Nunca havia sentido tanta fúria quanto ele sentia neste exato momento. As palavras e a voz esganiçada de choro de Ruslan ainda ecoavam por sua mente como agulhas. Agora, mais do que nunca, Dimitri estava decidido com o que iria fazer. O seu mais novo objetivo era entrar na chapa de seu pai e derrubar aquele projeto desumano antes mesmo que ele saísse do esboço.
- Era doloroso... – Ruslan diz, ele não consegue nem manter a cabeça erguida ao falar daquela experiência. – eles nos mantinham em quartos apertados e poucas vezes saíamos de lá. Arrancaram nossas memórias e substituíram, fazendo-nos acreditar que éramos criminosos... – a voz completamente trêmula. Hassan estava ao seu lado e o acariciava para tentar mantê-lo calmo. – Cada dia dentro daquele maldito lugar parecia durar meses e tinham dias que eles nos torturavam... injetavam drogas em nós... a maioria enlouquecia... o ambiente era completamente sujo... as paredes descascavam e alguns até chegavam a comer a tinta seca...
Dimitri se lembra que nessa hora ele se levanta do banquinho onde estava sentado abruptamente, atraindo a atenção de todos no quarto. Seus punhos estavam fortemente cerrados e ele sentia um calor subir e tomar conta de todo o seu corpo, seu sangue fervia como lava borbulhante de um vulcão prestes a entrar em erupção. Hassan não se lembra de já ter visto Dimitri daquele jeito, ele costumava ser uma pessoa calma e serena, Dimitri nunca fora agressivo ou rancoroso com alguém, mas Andrei despertava algo nele como ninguém. Naquele momento, ele só pensava em machucar Andrei como ele havia o machucado. Mentindo descaradamente de que não fazia ideia de onde Ruslan estava e sem nem fazer esforço para fingir preocupação, da sua família, Dimitri fora o único que o procurara.
- Dimitri, não... – Hassan diz, se levantando depois de Dimitri.
- Ele precisa pagar! – Dimitri diz, cuspindo as palavras com acidez.
- E ele vai, isso eu te garanto! – Hassan o responde, com um olhar bravo. – Mas não há nada que você possa fazer sozinho.
- Vocês precisam parar! – ele volta a exclamar, implorando. – Já não é o bastante? Olha para onde isso os levou!
- E EU FARIA TUDO DE NOVO, EXATAMENTE DO MESMO JEITO! – Ruslan grita, também se levantando. – Você não é mais um menino, Dimitri. A minha cabeça pode estar correndo o risco que for... – ele se aproxima ainda mais do sobrinho. – eu NUNCA vou parar! Não vou ficar parado por puro medo e conforto. Quer se manter isento para continuar seguro? Que seja. Eu não vou ficar parado vendo mais vidas sendo ceifadas!
- Ruslan! – Hassan exclama, furioso. – Não é hora para isso, lembrem-se do porquê estarmos aqui.
Já na casa do Ministro, Dimitri anda pelos corredores em passos largos e apressados, procurando novamente por Ewa. Ele sentia uma necessidade gigantesca de esclarecer as coisas, por mais que várias delas estivessem fora de seu alcance naquele momento. Mas procurando por Ewa, Dimitri acaba se deparando com Andrei e ao olhar para aquele rosto, com aqueles olhos castanhos-avermelhados, aquele maxilar quadrado, a barba rala e os cabelos desgrenhados, Dimitri sentia nojo e desprezo.
- Por que não apareceu na reunião, Dimitri? – Andrei já pergunta, sem nem cumprimenta-lo antes.
- Acabei tendo que ficar até mais tarde na faculdade, saí de lá agora há pouco. – Dimitri esclarece, ainda com aquele olhar.
- Você quer mesmo fazer isso, Dimitri? – ele se espanta com aquela pergunta de seu pai e não consegue disfarçar sua expressão de surpresa. Andrei nunca havia demonstrado preocupação para com ele.
- Sim. – mas ele responde sem nem perguntar o que Andrei queria dizer. Dimitri sabia que não podia demonstrar fraqueza e questionamentos para com seu pai, tinha que fazê-lo acreditar que ele já estava decidido.
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2070
Science FictionALERTA: Por se tratar de uma distopia, esse livro pode conter cenas de extrema violência. Ao acordar em um lugar totalmente estranho, sem nem se lembrar de seu passado ou seu nome, 2070 descobre que está em uma prisão de alta vigília e junto de outr...