"Beto, sou eu de novo. É que... Bem, é a terceira vez que ligo. Estou ficando preocupada. Por favor... Está tudo bem comigo, mas eu realmente queria falar com você. Por favor, me ligue."
Afasto o celular da orelha e fico olhando para ele como se Alberto estivesse escondido ali e fosse aparecer a qualquer momento. Não quero soar desesperada, por isso não liguei tantas vezes quanto gostaria, mas a verdade é que estou ficando realmente inquieta com o fato de ele não ter me ligado de volta.
Não que fiquemos em contato o tempo inteiro. Na verdade, passamos temporadas juntos quando a solidão fica muito pesada para ser carregada sozinha, mas às vezes ficamos meses sem nos ver depois disso. Já faz quase um ano desde a última vez.
Nesse meio tempo, só nos falamos em uma ocasião, há seis meses, quando liguei para dizer que estava me mudando para cá, caso ele quisesse ou precisasse me encontrar. Pensando novamente naquela última conversa, percebo que ele pareceu estranho ao telefone, distante e evasivo como se quisesse me dizer alguma coisa, mas não tivesse coragem. E agora eu tinha mais uma coisa com que me preocupar.
Porque, aparentemente, o ataque, o fechamento do bar, o possível sentimento de Paty por Teo e a sua própria confusão sentimental não são o bastante!
— Pois é. É só que não é bem uma opção não me preocupar — suspiro, falando sozinha.
Já faz dois dias desde que tive aquela conversa com Paty e, desde então, venho evitando Teo. Sei que não conseguirei fugir por muito tempo, mas por agora não sei o que mais posso fazer. Tenho muita vontade de estar com ele, mas não entendo a natureza desse sentimento, então preciso mantê-lo longe por mais um tempo.
Droga! Como posso já estar sentindo tanta falta?
— Descansando, princesa? — diz a voz de Lara, me tirando de meus devaneios. — O bar está começando a encher. E estou bem certa de que Samuel não te paga para escorar a parede do banheiro dos funcionários.
— Oi, Lara. Tudo bem? — cumprimento sem resposta. — Na verdade, eu já estou indo. Só precisava dar um telefonema e com todo barulho do bar...
— Hoje é sábado, meu bem. Não dá tempo de ficar aí tagarelando com seu namoradinho. Aliás, pelo menos desta vez você fez alguma coisa de útil, não? Estão dizendo que você está se enroscando com um desses cantores que tocam aqui no bar e que ele salvou você de ser estuprada ou sei lá... O que eu gostei dessa notícia é que você vai parar de dar em cima do Samuel. Ou um cara não é suficiente?
— Samuel!? Não, Lara, eu nunca...
— Ah, para de papo furado! Todo mundo sabe que antes de começar a namorar comigo ele corria atrás de você! — Ahn!? Todo mundo menos eu, pelo visto. — Mas, claro, isso é porque você fica aí dando mole!
— Mas Samuel não se importa comigo, Lara. Sou só uma funcionária. Você está enganada! E mesmo se ele estivesse interessado em mim, sou eu que não tenho interesse nenhum...
Meu Deus! Como foi que chegamos nesta discussão sem sentido?
— Sonsa, desgraçada! Ainda se faz de desentendida! Mas ele não precisa mais de você, viu? Está muito bem acompanhado agora!
Um estrondo de porta se abrindo e se chocando contra a parede interrompe a conversa. Em meus lábios, a resposta que eu ainda nem tinha planejado morre rapidamente.
— Algum problema aqui? — diz Paty, parando à minha frente e espalmando a mão na parede, colocando-se entre mim e Lara. O braço bem em frente ao meu rosto, já que ela é mais alta que eu, tampa um pouco minha visão, mas não o suficiente para me impedir de ver a expressão de Lara trair seu medo. Mesmo assim, ela tenta não aparentar e continua.
— Nada que te diga respeito, Pa-trí-cia — provoca Lara, silabando o nome num tom de voz irritante. — Isso é entre eu e a sonsinha escondida aí atrás de você.
