Minha mãe chorou quando falei que eu ia morar com o Mateus. Na época, eu tinha dezenove anos e era louco por aquele imbecil. Ele me tratou bem por um bom tempo, mas nossa rotina nos massacrou. Minha mãe disse que eu era louco por aguentar tanto tempo, foram longos cinco anos. Ela disse para eu voltar para casa, que meu quarto continuava lá para mim. Eu jamais retrocederia.
Minha prima Lotte também me ofereceu seu apartamento em Seropédica, ela não morava mais no Rio. Eu não quis pelo motivo de ser 'emprestado', sabemos que família é uma coisa muito imprevisível. Vai que, do nada, ela volta e quer o apê de volta?
Yan, meu melhor amigo desde o ensino médio, me ofereceu um quarto na casa dele. Eu não mudaria de estado; eu estou no sexto período de Administração e não sou maluco de largar tudo.
Richard, meu outro amigo, foi o mais sensato. Disse: "Vende sua parte para o Mateus e com o dinheiro você aluga uma coisa". Mas aí estava o problema, aluguel. Eu queria algo meu. Eu também comprei aquela bendita casa, merecia e iria ganhar mais que quinze mil reais.
Com a ajuda de Yan, meu advogado, consegui um bom acordo. Com o dinheiro comprei um apartamento pequeno e em um bairro quase péssimo. Mas era meu.
Em duas semanas eu já tinha boa parte da mobília que eu desejava. O resto eu iria ter que conseguir com mais dinheiro, o que implicava em ter um emprego, coisa que nunca precisei.
Já ouviu falar de QI? *Quem Indica*. Eu tinha meus contatos, César era enteado da dona de uma das mais renomadas empresas do Brasil, pedi uma ajudinha e em dois dias eu estava com entrevista marcada.
Nunca tinha usado terno na vida. Gravata para Mateus e eu era apenas para fins sexuais. Meu cabelo já não era o mesmo que o da minha adolescência. Quando terminei com o imbecil, raspei a cabeça e adotei uma nova postura. Decidi ser maduro, ser menos transparente. Mas olhando meu reflexo, todo arrumado e sério, a risada veio explodindo na minha garganta.
Eu devia ser o único do meu círculo de amigos sem carro ou moto. Da minha casa ao prédio eram duas conduções, um ônibus por quinze minutos e um trem por trinta. Com sorte, não fui assaltado, nem apalpado e muito menos me atrasei.
Sair da Baixada Fluminense para mim foi um choque. Visitar o Rio era uma coisa, morar era quase completamente diferente. Os prédios enormes ainda me assustavam, eu não via uma pipa e muito menos crianças na rua. Sentia falta dos vizinhos barulhentos e das briguinhas por nada.
Na sala de espera, vi muitos candidatos aguardando ansiosamente serem chamados. Até então eu não estava assustado. A mulher de vestido longo preto vinha e chamava o nome, a voz calma e sempre séria.
Um rapaz com o cabelo com reflexo platinado e olhos preto ficou me encarando, mas nem dei bola. Eu sou mais o tipo de homens fortes e com olhares que desmontam. Ele apenas provocava, era faísca. Sorri de lado e desviei o olhar.
Num certo momento, depois de duas horas esperando, decidi esticar as pernas e comecei a sair na sala de espera, mas fui atropelado por um homem. Ele vinha rápido, no celular, seguido por um casal de robôs corporativos. Sem esperar por aquele trombo, quase caí no chão, acabei me segurando nele, mas o soltei rapidamente. O olhar dele quase me fez correr, parecia vidro, um verde intenso, um mar de Ipanema. Eu queria ouvir ele dizer desculpa, mas ele apenas desviou o olhar e saiu como se nada tivesse acontecido, o celular ainda no ouvido e os robôs correndo logo atrás. Meu olhar também o seguiu. Aquele terno bege, a camisa azul clara, a gravata cinza, o cheiro de perfume desconhecido e os olhos, aquelas duas bolas verdes que combinavam com a pele negra, morena. MEU DEUS!
Ouvi meu nome ser chamado, me trazendo para a realidade novamente.
Consegui o emprego. Não porque tinha competência. Eu riria se pudesse, mas era porque eu "tinha um rosto bonito, era educado e aparentava ser educado". Seria estagiário do sr. Carvalho. Ele era sócio da Thais, mãe do César.
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Ponto Fraco
Romance(Quarto Conto) Após o fim de um longo relacionamento, Joel decide mudar de vida, consegue um estágio de assistente de um dos empresários da Empresa de um dos amigos e até muda de casa. Com um de seus melhores amigos longe e o outro tendo seus própr...