A festa ainda estava agitada ao redor deles, mas Harry não conseguia mais se concentrar em nada além do latejar incômodo em seu rosto. O corte onde a taça se estilhaçou ainda ardia, e embora Hermione já tivesse tentado curá-lo rapidamente, ainda havia um resquício de sangue secando na pele.
Antes que Harry pudesse decidir o que fazer, Cedrico apareceu ao seu lado, o olhar preocupado.
— Harry, você está bem? — Cedrico perguntou, inclinando-se ligeiramente para ele.
Mas antes que Harry pudesse responder, um movimento brusco o puxou para trás.
— Ele está ótimo. — A voz de Draco cortou o ar como uma lâmina afiada.
O aperto em seu braço era firme, possessivo. Harry piscou, atordoado, sendo literalmente arrancado do lugar antes mesmo de processar o que estava acontecendo.
— O que diabos você está fazendo, Draco? — Harry se virou para encará-lo, tentando se soltar, mas Draco não afrouxou o aperto.
Draco ignorou a pergunta, os olhos frios pousando sobre Cedrico como se o rapaz tivesse cometido um crime imperdoável.
— Diggory, não tem outra pessoa para bajular? — Draco cuspiu as palavras com desprezo, os dedos ainda envolvendo o pulso de Harry com força.
Cedrico franziu o cenho, claramente confuso com a hostilidade repentina.
— Só queria saber se ele estava bem, Malfoy. Não precisa agir como um idiota.
— Ah, que heróico da sua parte. Aposto que achou a desculpa perfeita para tocar no rosto dele, não foi? — Draco rebateu, a voz envenenada pelo ciúme que ele tentava (e falhava) esconder.
Harry sentiu o rosto esquentar — de raiva e de algo mais. Ele odiava como Draco tornava tudo mais difícil, como cada interação entre ele e Cedrico parecia se transformar em uma cena desnecessária.
— Não seja ridículo. — Harry tentou puxar o braço, mas Draco o segurou ainda mais forte. — Me solta.
Draco finalmente olhou para ele, e Harry viu algo em seus olhos — uma mistura de frustração, irritação e outra coisa que ele não conseguiu nomear no momento.
— Estamos indo embora. — Draco declarou simplesmente.
— O quê?
E antes que Harry pudesse protestar, Draco o puxou com ele, sem se importar com os olhares ao redor. Harry sentiu o próprio coração disparar. Não era apenas o ato de levá-lo embora à força, era a maneira como Draco o segurava, como se recusasse a deixá-lo ali, como se precisasse tirá-lo de perto de Cedrico.
Ele tentou ignorar o arrepio que percorreu sua pele ao ser puxado para fora do salão.
Ele tentou ignorar a forma como, mesmo irritado, queria desesperadamente entender o que se passava na cabeça de Draco.
A porta da Casa dos Gritos se fechou com um baque atrás deles.
Harry sentiu o ar frio da noite bater contra seu rosto ainda ferido, mas foi o aperto firme no seu braço que manteve sua atenção presa. Draco continuava o puxando, a mão quente envolvendo sua pele como um grilhão.
— Me solta, Draco! — Harry finalmente conseguiu se desvencilhar, empurrando-o com força. — O que diabos foi isso lá dentro?
Draco parou abruptamente, o peito subindo e descendo rápido demais, como se estivesse tentando conter algo que ameaçava explodir. A máscara dele estava ligeiramente torta agora, e Harry podia ver seus olhos furiosos brilhando à luz da lua.
— Você queria ficar lá? Deixar Diggory bancar o salvador, segurar sua mão, limpar o sangue do seu rosto? — Draco cuspiu as palavras, a voz carregada de sarcasmo e raiva. — Foi para isso que veio?
Harry sentiu a frustração borbulhar dentro de si.
— Você está ouvindo a si mesmo? Está agindo como um completo idiota! — Ele passou a mão pelo rosto, sentindo o corte ainda sensível. — Eu me machuquei e ele só estava tentando ajudar!
Draco riu sem humor.
— Ah, claro. O Diggory sempre tão prestativo. — Ele deu um passo à frente, diminuindo o espaço entre eles. — E você gostou, não foi?
A acusação pegou Harry desprevenido.
— O quê?
Draco inclinou a cabeça, os olhos estreitando-se.
— Você gostou de vê-lo preocupado com você. Gostou de ter ele ali, tocando em você e falando com aquela maldita voz dele.
Harry sentiu o rosto esquentar, mas sua raiva aumentou ainda mais.
— Você não tem o direito de me dizer com quem posso ou não falar, Draco! — Harry empurrou o peito do loiro, que mal se moveu. — Foi você quem decidiu que isso entre nós precisava ser um segredo. Que eu não posso te olhar nos corredores, que nada disso pode ser real. Então não ouse me dizer com quem eu devo ou não dançar ou conversar!
