Capítulo Quatro

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Emma mal chegou em sua casa, estirou-se na cama e dormiu, exausta. Diferente do que esperava, seu sono foi conturbado: cheio de pesadelos, que ela, por mais que se esforçasse, não conseguia tirar da cabeça.

“Ela corria por entre galhos de árvores caídas, e o estalar das folhas secas pelo gelo do inverno era o único som que ela podia ouvir. Alguns segundos antes ela estava sendo perseguida, por alguma coisa que ela ainda não sabia como nomear. Seu peito doía pelo esforço, e sua respiração entrecortada dificultava sua corrida. A velocidade de seus pés diminuía a cada passo dado, e ela já não aguentava mais o peso de seu próprio corpo. Os espinhos arranhavam suas pernas, e as feridas começavam a latejar, a arder. Tudo que queria era sentar debaixo da sombra de uma daquelas árvores, e esperar por ele, pois, de alguma forma, ela sabia que ele viria. Ela podia senti-lo perto, podia sentir seu cheiro e ver seu olhar preocupado enquanto adentrava a floresta atrás dela. Ao simples pensamento do garoto que ela amava vindo ao seu encontro, um sorriso inconveniente surgiu em seus lábios, fazendo sua mente viajar pra aldeia mais próxima, onde ele vivia. Ela permitiu-se, por um momento breve, sonhar com os braços dele envolvendo-a, com os lábios dele tocando os seus, e seu abraço a protegendo de todos os perigos. Mas logo percebeu que ela não tinha tempo pra pensar nisso: com uma rápida olhada para trás, percebeu que seus perseguidores tinham voltado a achá-la. O pânico mais uma vez dominou-a, e ela obrigou suas pernas a correrem num ritmo frenético novamente. Apesar de tentar, eles agora estavam mais ligeiros que ela, e, por mais que se apressasse, sabia que logo aquelas criaturas iriam alcançá-la. Foi num instante de distração, pelo medo, pelo receio de ser pega, que ela tropeçou na pedra à sua frente, e foi ao chão. Era o imprevisto que os bandidos estavam esperando: a garota ouviu seus passos ficarem mais rápidos e contínuos, enquanto o som rústico de suas vozes urravam de maneira incompreensível. A angústia tomou conta dela, e todo o seu corpo estremeceu ao imaginar como eles iriam tratá-la. Quando finalmente conseguiu levantar-se, já era tarde demais. As criaturas estavam bem na sua frente, paradas, imóveis e imensas, causando espanto com a simples presença. Eles esticaram os braços prontos a agarrá-la, e os olhos da garota fecharam-se quase que instintivamente com o gesto dos demônios. Foi então que ela ouviu um murmúrio alto, um grito agudo quase como um estrondo, e, em seguida, um baque surdo. Abriu os olhos, então, e não conseguiu acreditar no que via. Ele estava ali. Lindo e corajoso. Lindo e sempre seu. Era ele, ele que a garota sabia desde o início que viria. Ele que nunca a abandonara. Ele que ela amava. Era o seu homem. O seu anjo...”

- Isaac – ela sussurrou, e logo depois abriu os olhos.

A primeira coisa que viu foi o rosto do garoto que estava dormindo na cadeira ao lado de sua cama. Reparando bem agora, quieto daquele jeito, ele não parecia estranho para Emma. Alguma coisa nos traços bem feitos de seu rosto, ou nos cabelos desgrenhados caindo aos maços em sua fronte, era familiar para ela de algum lugar. Um lugar onde, apesar de nunca ter estado antes, desde que se lembrara, a atormentava todas as noites quando ela pegava no sono. Um lugar secreto, feito só para quem acreditava; e ela, querendo ou não, era uma dessas pessoas. Ao lembrar de onde conhecia aquele garoto, Emma parou de respirar por um milésimo de segundo. Não, não podia ser. Aquilo não era real. Nada daquilo era verdade. Ela ainda estava em sua cama, coberta com o seu edredom, dormindo o seu sono. E ela precisava convencer a si mesma de que tudo que estava pensando não passava de um sonho. Inclusive o que sentia quando chegava perto dele.

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