X - "Faça isso por mim, sim?"

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"Miranda, posso falar com você por um momento." A detetive Hodges disse depois de entrar quieta no quarto. Havia sido informada por uma das enfermeiras que Andrea estava dormindo e isso seria bem propício para o momento, já que trazia notícias não muito boas.

Pela relutância no tom de voz a editora sentiu que não receberia nenhuma novidade positiva. Ela se levantou da poltrona e as duas foram para o canto mais afastado do quarto.

"E então?"

"Bem, recebi algumas informações e achei prudente dizer pessoalmente, mas achei menos complicado te dizer primeiro para depois pensar em como dizer a Andy. A primeira coisa é que com a quantidade de provas e o cruzamento do depoimento da Andy e o laudo da perícia no apartamento, mais dados secundários e todas as outras informações, não será necessário um testemunho dela no tribunal."

"E a outra notícia, a ruim? Eu sei que tem uma, do contrário você não estaria aqui." Miranda murmurou impaciente.

"Er... O Nate está foragido." Um arrepio correu pelo corpo da mulher de cabelos brancos. "Pela nossa análise, é indicado um reforço na segurança da Andrea, assim como na sua e nas das suas filhas. Ele mencionou vocês em algumas mensagens de ameaça para a Andy. É melhor prevenir, exatamente por isso dois policiais estarão de guarda aqui na porta vinte e quatro horas por dia."

"Inaceitável." Ela respirou fundo tentando conter a onda de ira em suas veias. "Vou dizer de maneira clara, para não deixar dúvidas." Ela baixou o tom de voz e junto dele desceu a temperatura no ambiente para algo glacial. "É melhor vocês encontrarem o rapaz. Não faço as coisas pela metade, se tiver que ser resolvido do meu jeito não vai ser algo agradável. Isso é tudo."

Amber abriu a boca e fechou algumas vezes. Pelo brilho nos olhos da mulher mais velha ela sabia exatamente o que estava sendo dito ali, e pelo que havia testemunhado da relação dela com Andrea, qualquer providência para assegurar a segurança da jovem seria tomada sem arrependimentos em um piscar de olhos.

Depois de entender o caso e ver o que Andrea havia sofrido, a detetive secretamente torcia para que o rapaz não fosse encontrado. A vingança vinda de Miranda seria mais eficaz que qualquer outra possibilidade no mundo no que dependesse do instinto protetor da rainha da moda, disso qualquer pessoa teria certeza.

***

"Não, eu não me importo com o que você acha. Vou cuidar das coisas do meu jeito e você apenas seguirá as minhas ordens, caso contrário alguém estará fazendo o seu trabalho logo logo, por um preço muito melhor e com muito mais afinco. Quando eu precisar dos seus conselhos você saberá, até lá não me aborreça." Miranda encerrou a chamada bruscamente, a voz um pouco mais firme que o usual, alguns até ousariam dizer que ela estava quase gritando. Correndo os dedos pelos fios de cabelo impecáveis ela respirava fundo, tentando tranquilizar a irritação que lhe haviam causado. Continuou encarando a paisagem por alguns segundos antes de se virar e deparar-se com olhos sonolentos lhe mirando.

"Algum problema?" A voz rouca colocou um sorriso involuntário nos lábios da editora.

"Nada com o que você deva se preocupar, Andrea. Só a incompetência de sempre." Andy esboçou um sorriso e isso automaticamente acalmou o coração da mulher mais velha. 

Focando nos olhos voltados para si, Miranda se perguntava onde estava se metendo por deixar-se encantar por aquele tom de castanho tão comum, mas que via como algo tão único. Ela deveria correr, deveria seguir a sua própria vida como sempre fizera, todavia estava aqui em um quarto de hospital cuidando de alguém que de certa forma sempre estaria distante. Logo ela colocou o turbilhão de pensamentos de lado, afirmando para si mesma mais uma vez que não estava fazendo nada disso por recompensas, apenas para garantir que não cometeria o mesmo erro duas vezes. Ela se afastou por alguns dias e agora Andrea estava debilitada, ainda mais do que antes, física e emocionalmente. Enquanto tivesse algum controle, a jovem estaria protegida. Isso seria tudo.

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Correndo os olhos pelo rosto que aprendera a adorar, Miranda percebeu Andrea um pouco mais pálida que o normal. "Está enjoada de novo?" A morena fez que sim lentamente com a cabeça. Miranda pegou uma toalha de rosto, molhou e pegou um copo com chips de gelo. Elas estavam aprendendo a contornar o enjoo frequente sem que Andy precisasse da medicação.

No princípio, a editora temia que Andrea estivesse grávida, todavia Gustav já havia eliminado esta possibilidade. Claro que houve um grande alívio com a notícia, ainda assim a mulher se perguntava como seria ter uma miniatura da jovem por perto. 

Para tentar ajudar na sensação de náusea, Miranda pressionava a toalha molhada levemente na nuca de Andrea, depois no pescoço, na testa. A jovem se arrepiou, quase sem conseguir conter os pequenos gemidos de alívio que escapavam de seus lábios. O processo continuou até a enfermeira chegar trazendo o almoço. A comida não era das piores, considerando que estavam em um hospital, mas a falta de apetite de Andy era algo que ainda permanecia. 

"Eu não estou com fome." Andy murmurou quase que de maneira infantil.

