O Tesouro de Poseidon

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Andar sobre o maior tesouro do mundo era uma rotina diária em minha vida. Uma vida eterna, da qual, já vi muita coisa.

A água que esses humanos desprezam. A água que não apenas lhes supre a vida, mas também tudo aquilo que eles chamam de riqueza. A água não apenas desprezada, mas também esquecida como se não fosse a própria vida que estivessem bebendo em seus copos.

A água é a base de tudo nas vidas medíocres dos mortais, mas ainda assim, olha o que fizeram com essa preciosidade.

Eu me agacho, e pego um pouco d'água do rio em minha mão, e a mantenho em minha palma em uma concha, olhando a cor turva que não deveria ter, o cheiro insuportável que ela carrega, carregando uma energia podre, ruim, impura. Nada de poder que essas águas sempre carregam.

Água. Não só me daria a maior parte do domínio deste planeta, como também a maior riqueza dela. Achei que os mortais saberiam valorizá-la, a venerá-la, a respeitá-la como eu o faço, simplesmente pela sua pureza, e ainda assim, complexa.

Não apenas... como que os mortais dizem mesmo? H... H2O? Talvez. Não é apenas uma composição química. Ela é muito mais complexa que isso, esconde muito mais segredos que nenhum mortal será capaz de descobrir.

Purifico o punhado de água em minha mão com pouco esforço meu, e a encontro no seu estado mais puro possível, onde é pura energia. Enxergo a minha palma do outro lado, como deve ser.

Devolvo-a para o rio, se misturando na imundície do rio doce, e purifico o meu domínio com um pouco mais de concentração do que antes, e caminho sobre ela limpa, encontrando todos os seres que deveriam estar vivos aqui, sem vida, alguns há poucos dias, outros há meses, e sinto que há seres mortos há anos.

Faz muito tempo quando purifiquei essas águas, não só esse rio, mas todos que havia no mundo. Levou certo tempo, esgotou muito de minha energia, mas cheguei ao resultado esperado.

Acreditei nesses mortais imundos. Acreditei que eles manteriam as minhas águas limpas, mas não muito tempo depois, talvez três séculos, já estava imundo mais uma vez.

Eles ainda não entenderam que a água poderá existir depois deles. Os humanos poderão desaparecer, mas as águas irão continuar aqui... mas o contrário nunca acontecerá. Assim que essa riqueza, esse tesouro desaparecer, o fim da humanidade chegará em poucos dias.

Olho para os céus, e pergunto ao Zeus o que ele pensa sobre a poluição na sua Terra.

Ele parece se divertir bastante com a autodestruição humana que está se aproximando todos os dias.

Mas Zeus iria odiar caso eu acelerasse esse processo.

Olho mais uma vez para os meus domínios, a água recém-limpa, se turvando mais uma vez com a água impura que está se derramando mais uma vez sobre o tesouro da terra.

Humanos nojentos.

Concentro toda a minha essência, todo o meu poder que faz parte de mim, e um pouco mais, e purifico toda a água que há na terra, cada gota imaculada que apaga o poder existente nela.

Eu posso ouvir os humanos exclamando, aquela tecnologia se agitando, o mundo parecendo entrar em colapso.

– Poseidon, o que acha que está fazendo? – Zeus grita, dentro de minha cabeça.

– Uma... faxina, Zeus – eu respondo com certa petulância, eu admito.

– Não interfira tanto no mundo dos mortais.

Como os humanos mesmo inventaram, eu mostrei o dedo médio para meu irmão apenas em minha mente, enquanto continuo com minhas águas sobre meu domínio.

Demora mais do que o esperado para sentir toda a pureza sobre meu poder. Poderiam ter levado muito mais tempo, caso esperasse até uma semana, no calendário humano, ou um ano.

Ainda com a água em meu poder, me concentro mais uma vez, sem pestanejar, sem uma sombra de dúvida. Concentro na existência, não só minha, mas também na da água, e com um esforço que nunca usei, apago a essência do meu poder pouco a pouco, já que isso exige muito de mim. Primeiro dos pontos mais distantes, e gradativamente vou diminuindo a distância entre o fim da água e eu.

As mãos tremem com tamanho esforço, enquanto lágrimas escapam. Isso é maior que minha vaidade, maior que a vaidade até mesmo de Zeus. O elemento mais puro não pode continuar nas mãos de humanos. Deveria ser proibido como era o fogo.

– Poseidon!

Ignoro. Sei que Zeus está a minha procura agora, e tenho que me concentrar mais ainda para acelerar o processo.

E continuo, as minhas forças finalmente dando indícios de esgotamento. Mas também ignoro isso.

Elimino mais ainda a água que está a minha volta, e mais uma vez posso escutar os humanos entrando em um choque completamente novo. Posso até mesmo sentir o desespero de vários deles.

Sorrio. Isso sim é bom.

Quando resta apenas a parte do rio que está a minha volta e eu, vejo Zeus fisicamente enfurecido a minha frente, mas agora é rápido.

– Foi bom te ver, Irmão – falo com um sorriso.

E então, fecho os olhos e apago toda a existência da água, e também a minha própria, mas não antes de ouvir Zeus gritar naquela sua voz de trovão.

– POSEIDON!

O Tesouro de PoseidonWhere stories live. Discover now