Enganar o Inimigo

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Acordo ouvindo alguém bater na porta violentamente. Olho dos lados e não encontro Jace em lugar nenhum. Levanto-me e abro a porta.
— Mira estamos atrasados - meu pai diz.
— Onde está Jace? - pergunto.
— Eu não sei - meu pai diz.
— E estamos atrasados pra quê? - pergunto.
— Temos de treinar - ele diz - a sua apresentação é hoje.
— Tudo bem - digo - Entre.
Meu pai entra, e eu caminho até o banheiro, instintivamente caminho com a mão nas costas tentando equilibrar com peso da minha barriga.
Tomo um banho rápido e saio enrolada na toalha, meu pai está sentado na cama. Eu entro no closet e me troco.
— Pronto - digo quando saio.
— Vamos então - ele diz enquanto se levanta.
Caminhamos pelo corredor rumo ao elevador num silencio absoluto. Descemos até a sala de treino e o silencio persiste. Meu pai pega um arco e estende para mim, mas eu o rejeito dando um passo para trás.
— Mira você tem que treinar - ele diz.
— Eu não consigo - digo.
— Querida você precisa - meu pai fala - Como quer proteger Peeta se não vai se quer pegar no arco?
— Papai é muito difícil - digo - Eu tirei vidas de pessoas com esses objetos.
— Eu também - ele diz - Mas preciso deles pra te proteger, para proteger minha família, para proteger quem eu amo.
— Como você consegue? - pergunto.
— Pense nisso como proteção - ele diz - não como uma perigo.
— Tudo bem - digo e pego o arco da mão dele - Tudo bem.
— É um avanço - ele diz e sorri - pegue uma flecha.
Pego uma flecha da aljava e a encaixo no arco, minha mão desliza sobre o objeto como se fosse uma parte de mim que me foi tirado, agora eu me sinto inteira.
Olho para o alvo e como fiz a minha vida toda deixo a flecha voar rumo ao alvo. Eu olho para o alvo novamente e a flecha está bem no centro.
— Parabéns - meu pai diz.
— Eu consegui - digo.
— Você foi excelente - meu pai prossegue dizendo.
— É como se meu sangue voltasse a circular pelo meu corpo - digo - essa sensação é maravilhosa.
— É só você pensar nele no que era antes da arena - meu pai diz - seu hobby, sua distração, seu talento.
— Não me sinto muito confortável para pegar as facas - digo - elas me lembram - pauso e uma lagrima escorre - dele.
— O arco já é o bastante - meu pai diz.
— E então é apenas isso? - pergunto.
— Sabe o que eles querem - ele diz.
— Apenas um show - digo.
— Sim - ele diz - é sua deixa.
Pego o arco preparo a flecha e miro acerto, repito o movimento e agora tenho 3 flechas no centro do alvo. Tenho que dar um show, o que impressiona mais que uma gravida acertando o alvo?
Até que me dou conta. Por que estou fazendo isso?
— Papai? - o chamo e ele cega perto de mim.
— Diga anjo - ele diz.
— Por que tenho que conseguir nota - ele está perto o bastante para me ouvir sussurrar - Não ficarei na arena.
— Distração - meu pai só diz isso.
Eu compreendo-o e sei o que ele quer dizer, ele não podem perceber. É o que eu farei.
Subimos até o ultimo andar e ao chegar corro até meu quarto para eu vomitar. Mas dessa vez sinto que foi apenas um enjôo de gravida. Sento-me na cama e acaricio minha barriga. Peeta entra no quarto.
— Está na hora - ele diz.
Caminhamos juntos e ele fala o caminho todo. Descemos até o térreo do hotel, e lá pacificadores nos leva para uma sala, os outros tributos estão todos lá. Quando fui na 92ª edição, os tributos estavam sentados, amedrontados e quietos; agora o mesmo local foi tomado pelo caos, crianças pulam nos bancos os maiores gritam para eles se sentarem, algumas das crianças gritam ou choram. Percebo que Lily chora e eu corro para consola-la.
— O que foi Lily? - pergunto.
Ela estende a perna e há um ralado, é superficial, mas ela chora.
— Como conseguiu isso? - pergunto.
— Eu cai - ela diz em meio a lagrimas. Eu enxugo o rosto dela com as minhas mãos.
— Se não estivesse pulando não teria se machucado - digo sorrindo.
— Lux Mac'Plise - uma voz soa no alto-falante e todos param e olham para a porta.
— Começaram - Finnick diz serio.
— E o que eu faço? - Lux pergunta.