Tess, que era basicamente a única enfermeira que ousava entrar e sair do quarto sem se intimidar com a presença de Miranda, nada disse. Já haviam passado por essa mesma discussão nas refeições prévias e agora ela simplesmente olhava para a mulher de cabelos brancos como quem dizia 'por favor, resolva isso'.

Miranda apenas sinalizou com a cabeça que assim o faria e a enfermeira saiu.

"Eu não estou com fome." Mais uma vez as palavras foram ditas, desta vez quase chorando.

Colocando a bandeja de lado, Miranda respirou fundo, ela odiava não poder fazer nada para que a jovem se sentisse plenamente bem. Se pudesse magicamente curar Andrea de tudo, faria sem pensar nas consequências. 

"Gostaria de comer algo específico? Ainda vão trazer o meu almoço, nós poderíamos pedir algo para você." Andy simplesmente fez um não com a cabeça e as lágrimas rolaram por seu rosto. Miranda simplesmente envolveu o rosto da jovem, secando s lágrimas com as pontas dos dedos. "Você precisa comer, Andrea, nem que seja bem pouco. Cassidy e Caroline querem ver a Andy delas bem. Como é que eu vou te levar para casa se você não se alimentar parar poder melhorar?" Miranda murmurou com a voz transbordando calma.

"M-me levar para casa? Eu pensei que..."

"Shhh... não importa o que você diga, não vou te deixar voltar para o lugar onde te encontrei. Eu infelizmente não posso apagar o passado ou o que foi feito com você, a maneira como você se sentiu, mas eu posso ajudar a tornar seu futuro um pouco melhor." Agora era a própria Miranda quem sentia lágrimas deslizando em seu rosto. "Eu já te deixei fazer escolhas para o futuro uma vez e não foi nada sábio, não vou fazer isso novamente." Andrea abriu a boca para dizer algo, mas antes que algum som pudesse sair de sua boca a outra mulher voltou a falar. "Isso não está em discussão Andrea. Hoje o Gustav esteve aqui mais cedo, enquanto você dormia, e falou que deve te dar alta nos próximos dias. Já liguei para Emily e Nigel, eles estão fazendo suas malas neste exato momento e coletando artigos pessoais. Você ficará na minha casa pelo tempo que quiser. Agora, falando de coisas que realmente importam, por favor coma um pouco... faça isso por mim, sim?

Era assim que as coisas estavam se resolvendo ultimamente, Miranda pedia para Andrea fazer algo por ela e a jovem simplesmente fazia. Isso parecia estreitar os laços e aumentar a confiança entre as duas, também parecia gerar certo conforto. Não conversavam sobre.

 ***

Já faziam algumas horas que Gustav havia conversado a sós com Andrea e depois disso ela ficou estranhamente quieta. Quando Miranda perguntou se ele havia dito algo importante, tudo o que ela se limitou a dizer é que teria alta no dia seguinte. A editora tratou de ligar para o pai das gêmeas, solicitando a volta das duas para a mansão. 

Mesmo resolvendo assuntos da revista, Miranda podia sentir os olhos de Andrea sobre si. Mais que isso, ela sentia que algo importante não estava sendo dito. 

"Andrea, você não vai me contar o que o Gustav te disse?" Ela murmurou sem levantar os olhos da tela do computador. 

"Eu já te disse o que era importante a ser dito, Miranda." Andy estava claramente incomodada com a atenção recebida, pela primeira vez desejava que ninguém a tivesse encontrado. Talvez tudo isso já tivesse acabado.

"Eu sinto que tem algo que você não está me dizendo. O Gustav não conseguiu me olhar nos olhos quando esteve aqui hoje. De verdade, eu não perguntaria se não me importasse."A mais velha tentou abrandar a voz ao máximo, não tendo efeito algum.

"Você não deveria se importar comigo." Andy respondeu com a voz seca.

"De onde tirou isso? Isso é absurdo." A editora se levantou quase se sentindo ofendida pelo tom de voz da outra.

"Também não acho prudente ir para sua casa amanhã." Ela olhava para um ponto fixo atrás da editora, não queria lhe olhar nos olhos.

"Isso não está em discussão e você sabe disso."

"Você não pode me obrigar, Miranda."

"Posso e vou. Esconda o que quiser o quanto quiser se isso te deixar feliz, mas amanhã você vai sair daqui comigo e eu te desafio a me contrariar nesse ponto." Antes que mais alguma coisa pudesse ser dita Miranda saiu do quarto, quase batendo a porta. Precisava se afastar ou seria ríspida com a jovem e de maneira alguma teria paz ao ser a causa do choro dela.

No quarto, sozinha, Andrea chorava. A conversa com o médico não tinha sido das mais animadoras e ela só queria esquecer tudo o que ele disse. 

O problema é que a cada vez que ela olhava para Miranda via amor nos olhos da mulher, a cada vez que falava com as gêmeas ao telefone sentia amor em suas vozes... Até mesmo com Nigel, Serena, Emily e Roy por perto, eles a amavam. Agora, mais que nunca era como se o seu mundo estivesse desmoronando e junto de si ela estivesse carregando todas essas outras pessoas. Não era para ser assim, todos eles mereciam felicidade e não as complicações que o convívio com ela os traziam. Aparentemente já não havia muito a ser feito para que pudesse desaparecer de suas vidas e isso estava se tornando insuportavelmente desesperador.

Uma Lua Por VezOnde histórias criam vida. Descubra agora