— Meu Deus, Clara, olha só! Ela sabe separar sílabas! — diz Paty, se virando ligeiramente para mim, com um sorrisinho cínico no rosto, depois se volta novamente para Lara. — Pois é Se-nho-ri-ta Pa-trí-cia pra você, periguete. E você não tem nenhum assunto com a minha amiga aqui. Pelo menos nenhum que não envolva minha mão enfiada no meio da sua cara!
A voz de Paty é fria e seca, cortante como uma chicotada, e sei pela energia vermelha que flui de seu corpo que ela está absolutamente furiosa. Lara titubeia e mais uma vez sua expressão insolente se desmancha um pouquinho para logo ser recomposta novamente.
— Eu não tenho medo de você, idiota. Mas também não vou ficar aqui perdendo meu tempo com vocês duas, porque se nós três estamos aqui, significa que não tem ninguém pra atender os clientes. Não me admira o bar estar em maus lençóis com tanta gente vagabunda trabalhando aqui.
— Você incluída, né, queridinha? E todo mundo sabe que o único problema do bar é o vício de seu namorado no jogo, então não me venha com essa. Agora se manda, que eu cansei da sua cara e estou ficando com muita vontade de redecorá-la em tons de vermelho. Vai combinar com esse seu cabelo falso aí.
Em um movimento instintivo, Lara põe uma das mechas de seu cabelo tingido de ruivo atrás da orelha e, mais uma vez, compõe uma expressão cuidadosamente insolente, ainda que uma névoa amarela a envolva quando Paty estende o dedo e brinca ameaçadoramente com o piercing em sua sobrancelha.
— Vá à merda, Patrícia! — diz ela, batendo na mão de Paty para afastá-la de seu rosto. Depois sai batendo o pé, a névoa recuando para dentro dela de novo à medida que se afasta e fecha a porta atrás de si sem nos olhar.
— Meu Deus, Clara! Se você não vai se defender podia ao menos gritar quando essa mulher horrorosa te prensar contra a parede assim. Ou será que você não percebeu que ela queria te bater?
— Não precisa ficar tão nervosa, Paty! Eu agradeço por fazê-la sair daqui, mas não acho que ela fosse me bater.
— Ah, tá. Então ela só pretendia te insultar numa atitude realmente agressiva. Acho que então tudo bem! — diz ela ironicamente. — Você às vezes me irrita com essa passividade! Parece que não posso virar as costas um segundo quando ela está aqui.
— Calma, por favor. Não quero que você fique assim. E se te tranquiliza um pouco, se ela fosse mesmo me bater eu reagiria. Também não sou tão indefesa quanto você pensa.
— Sei, sei. Você ia dialogar com ela até a morte, de certo. Já estou até imaginando a cena: eu ia chegar aqui e encontrá-la encolhida em posição fetal no seu colo enquanto você mostrava pra ridícula que ela não é tão má assim.
— Mas ela não é...
— Ah, chega! — Faço uma cara meio ofendida com a reação, mas resolvo deixar para lá, porque sei que ela só está preocupada comigo. — O que a cretina disse, afinal? Por que ela estava brigando com você desta vez? — pergunta Paty, se acalmando um pouco.
— Você não vai acreditar — digo, lembrando do quanto fiquei chocada com as acusações. —Sabe por que ela tem tanta raiva de mim?
— Sei.
— Quê?
— Bem, eu suponho. Mas diga o que ela falou.
— Ela disse que Samuel era a fim de mim porque eu dava mole pra ele.
— A primeira parte combina com o que pensei... ela tem ciúme. E uma inveja tremenda também, porque todo mundo gosta de você e ninguém vai com a cara dela. Além do mais, é bem o jeito dela essa coisa de machistinha imbecil que culpa outras mulheres pelas cretinices do macho. Mas a segunda parte é ridícula, daí é que a gente vê o quanto a bicha é burra. Se ele era a fim de você e você dava mole pra ele era para estarem juntos, não? — Então ela se interrompe e faz cara de nojo. — Embora imaginar isso tenha sido o "momento eca" da semana. Uh! — Solta o ar bufando. — Mas que ele andava atrás de você, andava.