Capítulo 1 – Ganchos e Sombras
A estrada cortava a escuridão como uma lâmina, os faróis do Impala 1967 iluminando a trilha solitária que levava a uma pequena cidade no interior de Indiana. Kara mantinha as mãos firmes no volante, enquanto Alex, sentada no banco do passageiro, revisava os recortes de jornal e os arquivos no laptop.
— Três vítimas em duas semanas — disse Alex, sem tirar os olhos da tela. — Todas brutalmente mutiladas. Os corpos foram encontrados pendurados em árvores ou postes, como se algo os tivesse arrastado para cima.
Kara soltou um suspiro, os dedos tamborilando no couro do volante.
— Parece trabalho do nosso amigo com a mão de metal.
O "nosso amigo" era uma lenda urbana local: o Homem Gancho. A história variava, mas a versão predominante falava de um prisioneiro fugitivo que, após perder a mão em um acidente, a substituiu por um gancho afiado. A lenda dizia que ele vagava pelas estradas, atacando casais desavisados e desmembrando suas vítimas. Mas, como as irmãs Danvers bem sabiam, lendas muitas vezes tinham um fundo de verdade.
— O xerife acha que é um urso — continuou Alex, revirando os olhos. — Porque, claro, ursos são conhecidos por usar ganchos para enforcar pessoas em árvores.
Kara riu de leve, mas seu olhar permaneceu sério. Elas já tinham visto coisas piores e sabiam que não podiam subestimar nada.
Ao chegarem à cidade, estacionaram o carro perto de um pequeno bar chamado Rusty's, um daqueles lugares que pareciam parados no tempo, onde os frequentadores eram os mesmos há décadas. Assim que entraram, o cheiro de cerveja e madeira velha os envolveu.
Alex se dirigiu ao balcão enquanto Kara tomava seu tempo observando o local. Alguns olhos se voltaram para elas, avaliando-as como estranhas no pedaço. O barman, um homem robusto com uma barba grisalha, limpava um copo quando Alex puxou conversa.
— Estamos de passagem — disse Alex, jogando um sorriso casual. — Mas ouvimos umas histórias estranhas sobre gente sumindo por aqui. Algum conselho sobre onde não ir à noite?
O barman soltou um suspiro pesado e apoiou os braços no balcão.
— Se forem espertas, pegam a estrada e vão embora antes que o diabo resolva olhar na direção de vocês.
— Bom, temos um problema com seguir conselhos sensatos — disse Kara, apoiando-se ao lado da irmã. — Sabe onde podemos encontrar o xerife?
O barman olhou de uma para a outra, coçou a barba e indicou um canto do bar.
— Sentado ali. Mas boa sorte. O xerife Carter não gosta de forasteiros fuçando nos assuntos dele.
As irmãs trocaram um olhar e seguiram na direção indicada. Elas já lidaram com xerifes céticos antes. Esse seria apenas mais um obstáculo no caminho.
E o tempo delas estava se esgotando. Se o padrão se mantivesse, o Homem Gancho faria outra vítima essa noite.
....
Dentro de um Impala preto, estacionado na beira da estrada, Kara Danvers observava atentamente o laptop apoiado em seu colo, digitando rápido enquanto revisava as informações sobre o caso.
— Mais uma vítima. Uma garota de dezessete anos encontrada perto de um lago. Mesmo padrão das outras: automóvel abandonado, janela quebrada e... — Kara parou por um instante, franzindo a testa. — O corpo foi encontrado enforcado em uma árvore, com cortes profundos no peito.
— O cara gosta de dramatizar — comentou Alex Danvers, ajeitando a arma na cintura e conferindo a mochila cheia de munição, sal e ferro. — E tem certeza de que estamos lidando com o Homem Gancho?
— Todos os relatos batem. Testemunhas disseram que ouviram um barulho de metal raspando antes da garota gritar. Além disso, o histórico da lenda na região coincide com os desaparecimentos.
Alex suspirou, jogando a mochila sobre o banco de trás. — Certo, então vamos descobrir onde esse maldito está se escondendo antes que ele encontre outra vítima.
As irmãs saíram do carro e seguiram pela trilha que levava ao lago onde o corpo foi encontrado. A chuva fina tornava o solo lamacento, dificultando os passos. O silêncio da floresta era interrompido apenas pelo farfalhar das árvores e pelo som da água se movendo lentamente.
— Esse lugar tem uma vibe de filme de terror — murmurou Kara, mantendo a lanterna apontada para a frente.
— Bem, não estamos em um conto de fadas — Alex rebateu, segurando a arma com firmeza. — Se estivermos certos, o próximo ataque pode acontecer a qualquer momento.
De repente, um estalo vindo das árvores fez as duas pararem. Kara ergueu a lanterna, iluminando o meio das folhagens. Nada.
— Provavelmente um animal — sussurrou Kara, tentando ignorar o arrepio na espinha.
Mas Alex não estava convencida. Ela deu mais alguns passos à frente, mantendo a respiração controlada. O silêncio se tornou ainda mais opressor, até que, de repente, um ruído metálico soou ao longe.
Um arranhado surdo, como se algo de ferro fosse arrastado contra uma superfície dura.
As duas irmãs se entreolharam, seus corpos enrijecendo em um reflexo instintivo de caçadoras. O Homem Gancho estava próximo.
E ele sabia que elas estavam ali.
A floresta ao redor do lago parecia mais escura do que o normal, como se a própria noite estivesse segurando a respiração. A chuva continuava caindo em gotas finas, criando pequenos rios de lama sob os pés de Kara e Alex.
O ruído metálico ecoou novamente, mais próximo desta vez.
Kara apertou a lanterna, varrendo a área com o facho de luz. As sombras dançavam entre os troncos das árvores, mas nada se movia além das gotas escorrendo pelas folhas.
— Isso não é um animal — murmurou Alex, os olhos fixos na escuridão.
Elas já enfrentaram de tudo: fantasmas vingativos, lobisomens famintos, até mesmo demônios com séculos de maldade nas costas. Mas havia algo diferente ali. Algo que fazia o instinto de sobrevivência de ambas gritar para darem meia-volta.
E, claro, ignoraram esse instinto.
Alex sacou sua arma carregada com balas de ferro. Kara, por sua vez, agarrou sua faca de prata, mesmo sem saber se aquilo funcionaria contra o que estavam caçando.
Um galho estalou atrás delas.
Kara girou rapidamente, apontando a lanterna, mas só encontrou um rastro de lama e folhas reviradas.
— Isso tá me irritando — resmungou Alex.
Foi quando veio o som.
Não um arranhado. Não um estalo.
Uma risada.
Baixa, áspera e distorcida, como se tivesse sido arrancada da garganta de algo que não deveria mais estar vivo.
O coração de Kara disparou. Ela olhou para Alex, que parecia ter ouvido a mesma coisa.
— Certo, chega dessa palhaçada — disse Alex, dando um passo à frente. — Ei, Gancho! Sabemos que você está por aqui. Quer tentar alguma coisa? Estamos esperando.