— Você não treinou com nenhuma arma? - pergunto.
— Não - ela diz.
— Como seu pai ganhou? - pergunto.
— Minha mãe - ela diz - e foi com facas.
— Você é bonita - Finnick diz - Distraia eles, e tenta fazer algo que você consiga.
— Finnick tem razão - digo - eles se distraem com um rostinho bonito.
— Deseje-me sorte - ela diz entrando.
— Boa Sorte - digo.
Peeta me ajuda a levantar e Lily senta ao meu lado e segura minha mão com uma força fora do normal, para uma garotinha de 5 anos.
Lentamente a sala esvazia. Um pacificador teve que levar Ravenna no colo, o que eu achei um absurdo.
— Lily Mason - a voz no auto-falante chama.
— Mira o que eu vou fazer? - ela me pergunta.
— Você atira machados - digo - não é obvio?
— Mas e se eu errar? - ela pergunta.
— Você é filha da melhor atiradora de machados de toda Panem - digo - Impossível você errar está no seu sangue.
— Tem certeza? - ela me pergunta.
— Lily sua mãe te ensinou tudo o que ela sabe - digo - você aprendeu com a melhor.
— Igual a você - ela diz.
— Sim - digo sorrindo - Agora vá antes deles te buscarem.
Ela sai correndo pelos corredores.
Mally é chamado e eu e Peeta ficamos sozinhos.
— Está com medo? - ele me pergunta.
— Não - digo - você está?
— Estou - ele diz.
— Não precisa ter medo - digo - sua nota mal vai valer, eu vou te proteger.
— Eu queria pelo menos tentar - ele diz.
— Você pode tentar - digo - aproveite a oportunidade.
— Mas eu não sou tão bom - ele diz - não sei atirar ou essas coisas.
— Você dará um jeito - digo - por que você é bom eu muitas coisas.
— Não acho que o meus talentos herdados me ajudaram - ele diz rindo.
— Por que não? - pergunto.
— Vou fazer um bolo pra eles - ele diz.
— Aconselharia a fazer porco - digo - Já que a mamãe atirou em um dos porcos dele.
— Eu não pago pelos erros da mamãe - ele diz.
— Peeta segundo Mellark - o auto-falante chama.
— Agora ou nunca - ele diz.
— Boa sorte - digo - não que você precise.
— Aff Mira - ele diz se levantando, ele passa a mão na minha barriga e segue o corredor.
Eu fico no silencio absoluto, ouvindo a batida do meu coração. Passasse mais de quinze minutos até que chamam meu nome.
Caminho pelo corredor até chegar na sala de treinamento.
Tenho de ser a distração, tenho de fingir que vou lutar na arena. Da ultima vez aceitei flechas num pingente, agora tenho que fazer algo baseado na minha situação, isso chamará atenção. Olho ao meu redor procurando o que posso usar e percebo que há tinta no chão, mas não consigo decifrar o desenho por que uma parte foi apagada. Peeta não! O que ele fez?
— Você vai começar? - alguém diz me tirando dos meus pensamentos.
— Desculpe - digo, e percebo que posso tirar proveito da situação - É que estou passando mal.
— Se quiser se sentar querida, pode se sentir a vontade - ele diz.
— Obrigada - digo - Estamos na reta final, agora ela fica se mexendo sem parar.
— Isso é gracioso - ele diz e eu sorrio o mais realista que consigo.
— É, ela será linda - digo - os enjôos vão valer a pena.
— Você é a segunda gravida a participar de um massacre - ele diz - na realidade dos jogos em geral.
— Minha mãe é a primeira - digo.
— Sim - ele diz - e sentimos tanto pela morte de seu irmão.
— Sim é muito triste - digo.
— Mas você terá um outro destino - ele diz.
— Que assim seja - digo.
— Seu irmao era pequeno demais - não acredito que ele ainda está falando disso - o seu bebê está bem formado, e nascerá. Mas para isso você terá de sair da arena.
— Claro - digo - acho que estou pronta.
Pego uma flecha na aljava e atiro, consigo acertar o centro do alvo. Eu respiro como se tivesse me custado muita energia, e então pego outra flecha e acerto.
— É o melhor que posso fazer nessas condições - minto.
— Obrigado - ele diz - foi mais que o bastante.
Me sinto mal, por não me sentir mal por ter enganado os idealizadores. Mas não sinto nem um pingo de remorso, minha consciência se ocupa com o peso de levar minha filha a arena, agora sei o que aqueles pais sentiram ao longo dos anos diante a eminente realidade te ter seus filhos na arena.
