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-Diego! Por favor, o mundo não vai acabar se você sair deste leme por alguns segundos. – Os olhos suplicantes de Hellen me despertavam de algum pensamento longínquo do qual já não me lembrava qual era. Acho que ela estava me chamando para almoçar.

-Agradeço a preocupação Hellen, mas não há para que tanto alarde. Não estou com fome, podem ir sem mim!

-E ficará aí o dia inteiro?

-Não vejo motivos para não ficar!

-Vai enlouquecer se não ver nada além dessas águas, "capitão" – Ela se referia a mim com um leve tom de brincadeira. – Este mar não vai sumir se você parar de olhar para ele por algum tempo. Vamos!

-Hellen... – Tentei argumentar quando fui interrompido. Não por Hellen, mas para sua miniatura que acabara de subir as escadas e me puxava pelo braço

-Vamos Diego! Vai ser bom para você sair dessa prisão solitária pelo menos uma vez no dia!

Não pude deixar de rir com o drama da menina

-Além do mais –Haley prosseguia – Pense em mim! Sua pobre afilhada, sozinha sentada em uma mesa cheia de adultos conversando sobre coisas chatas, e ouvindo o Ed tagarelar sobre... Bem... Você sabe, as coisas que o tio Edson costuma falar. Por favorzinho, se não quiser pensar em você mesmo, pense em mim!

-Odeio quando faz isso!

-Sei que não odeia. - Ela sorria

-Certo! – Disse por fim, vencido, vendo Haley triplicar o tamanho do seu sorriso e me olhar do modo mais angelical o possível. Ela me puxava pelo braço, nos fazendo descer as escadas.

"Obrigada, filha". Ouvi Hellen sussurrar para Haley enquanto passávamos por ela, que nos acompanhou até uma das grandes salas do navio onde todos estavam nos esperando.




-Sabia que Haley iria conseguir tirar o Diego de lá. Pode pagar – Ed estendeu a mão para Ben quando passamos pela porta

-Não apostamos nada, Ed. – Disse Ben retribuindo Ed com um tapa na cabeça. – Diego, meu amigo! Finalmente voltou ao convívio humano

-Ok! Já entendi, chega dessa conversa de solidão e seja mais o que for. Podemos partir para um próximo assunto?

-Dieguinho, não se irrite! Só estamos felizes de ver você almoçando conosco depois de tanto tempo. – Ed abraçava a Diego, que revirava os olhos e bufava, tentando não perder a calma.

-Você tem passado muito tempo lá em cima. Tem trabalhado demais. Admiro tudo o que tem feito, mas não podemos deixar de nos preocupar com sua mudança. –Hellen, sempre muito calma e compreensiva, tomava agora o rumo da conversa.

-É sério, Diego! Você anda muito calado. Muito mais que o normal – Haley completava, enquanto eu ainda tentava fazer Ed desgrudar de mim.

-Ainda acho que vocês estão exagerando! – Ben interrompeu sua mulher e filha para se prontificar

-Concordo com o Ben! Não tive mudança nenhuma. Não se esqueçam que antes de fazer parte deste grupo eu sempre vivi sozinho. Isso ainda está dentro de mim. Talvez o sentimento de sobrevivência tenha apenas despertado esse meu lado novamente.

-Contando que ele não venha acompanhado de sua versão assassina... – Dizia Ed para ele próprio, porém alto o suficiente para todos os escutarem. Houve um ou outro olhar de repreensão para ele, provavelmente vindo de Hellen. Dei um riso abafado. Relembrando que não poderia discordar totalmente do Ed.

-Talvez você precise de uma distração. Só isso

Não pude deixar de rir novamente, ouvindo Haley dizer isso. – Minha querida, não acho que exista muitas distrações no meio do mar.

-Uma companhia, então? – Hellen arriscou, de forma inocente. Porém a frase não passou despercebida pelos ouvidos de Ben, que começara a gargalhar

-O Diego? E uma companhia? Oh céus! Como isso seria bom! Ver o maior solteirão da face da Terra finalmente com alguém!

-Ben, por favor. Não quis dizer isso, Diego! – Hellen tentou remediar a situação. Tampei meus olhos. Era lógico que Ben começaria com esse assunto. Sempre foi lógico.

Sussurrei um "Tudo bem" para ela, enquanto Ed também entrava na brincadeira.

-Não que ele não tivesse pretendentes. Pelo amor de Deus. Era quase impossível acompanhar o Diego quando saíamos a noite. E nem para me ajudar com alguém, hein amigo? Poderia muito bem ter aproveitado a situação.

Os comentários que se seguiram geraram uma onda de risadas e de mais comentários. Todos começaram a inventar probabilidades e imaginar como seria "um mundo onde Diego estivesse com alguém". Nunca me arrependi tanto na vida de ter cedido minha calmaria por esta algazarra por causa de um par de olhos pidões de uma jovenzinha.

Já havíamos terminado o almoço quando percebi que o assunto estava longe de acabar. Precisava de um jeito de deixar meu nome fora da conversa quando uma ideia me ocorreu. Entrei na brincadeira.

-Muito maduro, gente. Muito maduro. É lógico que isso vai acontecer, um dia. – Esperei que todos parassem de rir e me olhassem quase em transe, esperando que eu completasse a frase, imaginando que talvez eu estivesse cedendo. – Isso é tão certo quanto o fato de que a Haley já tem idade suficiente para começar a gostar de alguém mais do que do pai dela. –Joguei uma piscada para a menina.

Hellen não pode deixar de rir, sabendo da verdade da situação. Ben no mesmo instante mudou de expressão, passando para um ciúmes irracional de pai enquanto virava-se para Haley e começava mais um de seus discursos sobre como "meninos são ruins" e "você jamais vai namorar alguém enquanto eu estiver vivo". Me dando assim a oportunidade perfeita para sair. E ninguém pareceu perceber quando o fiz. 

Profundo AzulWhere stories live. Discover now