O fim de semana ia ser pra valer. A sexta começou com o falecimento do meu pai e terminou comigo, fodendo a Natacha. Era uma roda gigante! Um misto de emoções loucas.
Não podia reclamar, minha vida sempre foi assim, eu devia ter me acostumado.
Voltamos para dentro da casa do Patrick e fomos alvos de olhares minuciosos. O Rato não soube conter sua felicidade e pulou em cima de mim, fazendo com que eu bebesse do seu copo de uísque. Quase engasguei quando ele me fez virar tudo de uma só vez, aquilo queimou minha garganta!- Hoje é dia de passar mal! - fez uma careta quando terminou de dar uns goles da garrafa. Ele era insano em relação a bebida.
Estava finalmente esquecendo o começo daquela sexta-feira, acredito que Natacha tenha feito o seu trabalho com excelência!
Segundos depois, Patrick cruzou a sala correndo e assim que percebemos uma movimentação e sons estranhos, desligamos o som e todas calaram a boca.
Gentil (que era dos gerentes), empunhou sua arma em mãos e foi pra fora.
Acontecia uma guerra no morro vizinho os tiros cruzavam o céu e lá de cima, a gente podia ver tudo. Pareciam cometas barulhentos!- Recebi no radinho. - Patrick concluiu assim que me viu atrás dele. - Acabou a festa, rapaziada.
Calou-se por alguns instantes, parecia esperar alguém dizer alguma coisa mas não aconteceu. Natacha reuniu o restante das suas amigas e começaram a descer ladeira abaixo, esquecendo de se despedir por conta do desespero. CG estava tenso e não tinha como não estar. O Rato estava mais alcoolizado do que um Opalla! Era impossível pedir sua opinião e ajuda.
- Ninguém sobe, ninguém desce! A loja tá fechada nesse fim de semana.
- E a produção? - sofri desespero. Precisava de dinheiro.
- Continua! - assenti com a cabeça.
CG era da produção. Gentil gerente, tomava conta das anotações e das coisas que entravam/saíam. O Rato ficava por conta dos problemas da comunidade, tudo ele resolvia e eu, acabei ficando por conta das vendas.
No fim, todo mundo se ajudava mas era pra aquilo, especificamente, que fomos designados.- A neurose bateu no Rato, vou levar ele pro barraco. - Patrick tratou de apertar minha mão. Enquanto isso, eu rezava pra pelo menos o filho da puta conseguir sentar na moto.
Tirei as chaves do pescoço e encaixei pra ligar a moto. Rato confessou a dificuldade de estar tonto depois que subiu na moto. No caminho, ficou perguntando repetidamente como era a buceta da Natacha. Arrependimento de ter pedido a droga da camisinha pra ele!
Contorci a cabeça quando paramos na sua porta, olhando para os lados com cautela. Ele desceu mais rápido do que subiu!- Ai, padrin... - fez um paz e amor com os dedos. - Nós trombra, cachorro louco!
Agradecido fiquei quando ele entrou pra dentro do portão. Estava com a voz do Rato na minha cabeça, de tanto que ele falou pra caralho no meu ouvido. Estava injuriado!
Acelerei a moto e a falta de capacete me dava uma brisa boa. Ainda ouvia os tiros e conseguia ver os cometas voando depressa, mas era sossegado. A chuva não molha quem já está molhado!
Após estacionar a moto na garagem, encontrei Carla rezando no escuro da sala.
Talvez pedindo pro tiroteio parar, ou então pra eu ser protegido.- Graças a Deus você chegou! - arfou de alívio e veio me abraçar.
Deve ter sido um abraço meio tenso. Eu fedia a álcool, droga e (lá no fundo, se seu olfato for bom) a sexo.
O dia havia sido longo, essa sexta-feira não passava e me torturava.
Depois de um banho quente, deitei na cama com a certeza de que aquele fim de semana nada de bom iria acontecer.
Deixei uma mensagem no celular do Rato, só pra ter certeza de que ele estaria bem e que amanhã iríamos armar uma praiana de lei.
"e ai, chavão
ta de ressaca? escova os milho e vamo praiar!"Foi difícil pregar os olhos. A falta de certas coisas me faziam pensar.