Entro na sala de estar e todos olham para mim curiosos.
— E então? - meus pais perguntam.
Mas eu os ignoro e vou em direção a Peeta.
— O que você fez? - pergunto e ele me encara assustado.
— Nada - ele responde se esquivando.
— Peeta - digo - não diga que você... - pensei em dizer fez uma besteira, mas isso era obvio.
— Sim - ele diz e eu não faço ideia do que ele ta falando, mas sei que nao foi nada que a orgulhasse a Capital - Fiz uma homenagem aos mortos no confronto.
— Você fez o que? - minha mãe pergunta vindo em nossa direção - disse que tinha atirado facas.
— Eu menti. Sabia que você ia ficar furiosa - ele diz - desculpe.
— O que realmente você fez? - meu pai pergunta.
— Desenhei as silhuetas de Finnick, Rue, da tia Prim, e um tordo - ele diz olhando para baixo.
— Você quer nos entregar de bandeja? - minha mãe pergunta.
— Não, eu só queria... - ele começa a dizer mais a cara da minha mãe o faz parar - desculpa.
— Mãe não o incrimine - digo - mas você também quer ser um alvo?
— Não Mira, eu só queria chamar atenção - ele diz.
— Peeta você desenha? - meu pai pergunta.
— Não como o senhor - ele diz.
— Por que nunca me falou? - meu pai pergunta.
— Peeta estamos no meio de uma confusão - minha mãe diz a meu pai - isso não é o que importa.
— Katniss você fez a mesma coisa, eu fiz a mesma coisa e estamos aqui - meu pai diz bravo, e estranho, já que ele nunca falou com a minha mãe assim - Peeta, filho, por que você nunca me falou.
— Você sentiria vergonha de mim - ele diz.
— Peeta largue de ser bobo - digo - já vi os seus desenhos e sei que são ótimos.
— Você me deixaria ver? - meu pai pergunta.
— Pai não são tão bons quanto o seus - ele diz - na realidade não são bons.
— Eu não me importo - meu pai fala.
Peeta entrega um caderno a meu pai, que se espanta a ver a habilidade de Peeta - na realidade você desenha muito bem.
— Não acho que sejam tão bons - Peeta diz - são apenas esboços.
— Peeta são muitos bons - meu pai diz - se esses são esboços, amaria ver os prontos.
— Serio pai? - Peeta pergunta.
— Claro Peeta - meu pai diz devolvendo o caderno.
— Ótimo, fico feliz q tenham resolvido seu problema, mas agora o que realmente importa é a besteira que Peeta fez - minha mãe diz e puxa a orelha de Peeta literalmente.
— Ai mãe - ele grita.
— Devia fazer pior - ela diz enquanto puxa ele até um lugar onde ninguém nos ouça - Mira diga o que você viu.
— Apenas borrões no chão - digo - apagaram o desenho mas sobrou tinta no chão.
— Eles estavam furiosos - minha mãe diz - Eles fizeram o mesmo com seu pai no 3º massacre.
— Eles não o mataram - Peeta diz.
— Mãe tem que admitir - digo - O jogo foi igual pra vocês que se rebelaram e para a Johanna que fez o que mandaram na apresentação.
— Mira você não entenderia - ela diz.
— Por que não? Por que nunca estive na arena? - pergunto - Por que eu estive, e foi uma das piores situações que eu passei, mas eu estou viva.
— Não fale assim comigo - ela diz.
— Então não me trate como se eu fosse uma garotinha inofensiva - digo.
— Mira você é minha filha - ela diz - para mim sempre será uma garotinha inofensiva.
— Sinto muito, mas não sou uma garotinha, muito menos inofensiva - digo - aqueles desgraçados me transformaram no mostro que eu sou. Criaram meus medos. Destruíram meus sonhos.
— Por isso eu tenho que acabar com eles - ela diz - Mas Peeta está acabando com o plano - ela da um tapa na cabeça dele. Surpreendo-me com ela praticando esses meros atos de violência contra Peeta, o filhinho da mamãe.
— Katniss você está exagerando - meu pai diz - Peeta não fez nada de errado. Tudo bem, ele pode ter passado dos limites, mas ele nunca irá estragar a "evolução".
— Tudo bem - minha mãe diz - Mas fique de olho nele lá dentro, Mira.
— Eu já ia ficar - digo - mas pode deixar.
— Não queria que vocês fossem - ela diz - queria tanto ir no lugar de vocês.
— Eu não estou mais me importando de ir - digo - Só queria que ela não fosse.
