Essa atualização está bastante leve, espero muito que vocês riam bastante pois essa é a intenção da história <3
Já adianto que o Sunoo vai causar bastante confusão na igreja, mas só lendo para descobrir o motivo haha
Ni-ki descobriu que os seres celestiais, além de serem dotados com a capacidade de perturbação sonora, se parecem com crianças pestinhas que sentem prazer em acordar cedo.
Ele se imaginou falando com alguém normal o motivo de sua cara de sono "foi apenas um demônio disfarçado de anjo que me perturbou até que eu me levantasse às cinco da manhã!"
Ele deve ter assustado o anjo com a sua carranca ao finalmente se levantar da cama, desistindo de ignorá-lo para tentar conseguir qualquer horinha de sono, quando o sol já estava nascendo.
O lado ruim de um domingo de manhã em uma cidade pequena é que a única diversão que se pode ter é a missa das sete na igreja e o lado bom não existe.
Sunoo não parava de falar, por Deus, nunca havia conhecido qualquer ser, vivo ou morto, que conseguisse proferir tantas palavras por minuto.
Porque anjos não possuem um botão de desligar?
Talvez Ni-ki devesse usar esta habilidade para algo útil, como um concurso de soletração, mas infelizmente não poderia inscrever uma entidade invisível em algo humano.
— No céu não te ensinaram a ter boas maneiras não? — O humano farto de ouvir a voz de Sunoo, o interrompeu em uma das suas frases, perguntas ou o que quer que fosse aquilo.
— Ei, eu fui preparado para estar aqui, mas me ensinaram que eu deveria tentar ser agradável e não ficar com essa sua cara de quem comeu e não gostou.
Anjo abusado!
— Você parece com aquelas bonecas que falam seis frases, mas que por conta de algum melequento foi quebrada e agora não cala mais a boca. — Ni-ki cuspiu as palavras, sem se importar em já estar destilando um pouco de seu veneno ainda de manhã. — Espero que tenham te ensinado a como tomar conta de uma casa, porque eu irei na missa e quando voltar quero encontrar tudo arrumado.
— Mas eu não quero ficar aqui, eu vou com você!
Ni-ki revirou os olhos, pedindo a Deus silenciosamente para ter paciência.
— Esse é um evento apenas para humanos, agora fique aí e se comporte eu volto logo.
Ele se virou, ignorando a expressão abalada de Sunoo e rumou até a porta. Não parou para ouvir as lamentações do anjo, apenas saiu de casa, fazendo o mesmo caminho de sempre até chegar à igreja.
Ou pelo menos, o que todos consideravam como uma apesar da estrutura acabada, paredes com infiltração e bancos com alguns pregos saindo de seus lugares de origem. Apenas os fortes - ou desocupados - frequentam o local.
O padre Jake fez a plenos pulmões a primeira leitura e o salmo responsorial, como se a igreja estivesse cheia, com uma multidão fervorosa lhe ouvindo, quando na verdade somente os mesmos velhos e alguns depravados - incluindo Ni-ki - escutam o discurso por falta de opção ou outro lugar para ir em um domingo.
— Eu não sabia que uma missa poderia ser tão chata, me deu até sono agora.
Assustado, o humano olhou na direção da voz e confirmou a pior das hipóteses que a sua mente foi capaz de formular: o anjo havia conseguido escapar da sua casa e agora estava na igreja.
— O que você está fazendo aqui? — Ni-ki perguntou entre dentes, fazendo questão de olhá-lo nos olhos. Ele queria repreender o anjo e pelo menos ser levado a sério, mas a sua tentativa se tornou inútil quando ouviu uma risada debochada vinda de Sunoo.
— Achou mesmo que uma simples porta iria me prender? Eu sou um anjo, não um cachorro.
Jake proferiu algum salmo no microfone que a mente perturbada de Ni-ki foi incapaz de processar, sua atenção estava voltada em um certo anjo que resolveu se comportar como um capetinha naquele dia.
Eu te peço ó Senhor, para fazer um certo anjo bagunceiro se comportar e não me fazer passar nenhuma vergonha no dia de hoje.
Era a primeira vez em anos que Ni-ki fazia uma oração tão sincera.
Mas era tarde demais.
Sunoo já havia saído de seu lugar e estava perambulando pelas fileiras, olhando para os quadros e esculturas dos santos. O anjo parecia encantado ao olhar para os vitrais, como se nunca tivesse entrado em uma igreja antes.
Ni-ki, que acompanhava tudo com o olhar, achou estranho quando o anjo franziu o cenho ao olhar para uma imagem em específico.
— Porque deixaram a virgem Maria tão pálida? Se eu não me engano ela também era bem mais gorda.
O humano teve que segurar a risada diante do comentário sem noção de Sunoo. Ele colocou as mãos na boca, evitando fazer qualquer tipo de barulho.
O anjo se virou então para as estátuas dos seus semelhantes, pequenos anjinhos e arcanjos retratados como esculturas de pedra nas laterais do templo, até se deparar com a sua própria. Ni-ki já sabia de cabeça o nome e a ordem de cada uma das peças - por falta do que fazer durante as missas - e viu o exato momento em que Sunoo deparou-se com seu próprio nome entalhado ali mas ao contrário do que Ni-ki esperava, o anjo também tinha outra crítica a fazer:
– Ei, eu não sou uma criança! Aquelas pestinhas são coisa do demônio! Sério, quem olha pra um mini adulto que só serve pra testar a paciência dos pais e pensa: 'Olha, um anjinho!'? Se é assim, eu também devo ser um querubim de primeira classe!
Ni-ki acabou não conseguindo segurar mais o riso. Apesar de suas mãos ainda estarem tampando a sua boca, os sons inevitavelmente acabaram transpassando a sua pele.
— Está com algum problema?
Jake o fitou com uma expressão nada boa. Ele retirou seus óculos, apoiando-os em cima do livro que estava lendo.
— Não, me desculpe a intromissão, eu só senti um mal estar repentino.
— Neste caso, por motivos de saúde, estou lhe convidando a se retirar.
O humano se limitou a assentir, encarando o anjo com um olhar mortal, que pareceu inabalado com o que acabara de acontecer. Sunoo não tardou a voltar com a sua meticulosa análise, fazendo questão de rir das expressões exageradas das pinturas.
Ni-ki andou até as portas da entrada e estava prestes a sair quando ouviu um estrondo. Assustado, ele olhou para trás e desejou não ter o feito.
O corpo de Sunoo provavelmente havia se chocado com alguma escultura, que agora estava partida em mil pedaços no chão enquanto o anjo olhava assustado para todos os pedacinhos de pedra espalhados pelo salão.
Algumas pessoas começaram a gritar em pânico com medo de que fosse algum demônio, outras apontaram suas cruzes na direção dos escombros, mas a reação do padre foi a mais exagerada de todas:
— "Senhor fortalecei-nos e enchei-nos de Vosso Santo Espírito, livrando-nos do mal! Afastai as forças do mal para que possamos nos dedicar à prática do bem. Afastai de nossos lares e nossa vida todos os males. Livrai-nos Senhor da bruxaria, magia, superstição, feitiços e maldições."
E o pandemônio estava formado.
No meio daquela confusão, Ni-ki acabou sendo empurrado por duas velhinhas desesperadas para deixar o local. Ele não teve tempo de reagir, apenas foi arremessado escada abaixo, em algum momento durante a queda colidiu com alguma superfície dura que lhe ralou o rosto.