Eu ainda tinha aquele plano na cabeça, descobrir quem era o verme que se encontrava no morro, que apontou a arma e atirou sem pensar.
A história foi a seguinte; os cara tava armado, mirando na esquina, esperando os cachorro louco atravessar a cancela. Foi quando minha mãe, dona Ana Maria, fez a curva (com suas bolsas e sacolas) e um tiro foi disparado. Pegando bem na sua cabeça e explodindo tudo o que tinha direito! Porra, eu mereço minha vingança, não é? Será que não deu tempo dele ver quem era?
Isso me assombrava!
Acordei com as luzes beirando a janela. Pisquei algumas vezes até abrir os olhos totalmente, foi quando vi Patrick sentado na beira da minha cama, mexendo no celular.- Que porra você tá fazendo aqui, patrão? - sentei-me com dificuldade.
- Você sabe... - neguei com a cabeça sem pensar duas vezes. - Eu tô fodido.
- O que você ta falando, cara? - esfreguei os olhos tentando focar a visão.
- Não era os vermes tomando o morro, Playboy. - balançou a cabeça vagarosamente. - Os amigos tava tomando o morro e logo vai ser aqui.
- Porra, chefe... A gente não vai deixar essas fitas chegarem aqui não!
- Tu tá ligado que não é assim, o morro não tem soldado. - respirou fundo e esticou o braço, até me alcançar, apertou meu ombro e prendeu os lábios.
- Não te quero nessa guerra! Eu sei as neurose que tu tem, sei dos motivo de ter entrado. Tu tem que ficar vivo pra cumprir essa promessa.Eu fiquei em silêncio. A ideia toda rodeava minha mente e agora mil fitas se fizeram presentes.
- Eu te trouxe um bagulho... - olhou para o corredor pra confirmar se minha tia não estava por perto. Entregou-me a Glock dourada.
- Eu não posso ficar com isso, cara! - alertei. Não por ser uma arma, mas era dele.
- E eu tô pedindo? Eu tô mandando, padrinho. - estendeu a Glock e eu acabei pegando. - Você lembra como usa?
- Lembro! - soltei aquele famoso ar pesado do pulmão.
- Faz bom uso e não me decepciona! - cruzou a porta do quarto em direção à saída e me deixou lá com o peso do mundo sob as mãos.
Após a saída do Patrick, tranquei a porta do quarto e escondi a Glock no fundo da gaveta, junto com algumas fotos e pertences antigos dos meus pais.
Pensa comigo, no mínimo o Patrick tava achando que ia ser preso ou morto. Essa ideia me sufocava, era praticamente meu irmão mais velho!
Sai da transe desses pensamentos quando o celular apitou recebendo uma mensagem no WhatsApp."acordei, desgraça
to pronto, o corola vai cantar
marca um dez que eu to chegando"Rapidamente tratei de colocar uma bermuda tactel da Oakley, um par de Hawaianas brancas e uma lupa espelhada na cara, peguei a carteira abarrotada de notas de cinquenta, parecia um hambúrguer com queijo escorrendo.
Tratei de escolher a melhor camisa e joguei por cima dos ombros.
Estava esperando um sinal do Rato pra descer as escadas.
Sentado na beira da cama, desfazendo uma paranga das boas.- Bom dia, meu querido. - escorou a bochecha na beira da porta.
- Bom dia, tia! - continuei separando a paranga por mini pedaços. - Vai um aí?
- Deus me abençoe! - ela sempre foi evangélica das bravas!
Comecei a rir como se não houvesse amanhã mas mesmo assim me assustei com a sua seriedade. Uma buzina foi apertada com força e pude lembrar do Rato. Beijei-lhe sua testa e corri para fora de casa com a maconha dichavada em mãos e a seda entre os lábios.
Entrei no banco do carona e olhei imediatamente pro banco de trás.- Ah não, velho! - fingi decepção instantânea na presença do CG e do Gentil.
- Vai tomar no seu cu. Otário! - senti um empurrão no banco com os pés e gargalhei.
- Tá ligado que esse carro é novo, né? Se vocês estragarem eu quero reembolso! - reclamou igual velho.
- Vai logo, passa marcha na boneca!