Harry respirou fundo, sentindo o sangue pulsar em suas têmporas, antes de soltar um riso incrédulo.
— E você tem noção do que acabou de fazer? Na frente de todo mundo? Se queria manter isso em segredo, parabéns. Agora é tarde demais. Teria sido melhor termos feito uma entrada "triunfal" logo de uma vez, como você tanto ironizou.
Draco ficou em silêncio por um momento. Sua respiração ainda estava pesada, seus punhos cerrados ao lado do corpo.
Harry achou que ele fosse discutir mais, mas, em vez disso, Draco apenas estalou a língua, dando um passo ainda mais perto.
— Você está sangrando. — A voz dele soou mais baixa agora, quase rouca.
Harry piscou, confuso pela mudança repentina.
— O quê?
Draco ergueu a mão, e antes que Harry pudesse se afastar, ele passou os dedos suavemente pelo corte em sua bochecha. O toque era quente, quase cuidadoso, um completo contraste com a agressividade de segundos atrás.
Harry ficou paralisado.
O toque de Draco era firme, mas delicado, os dedos traçando levemente o caminho do corte em sua bochecha. O ar entre eles pareceu pesar, a tensão antes carregada de raiva se transformando em algo mais denso, mais confuso.
Harry queria se afastar. Queria dizer algo mordaz, algo que o lembrasse de por que estava tão irritado com Draco. Mas tudo o que conseguiu fazer foi ficar ali, sentindo a ponta dos dedos dele contra sua pele quente.
— Você precisa limpar isso direito. — Draco murmurou, a voz baixa, quase hesitante.
Harry engoliu em seco. Era exaustivo tentar acompanhar Draco. Como ele podia sair de uma explosão de ciúmes para isso? Para esse cuidado que Harry sabia que não deveria deixá-lo ver?
— Eu... Hermione já tentou curar. — Ele respondeu, mas sua voz não soou firme como queria.
Draco franziu o cenho, analisando o machucado com um olhar crítico.
— Ela fez um péssimo trabalho.
Harry revirou os olhos, a irritação voltando, mesmo que misturada com algo perigoso — algo que fazia seu estômago revirar sempre que Draco falava daquele jeito, rouco e perto demais.
— Eu me viro sozinho. — Ele disse, finalmente se afastando um pouco, mas sem conseguir quebrar completamente o contato visual.
Draco suspirou, passando a mão pelos cabelos e olhando ao redor, como se estivesse tentando decidir o que fazer.
Num gesto frustrado, antes de finalmente encarar Harry. Seus olhos estavam cheios de algo que Harry não conseguia decifrar — uma mistura de arrependimento, cansaço e algo muito mais profundo.
— Você tá certo. — Draco disse, a voz mais baixa agora, sem vestígios da raiva de antes. — Me perdoa, Harry. Eu não deveria ter falado com você daquele jeito ontem à noite, e muito menos ter feito esse escândalo hoje.
Harry prendeu a respiração, surpreso pela súbita mudança no tom de Draco.
— Fui eu quem escolheu manter distância, quem decidiu que isso entre nós não podia existir. Mas a verdade é que... — Ele riu, sem humor, desviando o olhar por um momento antes de encará-lo novamente. — Eu não consigo. Eu sou péssimo nisso, Harry. Péssimo em te ver com outra pessoa, péssimo em fingir que não me importo. Porque eu me importo.
Draco passou a língua pelos lábios, hesitante, antes de continuar, a voz agora carregada de algo cru, quase desesperado.
— Eu amo você. É isso. O sentimento mais puro que já senti na minha vida. E eu sei que tem coisas sobre mim que você ainda não sabe, mas agora... agora isso não importa. O que importa é que eu sinto muito.
Harry ficou em silêncio, o coração martelando no peito. As palavras de Draco pairavam entre eles, intensas e irreversíveis.
— Vem comigo. — Draco disse depois de um momento, mais calmo agora, mas ainda parecendo cauteloso. — Vamos para o nosso antigo dormitório.
Harry arqueou uma sobrancelha.
— Nosso antigo dormitório?
Draco assentiu, os olhos fixos nos dele.
— Ninguém vai nos incomodar lá. Eu só... preciso ficar com você agora. E você precisa cuidar desse corte direito.
Harry hesitou. Ele sabia que aceitar significava cruzar um limite que talvez não conseguisse desfazer depois. Mas, olhando para Draco, vendo a vulnerabilidade que ele tentava esconder, Harry percebeu que, no fundo, ele já havia cruzado esse limite há muito tempo.
Ele soltou um suspiro longo antes de murmurar:
— Tá.
E sem mais uma palavra, Draco pegou sua mão, puxando-o suavemente pelo caminho que levava de volta ao castelo.