- André?
- Sou eu - sorri e eu reviro-lhe os olhos - Vá, diz.
- O que é que foi aquilo em tua casa na outra noite?
- Aquilo o quê?
- Tu sabes. Aquilo que aconteceu na casa de banho...
- Não sei mas gostava de saber... - insiste e eu entro no jogo.
- O beijo...
- Estás a falar do beijo que te roubei em troca da tua passagem? - limito-me a dizer que sim com a cabeça - Foi só um beijinho.
- Só um beijinho?!
- Sim, um beijinho entre amigos - you've been so friendzoned!
- Não sei o que é que andas a fazer com as tuas amigas mas eu não tenho por hábito beijar os meus amigos...
- Eu também não anda aí a beijar qualquer rapariga mas foi uma brincadeira sem segundas atenções. A não ser que queiras que tivesse sido mais...
- Não, não queria - liar!
- Pronto, então estamos esclarecidos? - volto a acenar com a cabeça - Queres ir para casa? Está a ficar frio...
- Podes ir se estás com frio, eu fico e apanho um táxi.
- Eu não te vou deixar sozinha aqui!
- Podes ir, André, a sério.
- Eu quero ficar - reclama.
- Faz como bem entenderes.
- Está tudo bem? - mais uma vez apenas aceno com a cabeça - Ficaste estranha de repente...
- Eu sou estranha.
- E seca...
- E todos os nomes que me quiseres chamar se isso te fizer sentir bem.
- Calma, miúda, estou só a brincar - defende-se.
- O problema é esse, gostas muito de brincar.
- Não sei o que queres dizer com isso.
- Nada, André. Não quero dizer nada. Tens razão, está a ficar frio e devíamos ir para casa - levanto-me e vou em direção ao seu carro enquanto o ouço a chamar pelo meu nome ao mesmo tempo que me segue mas eu ignoro - Podes abrir o carro, por favor?
- Não enquanto não me disseres o que se passa - do nada aparece perto de mim e coloca as suas duas mãos em cima do carro, em cada lado da minha cabeça e fico "entre a espada e a parede".
- Estás a desrespeitar a distância de segurança, André - digo quase em forma de sussurro porque o rapaz me deixa sem fôlego - Podes parar com a brincadeira? Pode resultar com as outras mas não vai resultar comigo.
- Porra, Mafalda! - grita, assustando-me - Tu não percebes, pois não? Isto para mim não é brincadeira nenhuma! Aquele beijo não foi brincadeira nenhuma! Os meus sentimentos por ti não são brincadeira nenhuma e gostava de poder saber se é mútuo da tua parte - nunca tira o seu olhar dos meus olhos enquanto profere estas palavras e sei que está à espera de uma resposta vinda de mim.
- Abre o carro, por favor - o rapaz continua a olhar para mim e desta vez sinto desilusão no seu olhar. Acaba por desistir e afastar-se, abrindo o carro para onde eu entro assim que tenho oportunidade. Ele faz o mesmo de seguida.
Arranca sem proferir uma única palavra. É talvez a viagem mais intimidante e constrangedora que tive na vida. O rapaz nem o rádio ligou e se estivéssemos noutros termos eu teria coragem para o fazer mas desta vez não me atrevo a tanto. Puxo as pernas contra o peito e enrolo-as com os meus braços enquanto encosto a cabeça pela janela, deixando-me adormecer com o silêncio.
[...]
- Mafalda... Mafalda... Acorda! Estás em casa - abro os olhos lentamente e sinto uma dor enorme no pescoço da posição pouco cómoda em que me deixei dormir - Adormeceste - no shit, Sherlock! - Ainda pensei em levar-te ao colo até lá a cima mas tive medo que acordasses a meio do caminho e me desses porrada - brinca ainda que com receio.
- Desculpa, André - não sei mais o que lhe posso dizer.
- Pelo quê?
- Tu sabes...
- Gostava de ouvi-lo pela tua boca - puxa por mim.
- Desculpa por te ter tratado daquela maneira, tu não mereceste. Só não gosto que gozem com os meus sentimentos...
- Quais sentimentos? - brinca e é prendado com uma chapado no braço.
- Não gozes, páh! Estou a tentar pedir-te desculpas e tu estragaste tudo!
- Desculpa - continua a rir-se - Podes continuar, estou a gostar de ouvir.
- Pois mas agora acho que já não mereces - digo e mais uma vez o silêncio instala-se dentro daquele carro - É melhor eu subir. Acompanhas-me? - pergunto sem qualquer certeza de qual será a resposta dele.
- Acho melhor não. Acho que precisas de descansar e de pensar sobre os teus "sentimentos" - faz aspas no ar.
- Tens razão, eu preciso - lanço-lhe um sorriso sincero.
- Até amanhã, Mafalda.
- Até amanhã, André - estava já de porta aberta mas não resisto em virar a cara para trás e roubar um beijo ao André, na bochecha, ao qual o rapaz responde com um sorriso - Passa bem.
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Como assim o primeiro capítulo já ultrapassou e bem as 400 leituras???
Muito obrigada, pessoal!