Conversando com Ninguém

Ao Próximo

           Caro amigo imaginário:

            Houve um momento da minha vida em que parei de acreditar, de usar minha capacidade física e, principalmente, mental. Eu gosto de pensar que joguei todo o meu potencial no lixo, mas a verdade é que eu o canalizei na negatividade das coisas.
           Eu sou invisível, você não me vê e eu não me vejo. As pessoas não enxergam meus sentimentos, elas não me entendem, mas eu não as culpo, uma vez que eu também não me entendo, tampouco vejo meus sentimentos. Não pense que estou me fazendo de vítima, nós não conseguimos me ver porque eu me fiz invisível, eu escolhi não ser entendido. Eu poderia dizer que desisti de viver, na realidade, eu já cometi suicídio, não existo mais, sou uma não-pessoa.
            O que vemos é apenas uma projeção minha. Não sinta pena de mim, não me olhe com aquela expressão facial torturante de quem não encontra palavras para me confortar, me esqueça e não pense em me abraçar. Eu escolhi esse caminho, deixe minha alma descansar em paz e não diga que sentirá minha falta. Viva seu dia normalmente e, como todas as coisas efêmeras, me tire de suas memórias dia após dia, até que não sobre uma lembrança da minha projeção.
            Tire-me de exemplo, procure forças, faça valer a pena a minha morte. Não siga o mesmo caminho, seja livre, seja feliz; seja triste, sofra, chore, contudo nunca deixe morrer aquilo que te faz ser você mesmo. Evolua, mas, se preciso, retroceda. Lembre-se de que a felicidade tem um fim, assim como o sofrimento, a certeza, a dúvida. Sei que você é apenas uma mentira criada pela minha mente, entretanto, mesmo assim, eu gostaria de ver você chegar aonde eu não consegui, viver o que eu não vivi, ser o que eu não fui, seja feliz, seja você mesmo.