Chamas de Esperança

Capítulo 1

A luz atravessa a vidraça da loja, destacando imperfeições no chão de madeira e lançando reflexos cintilantes sobre as araras. Era um espaço pequeno, abafado, e cada canto estava tomado por roupas que eu mesma havia costurado.

Um vestido vermelho com renda delicada pendia de um dos cabides, sua barra levemente desalinhada denunciando a pressa com que terminei o trabalho na noite passada, minhas mãos ainda doíam dos últimos ajustes, mas a cliente à minha frente, bem-vestida e elegante, não parecia notar. Ela passava os dedos pela seda como se estivesse analisando uma obra de arte ou talvez procurando um defeito.

Cada movimento dela me deixava tensa. Eu precisava que ela comprasse algo — qualquer coisa. Um cinto, ao menos. Algo que tornasse o esforço e as noites mal dormidas minimamente compensadores. Mas, enquanto ela inspecionava minhas peças com um olhar que misturava desdém e indecisão, percebi como o silêncio da loja parecia maior que nunca, quase sufocante, como se estivesse esperando para engolir minhas últimas esperanças.

O silêncio estava me matando. Decidi tentar quebrar o gelo, ainda que minha voz soasse hesitante. "Essa blusa combina muito bem com o seu tom de pele. Acho que vai ficar perfeita em você." Forcei um sorriso, segurando o tecido com cuidado, como se eu mesma estivesse vendendo um pedaço de minha alma.

A cliente ergueu os olhos para mim, sobrancelhas ligeiramente arqueadas. Seus lábios se contraíram em um sorriso frio, mais um gesto de formalidade do que de cortesia. "É uma peça interessante, mas... não é o que eu procuro. Talvez em outro lugar."

Antes que eu pudesse responder, ela soltou a blusa de volta no cabide com um movimento suave, mas decidido, como quem se livra de algo que considerava sem valor. Suas unhas perfeitas deslizaram pelo tecido, e ela se afastou com um olhar que oscilava entre tédio e desprezo.

"Obrigada por... nada", murmurei baixinho assim que a porta da loja se fechou atrás dela, o som da campainha ecoando como um veredito. Meu rosto estava quente, as palavras presas na garganta. O desdém dela queimava mais do que qualquer insulto direto, olhei para a blusa que ela havia descartado, agora pendurada de forma desajeitada no cabide. Toquei o tecido, tentando lembrar por que comecei tudo isso. Mas, naquele momento, a única coisa que sentia era cansaço. Não era só ela. Era a cidade. Era a loja. Era tudo.

Antes que eu pudesse afundar completamente na minha frustração, a porta da loja foi escancarada com força, fazendo a campainha tocar desajeitadamente. Allya entrou como um furacão, segurando um buquê de balões coloridos que mal cabiam pela entrada. Sua presença preencheu o espaço pequeno da loja em questão de segundos, trazendo uma energia impossível de ignorar.

"Eu não acredito nele, Glen! Simplesmente não acredito!" ela exclamou, ignorando completamente a atmosfera carregada que eu ainda sentia. "Daren achou que seria uma ótima ideia me fazer uma surpresa romântica, mas, adivinha? Ele me levou pra um lugar com uma trilha lamacenta! Lama, Glen! Eu escorreguei e sujei toda a minha roupa!"

Ela largou os balões num canto qualquer, como se fossem um peso extra em sua irritação, e passou a mão pelos cabelos perfeitos, claramente indignada. Allya era o retrato do drama.

"Allya, talvez ele só estivesse tentando ser fofo," respondi, sem muita convicção, enquanto ajeitava uma blusa que a cliente anterior havia deixado de lado.

"Fofo? FOFO? Glen, a minha sandália nova está destruída! E eu fiquei parecendo uma louca tentando limpar o vestido na frente dele. Sério, que tipo de ideia ele tem sobre romance? Se ele acha que eu vou passar por isso de novo, está muito enganado!"

Era impossível não sorrir. Apesar do tom revoltado, Allya tinha esse dom de transformar qualquer coisa em um espetáculo. Ela era exatamente o oposto do ambiente quieto e sufocante que havia dominado a loja momentos antes. E, mesmo com suas reclamações intermináveis, eu sabia que ela estava ali porque se importava — ou talvez porque a loja era o único lugar onde sempre tinha alguém disposto a ouvir seus dramas