Conto

2.6K 188 72
                                    

    “Pam.”

   “ Pam.”

   “ PÂMELA!” alguém me chama em meio a desdobrar de um trovão.

  Eu me viro ainda distraída e vejo um borrão branco passar na velocidade da luz a poucos centímetros de meu nariz.

     Uau! O que foi aquilo? Uma bola? Essa tinha sido por pouco!

    “Tello, o jogo está nesse campo!” nossa professora de educação física grita na minha direção, com as mãos em sua cintura roliça, revestida por uma berrante calça de malha amarela da Adidas. Ela não parece estar nenhum pouco feliz, e dessa vez não só devido a minha total inabilidade em dominar uma bola de futebol. Nos últimos quarenta minutos meus olhos passearam bem longe do campo onde deveriam estar focados. E não foram pelas nuvens negras tempestuosas que se aproximavam em procissão pelo céu.

      “Deus! O que há com você hoje?” Tina perguntou, deixando sua posição para vir falar comigo. As mechas castanhas do cabelo dela caiam totalmente desgrenhadas sobre seu rosto vermelho e suado, demonstrando que ela estava mesmo se esforçando pelo time. Coisa que eu também deveria fazer, se meu interesse não tivesse sido tragado para outra coisa...

      “Estou meio aérea, só isso.” respondo em minha defesa e, numa clara manobra evasiva, me agacho para amarrar o tênis. Ser amiga da Tina desde o jardim de infância tinha a dado tempo suficiente para aprender a identificar minhas emoções apenas pelo meu olhar. Eu era como um livro aberto pra ela.

   “Acho que sei qual é o problema da Pam hoje.” Carol disse aproximando-se de nós enquanto apontava com seu queixinho sardento o campo de futebol que ladeava o nosso.

     Tina se virou pra olhar e Carol e eu a acompanhamos, colocando nossa atenção no jogo dos garotos que rolava num ritmo bem mais acelerado a poucos metros de nós. Para qualquer menina que estuda em nossa escola seria dispensável dizer por que diante de tantos exemplares masculinos correndo por aquele campo, fixamos nossos olhares em apenas um: Erick. E não era pra menos. Onde quer que fosse e independente do que estivesse fazendo, ele sempre se destacava da multidão.

    Assim que entrou pra escola tentei identificar o que ele tinha de tão especial a ponto de atrair as garotas feito ímã. Seriam aqueles olhos azuis enigmáticos? O cabelo negro como as asas de um corvo? A perfeição de seu rosto clássico? Seu jeito firme e superior de andar? Ou seria tudo aquilo? No final não cheguei à conclusão alguma e ainda acabei pateticamente apaixonada por ele.

       Do outro lado do campo Erick pareceu pressentir que estava sendo observado e olhou em nossa direção. Ao me encontrar deu um sorriso contido, de canto de boca adicionando um tchauzinho discreto pra mim. Senti meu rosto queimar, mas respondi com um aceno também.

    “Esperai” Tina disse chocada, olhando de Erick pra mim. “Não me diga que...           “

    “Ela vai sair com ele hoje!” Carol soltou de repente, dando pulinhos empolgados.

      Nem mesmo tive tempo de brigar com ela por ser incapaz de guardar um minúsculo segredo.

      “O quê?!” gritou Tina parecendo a própria encarnação da raiva. “Porque você não me disse nada, Pam? Achei que éramos amigas!” ela completou num tom magoado que eu poucas vezes tinha ouvido sair de sua boca.

      Isso me fez sentir mal na mesma hora. Eu sempre havia contado tudo pra Tina, tudo mesmo. Mas ultimamente vinha a excluindo quando o assunto era Erick. Não só porque ela o achava apenas mais um garoto idiota como todos os outros, mas também porque sem motivo ou razão aparente Tina não suportava nem mesmo ouvir falar dele. E foi isso que me fez tomar a decisão de esconder da minha melhor amiga, pelo menos por um tempo até que pudesse descobrir como lidar com isso, que eu teria um encontro com Erick.

Ciúme Imortal (Conto)Onde histórias criam vida. Descubra agora