POV. Camila
Com um dos braços apoiado na mesa, cocei os olhos com a mão livre. Eu estava extremamente cansada do dia cheio que tínhamos tido. Fomos à cachoeira, fizemos uma pequena trilha e cuidamos de alguns animais da fazenda. Quando estava começando a escurecer todos os grupos foram reunidos novamente e o garoto que havia passado parte do dia comigo havia se juntado aos amigos.
Dinah sentou do meu lado enquanto eu empurrava meu prato, já vazio para frente. A comida pareceu bater e o sono crescer. Olhei no visor do celular me certificando da hora. Mais alguns minutos e eu poderia deitar e dormir no meu canto.
- E aí.
A garota me cutucou com os ombros. Um sorriso farofeiro no canto dos lábios e um dos olhos um pouquinho fechado.
- Oi – Respondi cansada, mas sorri abertamente.
- Que horas você vai?
Ela perguntou rodando o celular sobre a mesa e eu franzi o cenho sem entender exatamente o que ela queria dizer com aquilo.
- Pra onde?
- Amiga, você está em que mundo?
Ela rolou os olhos e empurrou o aparelho na minha direção. Continuei com uma cara de interrogação mas assim que a tela se acendeu eu entendi brevemente alguma coisa.
23:30 – Chalé dos fundos.
- O que é isso?
- Uma festinha, oras. – Ela rolou os olhos e eu devolvi o celular sem mostrar entusiasmo algum, até mesmo pelo fato de não termos liberação para aquilo.
- Tô cansada Chee.
- Ah não Camila. Todo mundo vai...
- Todo mundo vai aonde? - O corpo maior que o nosso sentou do meu lado vago e eu não precisava me virar pra saber quem era. Dinah apenas estendeu rapidamente o celular e Shawn pareceu compreender – Ah sim, nós vamos.
- Nós? – Perguntei lerda.
- Vocês! Ou você vai deixar ele ir sozinho? – Dinah se intrometeu.
- Claro que nós vamos, digo, pode ser divertido.
Ele deu de ombros. O casaco de moletom vinho da vans contrastando perfeitamente com o tom de pele completamente branco do garoto. Os cabelos completamente bagunçados, como se ele tivesse dormindo, o que era provavelmente o que ele estava fazendo antes de aparecer ali.
Eu tinha uma tendência a ser certinha. Nunca ultrapassava o limite estabelecido, fossem em casa ou em qualquer outro ambiente. Só o pensamento de estar em uma festa "proibida" que me fazia sentir que estava quebrando leis fazia todo o meu corpo formigar. Eu só não sabia se era ansiedade ou nervoso.
Muito provavelmente eu não pensaria duas vezes e iria negar, como sempre, mas só o jeito que eles estavam falando já era o suficiente para que eu me comprometesse com aquela pequena loucura. O sono agora parecia ter dissipado do meu corpo e eu assenti timidamente com a cabeça.
- Ótimo – Dinah se levantou do nada. Eu tinha até me esquecido de que ela estava ali. – Vou te esperar no quarto.
- Okay.
Olhei para cima e a grandona saiu normalmente. A acompanhei com o olhar até ela sumir pelo corredor e quando voltei os olhos parra Shawn ele estava empurrando mais o meu prato pra longe.
- O que foi? – Perguntou enquanto eu tinha os olhos cravados nele.
- Nada. – Ri sozinha pela maneira avoada dele - Conseguiu descansar?
- Um pouco.
Abaixou as mãos enquanto brincava com a borda do meu grande casaco. Estávamos sentados em um pequeno banquinho de madeira. Eu de frente pra mesa e ele de frente pra mim, com uma perna de cada lado.
- Acho que isso não vai dar certo. – Pensei alto.
- Bom, só tem um jeito de saber.
Shawn franziu o cenho e fechou um pouco o canto dos olhos conforme um sorriso de lado surgia em sua boca, de um jeito engraçado ele por fim sorriu por completo, uma tentativa de forma uma cara maliciosa, que pra mim não passou de uma feição engraçada.
[...]
Eu queria me arrepender e no fim do tudo, ou no inicio melhor dizendo, aquele ditado profetizado por muitos piscava colorido na minha mente: se arrependimento matasse eu estaria morta. Mas eu não estava. Eu não estava morta e muito menos arrependida.
- Mais uma pra Camila aqui! – Escutei alguém dizer em voz alta e antes que pudesse pensar em algo, mais um copo com um líquido amarelado era depositado em minhas mãos.
- Vira! Vira! Vira! – Ouvi um coro e sorri largamente antes de beber o líquido todo, ouvindo ao fundo todo mundo comemorar.
Pois bem. Imagine cerca de trinta adolescentes bêbados, risonhos e falantes. Agora imagine esses mesmos trinta adolescentes fazendo uma festa escondida dentro de um pequeno chalé escondido nos fundos do terreno do hotel fazenda. O medo que eu havia sentido minutos antes, agora transformado em adrenalina, vibrava pelo corpo junto com o líquido que descia rasgando minha garganta adentro.
- Chega. Chega.
Shawn apareceu do nada, tirando o copo da minha mão onde ainda havia resquícios da bebida. Logo eu. Logo comigo. Olhei pra ele sem entender e ele fez uma careta feiosa, mas eu ri. Eu ri mole e Dinah riu junto comigo.
Ouvi alguns lamentos murmurados e embolados. Não que eu estivesse bêbada. Eu só estava feliz. Feliz até demais. E não tinha percebido há exatamente que horas eu havia chegado naquele ponto da felicidade, mas que eu havia chegado. Ah, isso sem sombra de duvidas.
- Shiiiii.
Minha amiga resmungou sobre meus ombros e rimos de novo. Shawn colocou o copo em cima de uma mesa rustica que parecia estar abandonada. A musica que tocava ali vinha do aparelho celular de algum aluno que estava acoplado a uma pequena caixa de som, já que não podíamos fazer muito barulho.
- Isso está saindo de controle.
- Já saiu.
Cameron passou por nós rindo e sacodindo um copo como o meu e então eu parei pra observar melhor o lugar. Eu não sabia que horas era, mas com certeza já se passava de meia noite e meia. O chalé parecia abandonado, mas só parecia. Ali dentro tinha alguns moveis e uma lareira, que por sorte (ou azar) estava acesa.
- Dinah! – Eu chamei minha amiga e apontei pra lareira rindo. Normani sentada bem em frente segurando um palito espetado em alguma coisa.
- Toma, bebe.
- Que isso?
- Água. Bebe.
- Mas eu não tô com sede.
- Beba logo, Camila.
Bebi o líquido transparente e gelado, só agora dando conta que estava com sede. Shawn me olhava querendo ficar sério, mas tinha um resquício de alegria.
Dizem que a bebedeira tem fases. Eu ainda estava na primeira delas e pelo visto não iria experimentar as outras, mas nem queria. Aquilo já estava o suficiente bom pra mim. Então eu vou explicar melhor.
