Capítulo X

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  Eu estava irritado, extremamente irritado com o que tinha acontecido. Devia ter uma regra que garantisse que nossos sonhos fossem nossa propriedade privada. Levei anos e mais anos para me acostumar com Absolei e o Chapeleiro os invadindo, e agora não vou aceitar uma simples Sonhadora também.

  O problema é que eles sempre dissipavam o sonho, e ela parecia ter literalmente feito parte dele. Talvez a Rainha estivesse errada, os Sonhadores têm uma natureza extremamente perigosa, e Katherine não é uma exceção. Logo depois de ter meu sonho invadido, baguncei os cabelos ainda meio grogue e abri a janela.

  A brisa quente da noite parecia estar abafada demais, e isso me dizia que nos seguintes dias ia chover muito. Inferno. Peguei o celular que estava ali perto e vi mensagens de Merida e da Lebre de Março, além de três chamadas perdidas de Shepon. Abri primeiro a mensagem da Ruiva.

"Você é um idiota."

  Segurei um sorriso, mas nada respondi. Com certeza quando ela acordasse e visse que não a respondi já seria um pé de guerra. Já a mensagem de Johnny era só um ponto, esse moleque é doente. Assim que visualizei ele começou a digitar.

"Sabia que ia acordar de madrugada. Me explica que palhaçada foi aquela."

  Revirei os olhos e marquei a mensagem como não lida e joguei o aparelho sobre a escrivaninha, apoiando as mãos entrelaçadas atrás do pescoço. Fiquei assim por um bom tempo até a tela do celular acender, e mostrar a foto que o próprio Shepon tirou para ser a do seu contato. Encarei a tela por uns segundos, mas acabei o colocando no mudo e o virando para baixo, não queria ouvir a voz de ninguém. Larguei a janela aberta mesmo e retornei para o sofá-cama, enterrando o rosto no sofá e me entregando novamente ao mundo dos sonhos.

  O sol quente da manhã me despertou, e acordei com a camisa ensopada. No celular tinha mais de quinze ligações do pirralho, mas não ia falar com ele agora, tinha um problema para resolver. Minha mão estava coçando para acertar alguém.

  Na mesa todos me olhavam segurando o riso, menos Katherine, que estava vermelha. E não, não tínhamos dormido juntos. Merida e Soluço devem ter achado que era engraçado colocá-la na minha cama.

  Assim que a Sonhadora se levantou, eu segui para o quarto, mas depois desviei a rota para o lugar que ela tinha ido. A porta estava fechada, mas assim que a abriu eu a empurrei para dentro, fazendo suas costas se chocarem com o vidro do box.

― Você. ― Eu disse irritado, a fazendo se encolher quando dei dois passos para frente.

― O que pensa que está fazendo? ― Ela perguntou sem graça, desviando o olhar do meu.

― Eu sei o que você fez, e não gostei nem um pouco. ― Falei num tom baixo, parando bem na frente dela, de um jeito que não conseguisse sair. Ao mesmo tempo que meu olhos cintilavam de raiva, sentia certo aperto no peito.

― Carter! ― Ela disparou quando segurei seus pulsos e a sacudi de leve.

― Não quero você perambulando por aí nos sonhos alheios. Nem na minha cama. ― Disse apertando seus pulsos um pouco mais forte. ― Esse é o primeiro aviso, e odeio repetir as coisas.

Ela levantou os olhos até os meus pela primeira vez, como um desafio.

― Eu não fiz nada, porque está me ameaçando? Você está me machucando. ― Katherine disse séria.

― Eu sei que estou. Se não quer que isso aconteça de novo fique longe dos meus sonhos. ― Falei finalmente soltando seus braços, sem sair da sua frente.

― Como assim entrei nos seus sonhos? Com quem estava sonhando antes? ― Ela perguntou, me fazendo soltar um rosnado baixo.

― Não interessa. ― Isso saiu mais como um resmungo.

― Interessa sim, se entrei lá foi por um motivo. Nunca ouviu falar que estamos exatamente onde devemos estar? ― Katherine perguntou com um tom irônico, para disfarçar que estava com medo de mim.

― E você, nunca ouviu falar que podemos estar no lugar errado e na hora errada? ― Perguntei entre os dentes.

― Sim, já ouvi. Tipo você agora. Quero ir no banheiro, vai querer segurar o papel higiênico pra mim ou vai sair? ― A garota perguntou puxando o ar e tremendo de leve para esticar a mão e abriu a porta, me contornando.

― Garota abusada. ― Resmunguei saindo do banheiro e batendo a porta forte atrás de mim.


  Passei pela sala sem me importar que vissem de onde saí, mas os três estavam na mesa, jogando bolinhas de miolo de pão uns nos outros. Abri a porta do escritório com um chute, e a fechei atrás de mim. O celular estava com aquela luzinha piscando, e assim que o desbloqueei, vi mais cinco ligações de Shepon. Praguejei e liguei de volta para ele, que atendeu automaticamente.

― VOCÊ QUER ME MATAR DO CORAÇÃO? ― O pequeno gritou, me fazendo afastar um pouco o aparelho da orelha.

― Não. ― Disse dando uma pausa para respirar depois. ― O que você quer, eu disse que não ia voltar para casa de noite.

― TINHA ALGUÉM AQUI. ― Ele gritou de volta.

― Óbvio, você. E pode ter sido Absolei também, o encontrei uns dias atrás.

― Duvido que tenha sido ele, deixou um presentinho para você. ― Pela primeira vez Shepon não gritou, e eu agradeci. ― Olha minhas mensagens. Eu mandei fotos.

― Certo Shepon. Tanto faz. ― Falei e em seguida suspirei. ― Vou passar em uma padaria e depois vou pra casa com o almoço.

― Olha as mensagens. ― Foi a última coisa que disse antes de desligar.

  Bufei e fui arrumar o quarto, no fim, a curiosidade venceu. Abri o chat com ele e vi muitas mensagens com letras aleatórias, para chamar minha atenção. Tinha somente um imagem, afinal.

  A abri e ela demorou um pouco para carregar, estava desfocada também, o que não ajudava muito. Vi que Shepon a tinha tirado da janela de seu quarto, e o polegar estava um pouco em cima da câmera. Deu um zoom com os dedos e logo vi o que Shepon tanto temia. Bem no meio do meu jardim tinha um corpo de um cervo dilacerado. O animal que fez aquilo o tinha arrastado por bastante tempo, e não o havia comido, somente destruído.

Com certeza era um aviso. E eu não tinha gostado nem um pouco.

 Só espero não parecer com um dos três porquinhos.


~~ Nota das Autoras ~~

E aí, o que estão achando?

Bjks lokas, Azllana


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