Bianca
— Bia, está tudo bem, amor? — Não sei quanto tempo tinha se passado, mas Rafaella estava batendo na porta do banheiro como uma louca. — Bianca, me responde! Estou preocupada, porra! Não faz isso!
Achei forças para gritar de volta.— Estou saindo!
Tirei a roupa e entrei rapidamente debaixo d'água. Minutos depois, eu saí e encontrei uma Rafaella preocupada me aguardando no quarto.
— Meu Deus! Achei que você tivesse desmaiado — falou, um pouco chateada. — Está melhor? — mudou o tom de voz e perguntou agora com carinho.
— Sim, meu amor — respondi com a voz trêmula. — Deve ter sido algo que eu comi. Igor já chegou? — Perguntei, olhando para o meu guarda-roupa. Estava fazendo de tudo para não ter que encará-la.
— Tem certeza de que está bem? Eu posso ficar aqui com você.
Havíamos combinado que Igor buscaria Rafaella para resolver algumas coisas na cidade.
Ela queria conversar com o veterinário que iria substituí-la e também precisava pegar algumas coisas em casa.— Não precisa, Marcela me faz companhia — respondi, abrindo um sorriso forçado. Vi quando Rafaella fez uma careta. — Não se preocupa, vou ficar bem.
Tive que convencê-la de que estava bem. Até o último momento, Rafaella relutou em me deixar, mas acabou sendo convencida por mim e por Manu e acabou indo embora com Igor.
Assim que Rafaella saiu, voltei para casa.
— Bianca, precisamos conversar. Você não pode ignorar Ivy dessa forma — Marcela falou quando passei por ela na sala.
Corri imediatamente para o meu quarto, ignorando a minha amiga. Não queria falar com ninguém. Queria esquecer o maldito bilhete. Eu me tranquei no quarto e voltei a chorar. Cada detalhe daquele mês passou como um filme em minha memória, e uma certeza se abateu sobre mim: eu não seguiria sem ela.
Estava sem chão... Sem rumo... Sem alma. Era doentio pensar que eu poderia estar apaixonada supostamente pela minha irmã. Não suportei a dor e comecei a gritar na tentativa de arrancar o sofrimento de dentro de mim, mas foi em vão. Quanto mais eu gritava, mais meu coração sangrava. Gritei por vários minutos até ser derrotada pelo cansaço.
— Bia, minha filha. — Ouvi a voz do meu pai me chamando. Tropecei e caí na cama, mas levantei o mais depressa possível. Ele tinha as respostas pelas quais eu tanto ansiava.
Assim que abri a porta, meu pai me olhou espantado.
— Por favor, pai — comecei a suplicar. Ele não entendia o que eu estava falando. — Diz que é mentira, pai, por favor, isso não pode ser real. Diz que é mentira. — Eu me agarrei a ele chorando, completamente desesperada.
Ele demorou alguns segundos para responder, mas me pareceu uma eternidade.— Filha, eu não sei do que você está falando. Por favor, se acalme primeiro. — Meu pai me abraçou forte, e foi uma das poucas vezes que recebi esse carinho. Mas me sentia tão despedaçada que não conseguia pensar no que estava acontecendo.
— A Rafaella não pode ser minha irmã —murmurei baixo, como se aquilo pudesse fazer tudo ser uma mentira. — Eu e Rafaella não somos irmãs. Isso não pode acontecer.
Eu a amo. Amo como nunca amei ninguém.Meu pai se afastou para me olhar. Meu corpo inteiro tremia, com medo da resposta que viria.
— Bianca, eu não sei o que está acontecendo. De onde foi que você tirou essa ideia, minha filha?
Abri o guarda-roupa e peguei a caixa que tinha escondido lá. Espalhei tudo que tinha dentro sobre a cama. Meu pai encarou surpreso cada foto e cada carta.
