O Sabor da Morte

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No alto de um enorme prédio, recostado a um para-raios, estava Bell. Invisível aos olhos humanos, dedicava seu tempo livre a observar àquelas pessoas tão distraídas com seus próprios problemas. O vento forte balançava seu longo manto negro e, ao arrumar o capuz, dirigiu sua atenção para o quarto de uma jovem no edifício a frente, observando-a com atenção.

A garota de 20 anos estava entretida em seu notebook, pesquisava sobre demônios e isso arrancou um riso irônico de seus lábios. Demônio, do latim daemoniu, seres que na antiguidade eram ligados a catástrofes naturais, doenças e guerras... "Gênios" inspiradores do bem e do mal, que influenciavam o caráter e o destino dos humanos... Rebeldes condenados ao inferno que procuravam a destruição da humanidade. Havia tantas atribuições, significados e origens, e ainda assim os homens procuravam informações sobre eles para tentar repeli-los ou os invocarem a procura de poder, riqueza ou vingança.

Nascido em um mundo regido pela violência, de céu avermelhado e nuvens negras que se iluminavam com as chuvas de raios, ele só podia sobreviver! Apenas os mais fortes ou espertos – e inteligentes – perduravam por séculos e, depois de décadas, ele atravessou o portal que separavam suas dimensões. Ainda devia tributos a um dos Senhores Infernais, mas agora podia saborear com relativa tranquilidade cada nuance da alma humana, bem como se deleitar no sabor indescritível da morte de cada indivíduo ao alcance de suas garras.

Distraído por tais lembranças, Bell parou de observá-la e demorou alguns segundos para identificar a localização de sua próxima vítima e de imediato se ergueu, liberando suas grandes asas negras. Ao levantar o braço direito, revelou a tatuagem tribal que se estendia de sua mão ao cotovelo e em segundos ela deixou sua pele para se transformar em uma longa e afiada foice! Para absorver e se alimentar das mortes dos seres humanos, era necessário à manifestação de uma arma concedida por seu "mestre", que poderia ter qualquer forma e ele escolheu a foice por sua ligação com a morte na simbologia dos homens.

Lançando-se no ar, Bell farejou sua presa e a encontrou ao celular, parada próxima a um cruzamento. Era um homem de boa aparência, executivo, chegando aos seus 50 anos e com um movimento de sua foice, ele o atravessou, capturando o fio da vida, a essência daquele homem.

Rindo ao celular, o executivo deu passos para frente e em segundos dois carros em alta velocidade vieram em sua direção, chocando-se... E entre os dois automóveis encontrava-se o homem agonizando, seu sangue se esvaindo. Em meio à gritaria e o desespero, Bell observava impassível, absorvendo a energia liberada no momento da morte e a ofertando ao seu senhor.

Aproximando-se, Bell recolheu algumas gotas de sangue e, levando à boca, suspirou em deleite ao provar seu sabor. Olhou mais uma vez a cena, que para os humanos chegava a ser aterrorizante, e alçou voo, ganhando as alturas, seus pensamentos voltando a se focar naquela jovem.

Foi quando sentiu algo passar por si como um raio. Uma energia sombria que vinha de outro demônio... Um demônio que realizava o desejo de vingança de alguém, que ansiava a morte dela, da sua humana preferida!

"Não." – a iminência de perdê-la causou-lhe um estranho incômodo e, antes que pudesse pensar direito, já estava indo ao encontro dela.

Não demorou muito e logo ele a viu observando as estrelas do terraço. Ela ainda estava bem, mas o cheiro da morte se intensificava, mostrando-lhe que não restava muito tempo! Bell não precisava se esforçar para saber como tudo terminaria. Em breve a cobertura pegaria fogo e, ao tentar sair, a porta da sala - e a do terraço - emperraria, trancando a jovem dentro do apartamento... E o fogo seria tão intenso que se tornaria impossível reconhecer seu corpo carbonizado.

Bell pousou próximo a jovem, observando seu bonito cabelo acobreado se mover com a brisa agradável e ficou pensando sobre o que poderia fazer. De forma lenta, ela se virou e ficou de frente para ele, que por um momento se perdeu observando os bonitos olhos verdes, até perceber que a garota o olhava diretamente como se o visse.

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