Prólogo

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Não saber o que fazer. Ver a vida passando e sem sentido, sem alegrias concretas. Será que só eu sinto isso? Será que eu sou o único que percebe a mediocridade nos outros? A massa sendo arrebanhada pelos meios de comunicação, pelas novas "redes" de relacionamento. Pra mim, isso de deixar de lado os contatos sinceros e face a face e perenes é suicídio humanitário.

Bem, você deve estar se perguntando: quem é esse nerd de merda que se acha a última bolacha do pacote? OK, eu também não sou um Neandertal de constatar a importância da internet, Face, etc. Graças a eles, faço "amigos" até no Japão. Hoje mesmo conversei com Ishikawa na webcam.

Sou Demócrito. Que nome, hein? Pois é. Foi inspirado pelo grande filósofo pré-socrático graças às peripécias intelectuais de meu gracioso pai, químico formado pela UFG. Minha mãe, uma dona de casa dedicada, religiosa, fazendo o possível e o impossível para honrar sua família. "Imagina? Deixar meu marido ser motivo de chacota no trabalho por sua camisa mal passada? De jeito nenhum!!!".

Minha idade? Quinze anos. Meu hobby? Estudar. Estudar o que? Nem sei... Ultimamente passo por uns mal bocados. Não consigo me decidir se curso Filosofia ou Arquitetura. As duas áreas me fascinam.

Nas horas vagas? Certo, terei que admitir: sou aficionado por literatura. Desde que seja escrita com o coração do autor, eis-me aqui. Gosto mais de livros comprados em sebos. Sabe o que é isso? São lojas que se vendem principalmente livros usados. Aqueles com capas velhas, caindo aos pedaços, páginas amareladas são meus preciosos.

Namoro? Mesmo com esse jeito excêntrico de ser, tenho sim: se chama Letícia. Temos a mesma idade. Porém, ela acha tudo isso que gosto só baboseira. É linda. Não digo isso porque logo irá pegar esses manuscritos para ler. Pense em uma curiosa de carteirinha. Sabe aquela pessoa que quando está ao seu lado você não quer que o tempo passe?

Não acredito nessas coisas de "poder do nome", mas penso que no meu caso parece que isso dá certo. Demócrito era atomista, quer dizer, de uma forma bem simplista, ele acreditava que a menor parte que compõe os objetos é o átomo. Para formar uma massa, precisa-se de um agrupamento desse elemento. É o que tento fazer em minha vida.

Agrupar pessoas que podem somar, e não diminuir. Não sou um egocêntrico, antes que pense nisso. É que existem pessoas no mundo que querem nos destruir. Todos sabem que isso é concreto. Pra que vou manter uma amizade com trastes?

Agrupar conhecimento. Leio até bula de remédio! Percebo que TUDO, ABSOLUTAMENTE TUDO, é material para minhas obras. Quero também ser um escritor. Se conseguir alcançar, ao menos, a unha do dedão do pé de um Nietzsche, Dostoiévski, Kant, Shakespeare, Tolstoi, Machado de Assis, Clarice Lispector, Sartre, Kafka... Se for citar todos, terei que ficar minha vida inteira aqui escrevendo. No entanto, se não conseguir, não tem problema. Só de colocar minhas ideias no papel, já logrei êxito. Se no mínimo uma pessoa ler meus escritos, serei o escritor mais feliz da Terra.

Parece que nasci na geração errada. Gosto muito de tudo o que se relaciona com os séculos passados. XI, XII, XII... XVIII, XIX, XX. Se nestas épocas existisse internet, aí seria perfeito. No meu quarto, o que há de artigos de antiquário, qualquer um sentiria que voltou no tempo. Poderiam tanto inventar uma máquina que fizesse essa revolução tecnológica. O mundo que vivemos agora é produto do que muitos outros deixaram de viver em prol do altruísmo.

Odeio pessoas que dão palpite na minha vida. Dizem que isso é característica da adolescência. Será? Vejo até senhoras com essa indignação. Mas, porra... Deixem os outros fazer o que quiserem desde que não prejudiquem o próximo e a lei, não há problema algum.

- Demo, vem jantar!!!

- Já vou, mãe!!!

Parece que ela tem vergonha do meu nome, né? Mas, não é não. Isso é amor. Muitas vezes, só quem entende é quem é amado. Moro em uma casa de dois andares. Aqui chamamos de sobrado. Meu quarto localiza-se no final do corredor do lado direito, porque do esquerdo está o do meu irmão.

Não citei essa criatura até agora. Gosto dele? Claro que sim. É meu melhor amigo. Seu nome: Renê, o mesmo do grande pensador moderno. Contudo, o daqui de casa corre da escola semelhante o diabo da cruz. Já reprovou três vezes na mesma série. Eu o ajudo com o que posso, mas a "cabecinha" dele tem um processador do tempo em que amarrava cachorro com linguiça.

Fricassê de bacalhau. Minha comida favorita. Hoje é virada de ano. 2017 para 2018. Aqui em nossa humilde residência não acreditamos nessas crendices de que nos próximos doze meses tudo será melhor, cheio de paz, alegria, amor, dinheiro. Desculpe, isso existirá sim, no entanto haverá também guerras, fome, pestes, intolerâncias...

"Demócrito, você é pessimista demais, menino!". Eu? Nunca. Por acaso, minto nesta minha afirmação? É só verificar por você mesmo os fatos históricos. Tenho a convicção que onde há um ser humano, ali haverá tudo isso. Somos seres gregários, e ao mesmo tempo, destrutivos. As outras raças de humanos, se pudessem, seriam excelentes entrevistados quando do aparecimento dos sapiens.

Ultimamente, descobri um tesouro que para mim esteve escondido minha vida inteira: curta metragem de desenho animado. Nós brasileiros temos o famoso "complexo de vira lata", expressão tão bem colocada pelo saudoso e inesquecível Nelson Rodrigues. O que há de curtas com altíssima qualidade, desde os recursos gráficos até as temáticas.

Fogos. Gritarias. Som alto. O novo ano chegou. Pra mim, de novidade só o calendário. Ligo a TV. Assisto pessoas pulando onda, colocando romã na carteira, bebendo champanhe, vestidos em sua maioria de branco... Respeito a fé de todo mundo, porém se tudo isso realmente resolvesse, o planeta seria um mar de rosas.

Até agora não apresentei minhas convicções religiosas. Já fui muito carola. Morava em Igrejas, fazendo vigílias, participando de grupos de oração, doutrinando os outros à força – muitas vezes – e, num belo e maravilhoso dia, saí da caverna, fazendo uma alusão ao mito pensado por Platão. Só que não fiz e nem quero fazer como o homem que saiu e, ao ver com SEUS próprios olhos a beleza da realidade, voltou e tentou alertar seus companheiros.

Nós possuímos o peso de conceber a triste situação: um dia não estaremos mais neste mundo. É devastador! É terrível! É atroz constatar que esse planeta e nossas vidas não estão indo para lugar algum. Os gregos antigos, diante disso, criaram os Mitos. E, percebendo que essas histórias os infantilizavam, desenvolveram a Filosofia.

Existem pessoas que só agem com desprendimento graças às religiões. É hipocrisia? Na maioria das vezes, sim. Porém, é melhor ser dessa forma. Já se matou em nome de Deus e contra Deus. O mal não está nas crenças, e sim em nós.

Ufa! Deixando um pouco de lado essas reflexões, até agora não fui jantar. É melhor obedecer a mamãe, senão ela vem buscar a força!!!


                                                                                                                                                                                         G. B.


DemócritoWhere stories live. Discover now