontecer nada — Eu faço uma pausa — Pelo menos não agora.

Renata parece pensar um pouco, até que ela se desencosta da ponte e cruza os braços

- Eu preciso pensar um pouco, Cri — Ela fala, olhando para baixo — Só... me dá até amanhã.

Não consigo esconder o quão triste eu fico com isso. É claro que eu considerei que ela não aceitaria tudo de cara, que ela poderia precisar de um tempo ou até me rejeitasse de cara, mas depois que ela falou sobre namoro eu pensei que... não sei, imaginei que talvez eu não tivesse fodido completamente a nossa relação. Agora, não tenho tanta certeza.

Ainda existe esperança. Até amanhã, quando Renata decidir falar comigo, existe esperança.

- Tudo hem, eu entendo — Eu falo, segurando o choro — Me fala quando tiver pronta.

Decido ir embora primeiro. Não consigo mais ficar nesse lugar. Desabo assim que entro no carro. Nas próximas horas, o único pensamento que vai ocupar minha cabeça é que eu estou a um passo de ficar de vez com a mulher que eu amo ou de perder ela para sempre.

— POV: Renata

Entro no carro e seguro as mãos no volante, sabendo que não estou em condições de dirigir agora. Eu imaginei que algo assim poderia ter acontecido, mas a ideia de que Cristal foi sequestrada novamente, e pela mesma pessoa, me assusta muito. E me assusta mais ainda que ela se importou mais comigo do que com ela mesma.

Apesar da preocupação, não posso evitar a pequena felicidade que tive ao ouvir que ela não queria terminar. Ela ainda sente o mesmo, e ela teria aceitado o meu pedido.

Pego o meu celular e ligo para a Selena.

cristal escreveu algo - crisnataOnde histórias criam vida. Descubra agora