Capítulo 41

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Tarde de domingo. Eu perambulava sem rumo pelas ruas próximas da Avenida Paulista, quando vi de longe Aaron com aquele semblante entristecido. Não conseguia sentir seu cheiro em meio a tantos outros, então logo constatei que ele não poderia sentir o meu também. Fiquei petrificada admirando a imagem daquele homem enigmático, e antes que ele me notasse, entrei no metrô e corri escadarias abaixo, querendo pegar o trem que ainda estava na plataforma prestes a fechar as portas. Segui, então, até o local onde poderia pegar um ônibus para o litoral, e quando dei por mim, eu já seguia pela estrada.

Desci do ônibus assim que terminou o trecho de Serra. Eu queria ver a vista de uma ponte próxima dali, apreciar a bela paisagem. Comecei a correr. Meus cabelos negros tremulavam com o vento, meus pelos se eriçavam com a rajada de ar do mar. Foi aí que me dei conta de como estava sozinha.

Ao chegar onde eu queria, a vista era a de um infinito mar azul-escuro de ondas brandas. Sorri de um jeito puro e sincero como havia tempo que não conseguia. Aproximei-me mais ainda da ponte e finquei as mãos nos canos de aço que protegiam sua borda. Talvez eu quisesse dar a mim mesma a certeza de não me atirar dali de cima e tentar morrer sem lutar para ficar viva. Olhei para baixo e calculei que sob meus pés haveria uns quarenta metros até a superfície da água.

O Sol se deitava no horizonte transformando o céu azul em um tom vermelho como sangue. À minha mente, pensamentos sobre os motivos de eu ser "especial" explodiam sem me dar chances de procurar explicações. Olhei em volta, pois ouvi distante um carro se aproximar, mas de repente tudo se transformou em silêncio. Balancei a cabeça tentando me livrar de uma conhecida sensação, mas seria impossível já que ela era inesquecível aos meus sentidos.

— Eu sei que você está aqui. — sussurrei.

Num único e ágil movimento, coloquei-me em cima da mureta de proteção da ponte. Devia ter menos que dez centímetros de largura, mas a agilidade com que fiquei de pé sobre ela chegou a me assustar. Meu corpo agora de frente para o abismo. Um abismo negro e aparentemente infinito de águas calmas. Senti a boa sensação ainda mais forte e perto, em passos lentos que vinham em minha direção. Suspirei, pois naqueles instantes um ar de desejo se projetou de modo esmagador sobre mim.

— O que faz aqui? — perguntei baixinho como se ele estivesse com o rosto colado ao meu. Aaron não respondeu, parado, somente me observando, talvez esperando que eu olhasse em seus olhos — Será — retomei o pouco fôlego que tinha e prossegui. — Será que morrerei se me jogar daqui?

Ouvi seus passos se aproximarem ainda mais. Senti que ele acreditava que eu era mesmo capaz de tentar dar fim a minha existência.

— Não se aproxime! Posso colocar à prova a teoria da nossa vida eterna. — lentamente me virei para ele, e não pela primeira vez, vi em seus olhos o medo de que algo ruim pudesse acontecer comigo. — Se você se aproximar, juro que vou me jogar daqui e deixarei meu corpo afundar como uma pedra.

— Eu não deixaria você afundar, jamais. Eu pularia e traria você de volta, mesmo contra a sua vontade.

Ouvi-lo era sempre um prazer, mas ouvi-lo dizer tais palavras ascendia em meu coração um sentimento novo. Não era amor, não era paixão, não era desejo, era algo muito maior, muito mais forte.

— Aham. — eu disse com sarcasmo — Eu sou a chave. Vocês precisam de mim, por isso você não pode simplesmente me deixar aqui e me esquecer.

— Na verdade... – ele começou com a voz fraca. — Estive procurando por você pela cidade inteira. Mesmo a contragosto, coloquei meus soldados focados em você, em achar VOCÊ! Você não poderia simplesmente ter partido daquele jeito. Ter nos deixado sem explicações.

Redenção - Reflexos do PassadoOnde histórias criam vida. Descubra agora