Permaneci o restante da noite sentado no sofá assistindo série e por volta das três da manhã ouvi o barulho de coisas caindo no apartamento de Ava. Parecia até o alerta dela para me avisar de que estava com alguém. Aumentei o volume da televisão e rezei para que os vizinhos não começassem a bater vassouras, mas se eles não se importavam com o sexo barulhento de Ava então não se importariam com minha tentativa de não ouvir ela transando loucamente.
Queria ir até lá e dar uma surra no cara e colocar ele para fora, mas eu tinha perdido qualquer autoridade já fazia tempo.
Continuei tentando assistir por mais meia hora, mas minha cabeça parecia que ia explodir a qualquer momento. Coloquei um moletom e sai decidido a fazer uma caminhada para espairecer. E pensar que antes de toda essa coisa com a Ava acontecer, eu costumava ser uma pessoa atlética e que frequentava a academia regularmente.
Fechei a porta do apartamento com força e quando me virei para o corredor vi um cara saindo do apartamento de Ava e ela escorada no batente da porta. Era a primeira vez que eu dava de cara com algum dos imbecis que transavam com a minha ex-namorada.
Olhei para ela e depois para ele, mas minha expressão de surpresa parecia ter deixado ele confuso, já que ele também olhou para ela. Fechei as mãos com força e me esforçando para não enfiar a mão nele. Finalmente eu tinha um rosto para uma das pessoas que tomavam meu lugar.
Respirei fundo e caminhei até o elevador, rezando para que ele não se atrevesse a entrar naquele cubículo comigo. Ele era mais idiota do que eu imaginava, pois assim que apertei o térreo ele entrou. Fechei os olhos e comecei a contar até onde minha paciência aguentava. Queria segurar aquele babaca pelo pescoço e mandar ele não chegar mais perto da minha namorada, mas eu não podia. Nós não namorávamos mais e eu tinha dito para ela seguir em frente, e era isso que ela estava fazendo, seguindo em frente enquanto eu só andava para trás.
Assim que o elevador abriu a porta no térreo, sai rápido como se estivesse sufocando lá dentro. Coloquei os fones no ouvido e comecei a correr sem um destino certo. Continuei correndo até que minhas pernas começassem a doer, e quando isso aconteceu corri mais rápido ainda.
O sol já estava nascendo e algumas poucas lojas estavam abrindo. Olhei no celular e vi algumas mensagens da minha mãe e Rachel. O relógio marcava seis e meia, e me surpreendi por ter conseguido correr por mais de duas horas.
Eu não queria parar, queria continuar correndo até cair e não conseguir mais andar. Parei para respirar calmamente por alguns minutos e ler as mensagens. Ava provavelmente contou para Rachel que contou para minha mãe. Era como se as três fossem uma família extremamente unida para acabar comigo.
"Onde você está, Jack? "
"A Ava contou que você viu um cara saindo da casa dela, você está bem? "
"Se você não responder eu vou avisar a mamãe".
"Avisei ela, se vira agora! "
"Querido, onde você está? Sua irmã me ligou preocupada, está tudo bem com você? "
"Jack, por favor, querido. Ligue para mim, estou preocupada".
"Idiota, se você não quer me responder pelo menos responde a mamãe".
"Jack, ligue para mim assim que possível".
Eu queria matar Rachel. Ela sempre tinha que colocar nossa mãe no meio, isso quando não era Ava ligando para ela.
Disquei seu número e meu pai atendeu bravo.
- Onde você se meteu, garoto? – meu pai rosnou – Sua mãe ficou preocupada com você.
- Eu fui correr um pouco.
- Voltou a se exercitar?
- Estou voltando.
- Bom, bom. – eu podia imaginar ele assentindo ao falar. Meu pai e Rachel tinham jeitos tão parecidos que conseguia imaginar suas expressões e gestos ao falar. – Cadê o telefone? Eu quero falar com ele. – ouvi minha mãe gritando ao lado. – Jack, onde você está?
- Estou perto de casa, eu estou bem. – suspirei.
- Sua irmã ligou aqui toda preocupada com você...
- Vocês não precisam mais ficar se preocupando comigo, sabia? Já estou bem perto dos trinta...
- Isso não é desculpa, Jack, você sai de madrugada sem avisar ninguém.
- Agora vou ter que ficar avisando vocês toda vez que for sair?
- Você não atendia o celular...
- Fala pra Rachel e a Ava começarem a cuidar mais da vida delas. Eu saí para correr, ok? Vocês estavam sempre me enchendo o saco para voltar a fazer coisas que eu gostava e eu voltei.
- Tudo bem, querido. – ela disse num suspiro.
- Já estou chegando em casa, estou inteiro e bem. Tchau, mãe.
- Tchau, querido.
Me esforcei ao máximo para correr de volta para casa e quando cheguei na rua pude ver Ava sentada na escada. Assim que me aproximei do prédio ela se levantou e arrumou sua saia. Tirei o moletom e passei pelo meu rosto suado. Ela ficou encarando meu peito e pareceu envergonhada por ter sido pega.
- Oi. – ela alisou a saia.
- Oi.
- Você me assustou hoje de madrugada. – ela colocou o cabelo atrás da orelha.
- Eu não conseguia dormir. – dei de ombros – O barulho estava muito alto. – sorri cínico.
- Desculpa.
- Tudo bem. – suspirei – Vou subir, preciso tomar um banho.
Subi os degraus até o hall de entrada e ela me chamou.
- Oi?
- Você quer fazer algo hoje? Tomar um café ou coisa assim.
- Não, obrigado.
Dei as costas para ela e caminhei até as escadas. Subi correndo até o sétimo andar, coisa que eu achava que não ia conseguir, mas cheguei vivo até meu apartamento.
Tomei um banho gelado e fiquei o restante da tarde bebendo todo meu estoque de cerveja. Era uma péssima ideia encher a cara desse jeito, pois eu tinha que trabalhar no dia seguinte, mas isso era uma coisa que o antigo Jack fazia e todo mundo achava superengraçado.
Ava tinha razão, eu estava apenas existindo. O antigo eu costumava fazer brincadeiras com os colegas de trabalho e convencia todo mundo a ir para o bar em plena segunda-feira, mas o atual ignorava qualquer pessoa e recusava até as confraternizações no trabalho.
Tentei levantar para ir até o quarto, mas assim que fiquei em pé minha cabeça começou a rodar e cai sentado no sofá. Eu não conseguia distinguir se estava bêbado ou apenas tonto.
A campainha ficou tocando por uns cinco minutos e achei que fosse Rachel, então resolvi ignorar como quase sempre, mas me assustei quando ouvi a porta abrindo e Ava adentrando meu apartamento.
- Como você entrou? – perguntei rindo. Ela ergueu um chaveiro de ursinhos e sorriso cínica para mim – Como você conseguiu uma chave?
- Eu morei aqui por quase três anos, lembra? – ela revirou os olhos.