— Você não pode estourar sua bolsa d'água como um balão? - Peeta pergunta.
— Não sou um balão Peeta - digo.
— Foi uma brincadeira - ele diz.
— Mas não foi engraçado - digo.
— Peeta venha - meu pai diz - me mostre suas obras, antes que faça sua irmã explodir.
Peeta começa a rir.
— Explodir - ele diz - por que ela ta inchada e gorda.
— Não Peeta - digo - explodir sua cabeça como um balão, por que só tem ar ai dentro.
— Parem de brigar - minha mãe diz.
— Não estou brigando - digo - se estivesse ele já estaria com os dois olhos roxos, só por causa do gorda.
— Mas você ta mesmo - ele diz.
— Vamos filho - meu pai diz saindo - tenho que te ensinar como falar com uma mulher. Principalmente com uma gravida.
Eles saem e eu sento no sofá e minha mãe se senta ao meu lado.
— E você? - ela pergunta.
— Encantei eles - digo.
— Diga algo menos obvio - ela diz rindo.
— Isso foi um elogio? - pergunto rindo também.
— Serio querida, o que você fez? - ele diz se ajeitando no sofá.
— Disse que estava incapaz de fazer mais do que atirar flechas num alvo - digo.
— Fez drama? - ela pergunta - Verdade, quando você não faz drama?
— Um elogio, agora uma critica - digo - a senhora é difícil de acompanhar.
— Como você está? - ela me pergunta.
— Com dor nas costas, pés inchados, devo ter engordado mais dez quilos nos últimos dias - digo - isso é o bastante?
— Não estou me referindo a sua gravidez - ela diz - como você está?
— Bem, eu acho - digo.
— Você acha? - ela pergunta.
— E como a senhora está? - pergunto.
— De fato curiosa e preocupada com o seu "eu acho" - ela diz.
— Como se sentiu quando estava gravida e prestes a ir para a arena? - pergunto.
— Mira, você sabe que... - ela começa a dizer.
— E se realmente estivesse? - pergunto - de mim.
— De você - ela solta um riso abafado - Acho que estaria mais apavorada do que realmente estava - ela diz - E sem duvida teria uma outra estratégia.
— Estratégia? - pergunto.
— No massacre planejei morrer para salvar seu pai - ela diz.
— Mas se estivesse gravida o que faria? - pergunto.
— Te salvaria - ela diz - e sei que seu pai faria o mesmo.
— Salvaria como? - pergunto.
— Eliminaria todos - ela diz deixando uma lagrima brotar no seu rosto.
— Mas e se sua gravidez estivesse em um alto grau, e se eu nascesse na arena - digo e ao olhar seu rosto compreendo sua resposta - Você se sacrificaria por mim?
— Não pensaria duas vezes - ela diz.
As lagrimas escorreram pelo meu rosto e logo começaram a descer pelo dela.
— Me daria a sua vida? - pergunto.
— Não sou capaz de te ver morrer - ela diz - prefiro morrer a isso.
— Acha que eu sou capaz de me sacrificar pela minha filha? - pergunto.
— Meu coração me faz dizer não - ela diz - Mas sei que seu coração é grande o bastante para fazer isso.
— Não quero que ela nasça lá - digo - será que não poderia tomar alguma coisa para acelerar o parto?
— Você tem dois dias - ela diz - acho melhor segura-la ai dentro do que tentar tira-la antes.
— Isso é trágico - digo - falando em trágico, onde está Jace? - pergunto.
— Por que trágico te lembra dele? - ela pergunta.
— Uma história boba - digo - Mas você o viu?
— Não, não o vejo desde ontem - ela diz - mas acho que ele voltou para o vitorioso.
— Sem me avisar? - pergunto.
— Mira, ele e Haymitch tiveram que voltar para resolver alguns assuntos - ela diz.
Deve ter a ver com a rebelião, ver Jace como um dos principais organizadores dela me assusta.
— Tudo bem - digo.
— Amanha é sua entrevista é melhor você ir dormir - ela diz.
— Mas e as notas? - pergunto.
— Você quer realmente saber? - ela me pergunta.
— Mas estou com fome - digo.
— Então vai se juntar ao jantar? - ela pergunta.
— Se a senhora me acompanhar - digo - talvez não tenhamos muitos jantares formais daqui pra frente.
— Tem razão - ela diz - Vou amar jantar com você.
— Vou tomar banho - digo - mas nos vemos no jantar.
— Te esperarei - ela diz - bom banho.
Vou rumo ao quarto pensando nas palavras da minha mãe.

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