Vamos combinar que o carro era do ano, qualquer um pagava uma madeira naquele Corolla. O carroo era do ano e acredite, os mais chaves do morro se encontravam naquele carro.
Bolei a droga e a acendi. O som alto preenchia nossos ouvidos, desligando o mundo lá fora.
O beck passou na mão de todos, ia e voltava.
O sol queimava meu braço direito pra fora da janela, o cinto atravessava meu tronco (proteção é tudo), Rato dirigia apenas com uma mão no volante, enquanto isso CG provavelmente perturbava a existência de Gentil.
As rodas gigantescas que valiam muito mais do que aquele Corolla foram raspadas na calçada e todo mundo entrou em choque, a reclamação foi conjunta.Os maloqueiros atraíram todos os tipos de vistas ao saírem do carro. A surpresa veio quando Rato saiu da porta do motorista.
Neguinho, favelado e elegante! Ou você pensava que o apelido dele era Rato por conta da sua porquice? Não! Ele era preto e de novo, a favela venceu.
Cruzamos a areia naquele dia ensolarado. Alugamos as cadeiras e dois guardas-sol. Relaxamos ao ver todas aquelas bundas desenhadas com fio dental, era um paraíso!- Vou ali no corre da porção de camarão! - Gentil se afastou e foi na direção das barraquinhas.
- Vou dar um mergulho. - levantei e deixei os óculos, camisa e as hawaianas na minha cadeira. - Fica na atividade dos meus bagulhos, em!
Corri pela areia quente até que meus pés encontrassem a água gelada. Continuei firme batendo os pés dentro da água e mergulhei por debaixo da onda.
A praia estava lotada! Não pode ter um sábado ensolarado que todo mundo quer dar um mergulho.
Senti algo bater na minha perna e imediatamente endureci o corpo. Já pensei logo no pior! No mínimo era um tubarão-branco que iria arrancar do joelho pra baixo.
Virei o corpo devagar pra trás e vi algo escuro, sei lá! A água balançava muito pra identificar o que poderia ser, foi quando veio subindo na minha direção. A cabeça ficou pra fora e o cabelo tomava conta de todo seu rosto. Eu ia xingar!- Que porra é essa? - ela rapidinho começou a tirar os cabelos que lhe cobriam a visão.
- Af! - riu desconsertada. - Desculpa!
E foi ai que pude notar com nitidez quem era: Bruna!
Fechei os olhos tentando me acalmar quando percebi que ela também me reconheceu.- Ta metendo o Nardoni, cara? - passei a mão gelada no rosto, tentando disfarçar meu suor.
- Oi! - exaltou-se. - Você é aquele cara da minha sala, o do Bic azul! - concordei com a cabeça.
- Bruna, né?
- É! E você? - ergui as sobrancelhas e me lembrei que realmente não tínhamos trocado essa informação.
- Felipe... Pereira.
Ficamos ali conversando um tempo e eu descobri algumas coisas da Bruna.
Primeiro, ela morava com o pai. Segundo, ela mudou de escola assim pois os pais se separaram e ela não podia continuar estudando longe e terceiro, filha única!
Confesso que a Bruna não fazia meu tipo (pelo amor de Deus, ela era gostosa) mas eu tinha um interesse em mulheres mais velhas.
Saímos da água em conjunto e eu acabei chamando ela pra comer camarão com a gente. Ela disse que só ia chamar sua amiga e sentaria com os moleques.- Na moral, é muito ruim sair com o Playboy! - CG pareceu bravo.
- Ué, caralho... Não entendi. - dei de ombros.
- O moleque já tá de papinho com a novinha ali. - apontou de boca cheia pra Bruna.
- Para! A mina é lá da sala, cara... - ele fez careta me imitando. - Tu que é afobado! - dei risada e tratei de enfiar a mão molhada pegando uns camarões.
Bruna e sua amiga vieram se aproximando cheias de bolsas, cangas e tudo o que mulher carrega pendurado pelos braços. Sentaram-se e comeram, ganharam até uma sequência de cerveja do CG que não parava de medir suas circunferências. Definitivamente, ele estava dando em cima delas e não importava qual delas diriam "sim".