— O que é isso, pai? Por que tem várias cartas do pai da Rafaella pra minha mãe? Diz pra mim! — implorei por respostas. Não tinha mais voz, não tinha mais forças. Então, caí no chão, sentada sobre as pernas.
— Filha, você e a Rafaella não são irmãs — meu pai respondeu com os olhos fechados. Vi seu rosto transfigurado pela dor. — Mas você precisa saber de algumas coisas — explicou.
Meu pai me ajudou a levantar, e eu sentei na cama, esperando para ouvir o que ele tinha para contar.— A primeira delas é que... — meu pai hesitou, mas continuou — Sebastião, o pai da Rafaella, foi o grande amor da vida da sua mãe. Eles se amaram por anos, e a última palavra que ela disse antes de morrer foi o nome dele.
Apesar de estar mais calma por saber que Rafaella e eu não éramos irmãs ou algo do tipo, a história me deixou estarrecida.
Minha mãe e o pai da Rafaella? Como assim? Não fazia sentido.
Rafaella
Eu não queria deixar Bianca sozinha, ela parecia não estar bem, mas acabei dando o braço a torcer. Realmente precisava resolver muitas coisas na cidade, já que tinha saído do hospital direto para a fazenda. Precisava falar com o novo veterinário, passar em casa para pegar algumas coisas e ir ao posto de saúde para uma consulta com o Dr. Jorge.
Além disso, também precisava fazer uma visitinha a uma certa pessoa. Desde que tinha visto aquela idiota beijando a minha namorada, eu não conseguia parar de pensar no que fazer. O problema é que eu não poderia partir para cima dela enquanto estivesse presa naquele maldito trambolho. Mas é para essas coisas que servem os amigos.
Sorri com esse pensamento enquanto Igor dirigia concentrado na estrada. Eu tinha pedido que ele me levasse ao hotel e me ajudasse a dar um chega para lá na pangaré. Igor não pensou nem dois segundos antes de me responder. Esse companheirismo era o que eu mais gostava no meu amigo. Companheiro é companheiro, filho da puta é filho da puta.
— Aonde você quer ir primeiro? — Igor perguntou quando já estávamos quase chegando à cidade.
Fiquei tentada a ir direto atrás da idiota, mas me contive. Deixaria por último, assim não atrapalharia o restante dos meus compromissos.
— Vamos em casa, passamos no Dr. Jorge, visitamos a pangaré e depois vamos buscar o Guilherme. — Confirmei o itinerário e Igor não discordou.
Entrei em contato com Guilherme, um amigo de faculdade, para pedir que ele prestasse serviços em algumas fazendas onde eu trabalhava. Assim os proprietários não ficariam na mão durante a minha recuperação. Por sorte, Guilherme estava trabalhando na fazenda Raio de Sol, que ficava na região. Sempre confiei de olhos fechados nele, um veterinário excelente e muito profissional. Eu tinha certeza de que ele faria um trabalho tão bom quanto o meu ou até melhor.
Guilherme era funcionário fixo da Raio de Sol, mas, assim como eu, prestava serviços para outras fazendas. Quando contei a ele sobre o acidente e pedi sua ajuda, ele prontamente respondeu ao meu pedido.
Igor estacionou na porta da minha casa e eu aguardei ele tirar a maldita cadeira da caminhonete.
— Vamos lá, mana — disse ele, me carregando e me sentando.
— Se for para ficar assim pelo resto da vida, vou preferir morrer — disse em voz baixa.
Igor imediatamente virou a cadeira de frente para ele e me encarou com ódio. Acho que nem quando nós brigamos na faculdade eu o vi tão chateado comigo.
— Porra, Rafaella! — Gritou, e eu abaixei a cabeça recuando. — Nunca mais fale uma merda dessas. Já imaginou como Manu e o Zé Luís ficariam? E eu, seu melhor amigo? E a Bianca, já pensou o que ela acharia se te ouvisse dizer isso?