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A velha árvore sussurrava, as agulhas secas sob o peso da neve. Era Natal, e em vez do cheiro familiar de pinho fresco, sentia apenas o pungente aroma de madeira morta, de um corpo envelhecido e esquecido. Lembrava-se da floresta, do sol na face, dos pássaros que cantavam nos seus ramos. Agora, apenas escuridão e o frio penetrante da noite a envolviam.
"Eu fui uma vez imponente", pensou a árvore, sua voz um sussurro quase inaudível no vento. Meus galhos alcançavam o céu, abrigando esquilos e pássaros. Minhas raízes se agarravam à terra, fortes e profundas. Mas os homens vieram, os olhos brilhando com o brilho artificial da ganância. Viram em mim, não uma criatura viva, mas um objeto de desejo, um símbolo para uma celebração efêmera.
Eles me cortaram no auge da minha vida, arrancando-me do seio da floresta onde eu havia crescido por décadas. O som do serrote cortando minha madeira ressoou como um lamento entre os outros seres que habitavam meu lar. Fui carregada para longe, deixando para trás os amigos que haviam compartilhado meu tempo: as flores silvestres que dançavam ao vento e os animais que encontravam abrigo em meus galhos.
Agora aqui estava eu, enfeitada com bolas brilhantes e luzes cintilantes, um sorriso falso estampado em meus galhos secos. Crianças riam ao meu redor, seus olhos brilhando com a magia do Natal. Esses rostos alegres eram uma pontada de agonia no meu tronco rachado. Para eles, sou a imagem da festa, mas eu só sinto o peso do meu fim.
A cada dia que passava na praça iluminada pela noite natalina, minha dor aumentava. As crianças corriam ao meu redor, suas risadas ecoando como uma melodia distante que eu não conseguia acompanhar. O aroma dos biscoitos de gengibre e do chocolate quente preenchia o ar, mas tudo isso se misturava a uma tristeza profunda que me envolvia como um manto pesado.
Um menino, com olhos grandes e cheios de inocência, aproximou-se de mim com um brilho especial no olhar. Ele segurava nas mãos um pequeno enfeite de feltro em forma de pássaro. Com delicadeza, ele depositou o enfeite em um dos meus ramos. Era um presente tão pequeno e tão frágil, tão diferente da grandiosidade que eu já fui. Mas naquele gesto simples, vi uma centelha de compaixão.
"Talvez ele tenha sentido o que eu sou", pensei enquanto observava o menino se afastar para brincar com outras crianças. Ele olhou para trás uma última vez antes de se juntar aos amigos — seus olhos refletiam uma compreensão que transcendia a superficialidade da festa.
Naquela noite fria, enquanto a neve caía suavemente ao meu redor como um manto acolhedor, comecei a refletir sobre minha existência. Lembrei-me das histórias sussurradas pelo vento nas florestas profundas: histórias de amor e amizade entre as criaturas da natureza. Eu não era apenas uma árvore; eu era parte de algo muito maior — um ciclo ininterrupto de vida e morte.
Os dias passaram e as celebrações continuaram frenéticas ao meu redor. Os presentes eram empilhados aos meus pés — caixas embrulhadas em papéis brilhantes que escondiam sonhos e esperanças dentro delas. Cada laço desfeito trazia sorrisos ou lágrimas aos rostos das crianças. Mas eu percebia que cada presente era também um símbolo efêmero; logo se tornariam lembranças esquecidas enquanto as crianças cresciam.
Na véspera do Natal, enquanto os sinos da cidade soavam alegremente ao longe e as luzes piscavam como estrelas no céu noturno, algo mudou dentro de mim. Eu percebia que mesmo sem estar viva na forma como os humanos entendiam a vida, ainda poderia trazer alegria e conexão entre eles.
Foi então que vi algo maravilhoso: as crianças começaram a dançar ao meu redor sob a luz suave das estrelas. Elas seguravam mãos umas das outras em círculos alegres; suas risadas ecoavam na noite como música pura. O menino do enfeite ficou no centro do grupo; ele olhava para mim com admiração genuína.
“Olhem! A árvore está tão linda!” exclamou ele com entusiasmo.
E naquele momento mágico — quando as vozes infantis se misturaram ao canto dos sinos — percebi que havia mais vida em mim do que eu imaginara. Eu não era apenas uma árvore decorada; eu era um símbolo de união e alegria nesta época festiva.
Assim passei aquela noite mágica sob as estrelas brilhantes e os risos infantis ressoando ao meu redor — sentindo-me parte daquela celebração eterna chamada Natal.
E mesmo quando a manhã chegou e os primeiros raios de sol iluminaram a praça coberta pela neve reluzente, sabia que havia cumprido meu propósito: ser um farol de esperança em meio à tristeza da minha própria existência.
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Evento Clássico - Contos Natalinos 2024
Short StoryStatus; Aberto. Olá escritores e amantes de leitura! Neste Natal, convidamos você a celebrar essa tão importante data juntamente do projeto dark roses, através de clássicos contos natalinos. Venha fazer parte da primeira de muitas edições desse n...