"Suicídio nunca é uma opção inteligente, por isso só é tomada pelas pessoas em mais profundo desespero e privadas de sua saúde mental", era o que sempre dizia meu caro amigo e companheiro de trabalho professor John. Ele se matou faz duas semanas e eu estou indo ver o local de sua morte, pois, acima de tudo, eu confio em meu amigo.
A minha frente tem um velha casa, ou seria uma mansão, ou até um hotel dado a sua grandeza, ela pertencia ao avô de John que havia morrido neste mesmo ano, como ele era o único herdeiro vivo, a casa acabou passando para John que logo começou a reforma-la, conversamos muito sobre isso na época, ele queria ver se conseguia vende-la por uma boa quantia assim que a reforma terminasse, pois como ele sempre dizia "O local não importa se o terreno é grande e a casa é quente", mas eu tratei logo de persuadi-lo a voltar atrás, eu lembrei a ele como a vida na cidade é sufocante, e o sobrecarreguei de hipóteses de como seria um bom local para ele esfriar a cabeça quando precisasse, na verdade eu apenas não queria ver um local com tanta aparente história, nas mãos de pessoas que não se importariam com ela ou até mesmo empreiteiras querendo apenas tirar o dinheiro do terreno, pois além da mansão, quase tudo em volta era propriedade do avô de John, incluindo a floresta. E ele fez isso, 5 meses depois da reforma ficar pronta ele pegou suas férias e foi para a mansão afastada da civilização, e quando ele voltou de lá, seu pescoço estava quebrado e sua carne se putrefazendo pelo tempo que ficou lá sem ninguém sequer notar.
Saio do carro o qual aluguei com o dinheiro que havia guardado para visitar o Egito nas minhas próximos férias, teria que caminhar um pouco para chegar até a entrada, a estrada acabava em um ponto e um grande portão se estendia no outro, portão que eu percebi que seria meu primeiro obstáculo, pois estava trancado.
Todo o perímetro da mansão era cercado por grades altas que em seu topo era afiada, poderia até mesmo se dizer que era uma grade formada de lanças. A grade se ligava diretamente ao portão, que com certeza tinha mais de dois metros, mas isso não era nada comparada a corrente que o prendia, poderia facilmente ser comparada ao braço de uma pessoa em espessura. Tudo isso dava um ar assustador, mesmo no meio da tarde.
Tenho que pensar no que fazer, o sol está alto e está muito quente, mas acima disso tudo, o real perigo começa quando a noite vier, eu não estou mais na cidade e não estou acostumado a sair dela, então eu posso acabar me esquecendo desse fato, mas aqui, a única luz que eu vou ter a menos que entre na mansão será a luz da lua.
Resolvo que minha melhor hipótese de conseguir entrar na mansão é olhar ao redor dela a procura de talvez alguma arvore que cresceu demais que me permita pular para lá dentro, ou um segundo portão, ou até mesmo falhas na grade. Assim começo a caminhar em volta do perímetro, não sei se poderia dizer bem uma caminhada, pois apesar de tudo, meu passo está bem acelerado e não estou nem um pouco a vontade, o terreno é maior do que eu achei e não parece acabar nunca, está quase anoitecendo e eu só andei em linha reta até agora, sinto que tem algo errado com esta mansão.
Finalmente uma curva, ou eu devia estar triste pois andei aquele tanto e não achei nada?
Não sei, só sei que o meu psicológico se sente melhor após achar esta curva, a noite está prestes a chegar e a me envolver em seu manto, eu não quero voltar atrás, na verdade eu não consigo, o mesmo sentimento que me trouce aqui não me deixa nem ao menos pensar em voltar atrás de mãos vazias, não sei o que eu espero encontrar, mas algo existe.
A noite chegou e junto dela uma nevoa espessa, não consigo ver muito a minha frente, mas conseguiria ver menos ainda, por sorte hoje a lua esta cheia, mas isso não deixa menos aterrorizante, eu olho para trás a todo momento achando que tem algo, mas não tem, e o fato de não ter me assusta, pois eu já não vejo nada atrás de mim, o caminho de onde vim, meu carro, nada, é como se eu estivesse em outro lugar, é como se fosse um limbo e eu apenas continuasse andando.
Consigo ver alguma coisa diferente na grade logo a frente, não encontrei arvores perto da mansão, todas tem um espaço, como se tivesse um corredor imaginário ao redor dela, e a reforma aparentemente deve ter abrangido as grades também, pois todas estão impecáveis e não apresentam desgaste nem partes quebradas, mas tem algo diferente logo a minha frente, acelero meu passo mais um pouco (algo que eu achava não ser possível), logo me encontro de frente a um segundo portão.
Esse portão é diferente do outro, não é grandioso, ele é no mínimo... curioso, pois ele é, visivelmente pelo menos, fácil de ser sobrepujado, ou seja, até eu consigo pula-lo. O portão parece um portão de casas mais simples, as grades quando chegam até ele, simplesmente somem, e voltam quando ele acaba, dando um ar de mistério para ele, pois ele parece algo que não pertence a este lugar, algo que acabou de ser colocado, e principalmente, chegando mais perto, a parte mais curiosa é que ele está aberto.
Coloco a minha mão nele relutantemente, percebo o suor em minhas mãos mesmo na noite fria, percebo que minha respiração está pesada e eu quero voltar logo para o carro e sair daqui este não é um local para mim, vejo meus erros, me pergunto porque eu vim sozinho, não trazendo nem ao menos uma lanterna e nesse embaralhar de emoções e hesitações eu simplesmente empurro o portão deslizando a mão por ele. O som do portão abrindo é ensurdecedor, como se não tivesse sido aberto a séculos e este tempo perdido estivesse todo sendo extravasado neste momento, mas isso só deixa mais estranho o fato dele ter aberto tão facilmente.
O som ecoou por todo o local, os animais da floresta deviam todos terem fugido pelo simples instinto natural, eu sei disso pois eu também quis fugir. Olho para trás pois de novo eu sinto algo me encarando, a nevoa estava espessa mas mesmo assim, dessa vez foi diferente, como se apenas para contrariar meu pensamento eu vejo um cervo me olhando, se eu fosse mais radical, poderia até dizer que ele está me encarando nos olhos, mas isso já seria loucura, volto me a frente para o portão e me preparo para entrar, cerro os punhos por causa da hesitação, e quando os serro percebo algo estranho que ainda não havia notado, tem algo grudento em minha mão direita, a mesma que usei para abrir o portão.
Abro minha mão e a levo para mais perto do rosto a fim de ver direito o que há nela, é uma espécie de liquido negro pelo que eu consigo ver, pensando ser graxa do portão, em uma decisão não muito calculada e louvável minha, vinda de todo o estresse que estou experimentando, experimentei um pouco do liquido, mas a suposta graxa tem um gosto diferente, eu nunca experimentei graxa, mas eu sei que este gosto não pertence a ela, tem gosto... de sangue.
Ao perceber isso me pego com as pernas tremendo, e milhares de perguntas passando em minha mente "Por que teria sangue no portão?", "Por que diferente do portão da frente este está aberto?", "por que eu não estranhei até agora o fato de que eu nunca vi relatos de nevoa a essa hora nessa região, neste clima" voltando-se para trás por um segundo, todas as suas perguntas evaporaram, pois só uma agora restava em sua mente "porque aquele cervo está sorrindo e possui dentes humanos". Depois do choque ele correu em direção a mansão, assustado.
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O Obscuro
Mystery / ThrillerUma historia sobre loucura, ciência, ocultismo e os limites da psique humana. (Primeiro rascunho)