Imagine um motorista de taxi com dez dias de carteira de habilitação, sem experiência alguma de direção e sem conhecer as ruas da cidade ou os seus nomes. Esse motorista era eu! Sei que parece irresponsabilidade, e foi, mas eu tinha filhos para sustentar e não podia ficar de braços cruzados, então, saí da autoescola e fui direto para as ruas procurar por passageiros.
No terceiro ou quarto dia de trabalho, um rapaz pediu para ser levado ao bairro da Federação e, enquanto subíamos uma ladeira, ao tentar fazer meia embreagem, o carro ficou subindo e descendo sem eu conseguir controlá-lo. O passageiro começou a dar sinais de preocupação e quando um outro carro parou ao meu lado e o seu motorista me falou quase gritando: "Ô rapaz, não faça isso, não! Você é um profissional do volante!" Nesse momento, o passageiro fez menção de descer do veículo ali mesmo e eu quase morri de vergonha.
Por favor, querido leitor, não ria ainda. Isso era só o começo, eu ainda teria um ano inteiro de tribulações a enfrentar. Pois bem, rechaçando a ideia de deixar de ser taxista, puxei a trava de mão, engatei a primeira marcha e sai devagarzinho, do jeito como o instrutor havia me ensinado e consegui terminar a corrida.
Você sabe qual é a pior coisa que um crente em Jesus pode fazer? É tomar decisões sem lhe pedir orientação. Eu tinha me mudado para o Rio de Janeiro, no ano anterior, sem lhe pedir conselho e tinha repetido o erro ao comprar um carro deixando-o de fora dessa decisão. Com certeza, eu estava sofrendo as consequências de não ser submisso à sua vontade.
Lá um dia, um rapaz entrou em meu carro e eu fui imediatamente informado pelo Espírito Santo de ser ele um agente do Mal. Meu espírito se inquietou muito dentro de mim. Ele se sentava meio de lado e eu desconfiei ser para proteger a arma trazida na parte detrás do cós da calça.
- O que você está olhando? – ele disse, deixando-me mais preocupado ainda. – Toca o carro! Eu quero ir pro Candeal de Baixo, pela frente do Iguatemi.
Eu, compreendendo que seria roubado, assustei-me e senti minhas pernas começarem a tremer. Ao sair com o carro, passei a procurar alguma forma de ajuda. Ao avistar de longe um policial fardado, aproximei-me e verifiquei se tratar de uma mulher. Pensei em parar ao lado dela e pedir-lhe ajuda, mas fui surpreendido pelo passageiro que, pondo a cabeça para o lado de fora do veículo, gritou para a policial, segurando com a mão direita o que trazia escondia no cós da calça:
- Êta cidade pra ter mulher bonita! Até as policiais daqui são lindas! – ele disse para ela.
Quando ela o olhou, ele soltou um beijo e o lançou para ela com a mão esquerda. Ela fingiu não ter visto e disfarçou um sorriso vaidoso. Depois de nos distanciarmos dela, ele me olhou e disse:
- Tá querendo bancar o sabido é? Tome cuidado comigo. Você sabe quem eu sou? Eu sou fera, cara! Tome cuidado! O cara aqui é fera.
Mais assustado ainda, comecei a orar e a pedir socorro, silenciosamente, a Deus. Senhor, por favor me socorra. Eu sei que esse homem vai me assaltar e eu não tenho como me defender! Nesse mesmo instante senti como se algo falasse dentro de minha barriga: 'Brinque com ele'. Era o Espírito Santo me dando instrução.
O passageiro continuava falando muito e mexendo com as pessoas na rua, isso aumentava ainda mais o meu nervosismo. Minhas pernas tremiam cada vez mais, minha pulsação havia disparado e eu mal conseguia falar. O nervosismo era tanto que, ao passar em frente ao centro de compras do Iguatemi, errei o caminho e fui no sentido da Avenida Paralela. Ao perceber o erro, quis parar o carro, mas fui impedido por ele.
- Toque o carro! – ele ordenou. – Você já fez besteira mesmo, agora toque o carro, na Avenida Paralela eu arranjo um lugar onde a gente possa conversar. Você não sabe onde se meteu. O cara aqui é fera.
Nesse momento, o Espírito de Deus me repetiu: Brinque com ele! E mesmo tremendo muito, criei coragem e falei:
- É como diz o cantor: "sou fera ferida no corpo, na alma e no coração".
Por algum motivo, essas palavras consternaram o assaltante e ele balançou a cabeça em aprovação:
- Pô cara! Agora você falou tudo. Eu sou fera ferida, mesmo! Só Deus sabe o que eu já passei nesse mundão. Por isso aí que você falou, eu vou pagar adiantado. Tome aí cinquentinha e lá você me dá o troco. – Esse era um truque usado para me fazer acreditar ser ele uma pessoa honesta e, portanto, não vir a me roubar.
- Eu também sou fera ferida, não é só você, não – respondi. – Aliás, o mundo todo tá sofrendo muito. Tá ruim para todo lado. Mas a gente tem de saber levar a vida com alegria e com fé em Deus – falei, colocando o dinheiro no bolso da camisa.
- É isso mesmo cara, você sabe das coisas. Entre ali na frente, naquela entrada – ele falou apontando para uma pista lateral.
- Aí? – perguntei amedrontado. – Aí não tem saída!
- Eu sei. Aí é "boca de retorno". Você sabe o que é boca de retorno?
- Eu sei. Eu também sou fera ferida, cara! Boca de retorno é o lugar onde eu deixo você e retorno – falei, disfarçando o pavor com um sorriso largo na boca.
- Você é tirado a gaiato, hein! – ele falou.
Eu disparei a orar. Entramos no local ordenado e, poucos metros depois, a pista se acabou. Parei o carro e abri a porta ao meu lado, pensando se deveria correr ou não.
- E aí, quanto deu a corrida? – ele me estendeu mais uma nota de cinquenta mil cruzeiros (dinheiro daquela época).
Depois de olhar no taxímetro, falei:
- Vinte e cinco mil cruzeiros, mas eu estou sem troco – era mentira, eu tinha o troco para lhe dar, mas temi mostrar quanto tinha em mãos e menti – esta é minha primeira corrida e eu não tenho troco – menti mais uma vez, pedindo perdão a Deus.
- Deixa de conversa, cara! Pega logo o troco aí – falou, jogando o dinheiro no meu colo.
- Infelizmente, estou sem troco – falei – caso você não tenha trocado, vou perder a corrida e devolver o dinheiro – estendida a cédula de volta para ele.
Ele me olhou de cima a baixo, olhou em volta, jogou a nota no banco, desceu do carro e fechando a porta, falou:
- Olhe, cara! Só vou te liberar desta vez porque fui com a tua cara. Agora, caia fora daqui antes que eu me arrependa! – ele parecia não lembrar de ter me dado cinquenta mil cruzeiros antes e mais cinquenta, agora.
Fechei a porta do meu lado e saí dali cantando pneus.
Poucos dias depois, eu tinha vendido o carro e voltado a ser mais um desempregado a distribuir currículos.
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Coisas de Crente
SpiritualTrajetória de vida de um jovem crente que, mesmo apaixonado pelos ensinamentos de Jesus, deixa-se levar pelos prazeres da vida, tornando-se vítima de suas próprias escolhas. O passar dos anos e o amor do Senhor levam-no a entender que vida cristã é...