Capítulo Seis - A Sereia

1.4K 132 13
                                    

   Pela segunda vez em poucas horas, meu corpo caiu na água do lago. O que diferenciava era que desta vez eu queria isso, enquanto da última eu estava sobre efeito hipnótico de uma canção mortal, cantada por uma linda garota misteriosa, que neste momento está afundando para uma morte certa.

   Meu corpo bate contra a água, e meus pés balançam para cima e para baixo, impulsionando-me para o fundo. Nunca imaginaria como a temperatura do lago poderia mudar tão drasticamente. De madrugada, parecia que eu estava inerte no meio do oceano, com meus lábios quase ficando roxos; agora, a água havia ficado um pouco mais quente, mas não tanto para parecer desagradável.

   Os raios solares, que penetravam a partir da superfície, criavam uma explosão de luminosidade no universo escuro subaquático. A iluminação que vinha de cima parecia ser uma explosão de fogos de artifício, e aquilo foi mais que o suficiente para eu poder ver o trajeto que o corpo da possível garota poderia percorrer. Mas eu tinha que ser rápido, porque a partir daquele momento, até o último resquício de ar era precioso para mim.

   Felizmente, não foi muito difícil localizá-la. Ela estava caindo, com o corpo em forma vertical, não muito distante de onde eu estava. A falta de iluminação em um ponto mais ao fundo impedia que a parte abaixo de sua cintura estivesse exposta.

   De repente, me peguei pensando em suas pernas. Deviam ser tão lindas...

   A linha de pensamento cessou quando soltei mais uma respirada, vendo as bolhas de ar subindo de encontro à superfície. Isso fez com que eu recuperasse o foco e nadasse na direção da garota, da qual não sabia o nome até agora.

   Quanto mais eu aproximava, maior era a escuridão que me rodeava. Olhando do ponto onde estava, parecia que a garota afundava em um buraco negro. Se ela submergisse ainda mais, então as chances de eu encontrá-la seriam nulas.

   Concentrei o dobro de força na área das minhas pernas, conseguindo ir alguns centímetros mais rápido. Mas o fato de eu estar usando roupas tornava todo o esforço ainda mais difícil. Mas eu não podia desistir. Como eu conseguiria dormir, com o peso na minha consciência avisando que eu havia deixado uma pessoa morrer? Uma pessoa da qual eu tinha uma vontade explícita de conhecer.

   Estico a minha mão, pronto para esticar meu braço até pegar a dela. Faltava poucos centímetros para meus dedos se fecharem ao redor de seu pulso esquerdo...

   Meus olhos estavam fixos em seu belo e sereno rosto, parecido esculpido em mármore branco. Sua pele parecia brilhar, mesmo com a fraca iluminação rodeando-a - sinal de que o fundo do lado (existindo ou não) estava próximo -. Seus lábios finos estavam fechados, sem nenhuma fresta entre eles. E seus olhos...

   Estavam abertos, olhando para mim.

>>>

   Tudo aconteceu rápido demais, e mesmo tentando, meu cérebro demorou um pouco para processar toda a cena que decorria comigo.

   De repente, eu vi a banhista noturna vindo na minha direção em alta velocidade, como se fosse um tubarão prestes a atacar a presa. A distância que nos separava foi quebrada em menos de um segundo. E quando ela me alcançou, senti seus dedos se apertarem em volta do meu ombro em milissegundos. Senti sua força em todo aquele gesto, e pude sentir que algum osso, localizado naquela região, tinha se partido.

   Antes que eu pudesse digerir tudo o que tinha acabado de acontecer, senti o impulso quando a misteriosa garota começou a me levar de volta à superfície. Minha respiração saiu em bolhas pesadas, e pareceu que todo o meu ar se esvaiu com apenas aquele gesto. Minha visão ficou embaçada, enquanto meus pulmões pareciam pegar fogo pela falta de oxigênio.

Sereia - A Prisioneira Da ÁguaOnde histórias criam vida. Descubra agora