Capítulo 12 - "de alguma forma naquele calor, ela conseguiu sentir frio."

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Nadja passou um pouco de água no rosto. Naquele dia ela era capaz de sentir seu nariz ardendo todas as vezes que um ar quente passava por ela. Olhou para trás e bufou, o oásis já não era visível há uns dois dias, mas a lembrança daquele lugar tranquilo e que não estava tentando matá-la fazia falta. Além disso, tinha dois dias que não conseguia fechar os olhos para dormir mais uma vez.

Imagens de Bailey morto e os dias de cativeiro nunca foram tão vividos na sua memória. Culpava o Sol e o céu azul límpido, o calor na sua cabeça, a areia entrando na roupa, cabelos e grudando na pele suada. Culpava principalmente está sóbria.

Pensou como foi horrível os dias que seguiram a tentativa de suicídio, sua cabeça parecia andar em um limbo estranho e suas reações eram lerdas, descobriu mais tarde que eles estavam dando ópio para ela na tentativa de evitar a dor dos ponto. Além disso, ficava sempre um guarda silencioso dentro do seu quarto a olhando, constantemente. Nenhum parecia disposto a conversar e nem ela. As únicas vezes que eles iam embora era quando Jean entrava e a dava de comer, puxava assuntos leves e estranhos e parecia disposto a fazer Nadja se sentir confortável ou feliz. Sem sucesso.

- Você podia sorri mais, sabia? - ele disse uma vez que trouxe para ela uma bebida nativa da terra dele - Eu sei que isso não é o ideal para você e, acredite, não é para mim também! Mas, estou tentando, não vamos mais aplicar as torturas em você, conversei com meus superiores e eles também acham que é inútil tentar você falar.

- Você nem me perguntou nada. - ela disse sentindo a cabeça rodar.

- Claro que perguntei! - ele sorriu de canto de boca.

Ele não tinha perguntado, ou pelo menos, nas memórias de Nadja ele nunca havia perguntado. Ela se questionou se a morte de Bailey a tinha deixado distante da realidade o suficiente para não ter prestado a atenção devida do seu entorno. Engoliu seco, mas tentou manter a expressão confiante.

- Olha.. - ele sentou ao seu lado e pegou nas mão já sem força dela - Eu me importo com você e seu bem estar! Você me parece ser uma garota bem legal, apesar de ter sido criada para matar.

Nadja não respondeu. De fato, ela havia sido criada para cortar a garganta dele com os dentes se precisasse, por um minuto a ideia soou até agradável. Tinha sido colocada em um treinamento rigoroso com o primo que ele matou, aprendido a subir nas casas e atacar por cima e quebrar os crânios, tinha sido, desde o dia que seus pais morreram, feita para colocar veneno na comida certa e não pensar nas consequências disso. Tinha tido seus ossos do corpo quebrado várias vezes, sentido o que era uma facada mais de uma vez, quase ter morrido em outras missões e agora, aquilo, um cativeiro eterno. Seu avô tinha a tornado em uma arma e ela sempre teve orgulho disso, ou tinha, aquilo fraquejou por um momento.

- Eu quero que você fique bem e tranquila. - ele tirou uma mecha de cabelo do rosto dela - Uma garota como você deve ser protegida e eu não acho que você tenha sido.

Dez anos. Dez anos foi a idade que ela matou o primeiro homem. Ela não foi protegida da violência do mundo como suas meio-irmãs, sempre arrumadas e sorridentes, ela não foi protegida da dor de perder pessoas que ela ama, ela não foi protegida por nada. Mas a culpa era do homem na sua frente, daqueles como eles que vieram com suas armas e tiraram o poder da sua família, ditando o que seria melhor para todos, mesmo que nunca tivessem pisado naquelas terras antes.

Ela virou o rosto de uma vez e se afastou com uma expressão de nojo.

- Não acho que você queira me proteger. Nem preciso.

- Não? - ele sorriu gentilmente - Não matamos você e temos te alimentado bem. Venho todos os dias conversar com você e já te ofereci livros, instrumentos, tudo o que você poderia querer estando aqui. Lá fora, você ia ter que trabalhar! Aquele trabalho horrível! Quanto anos tem? Quem em são consciência deixa uma criança fazer o que faz!

"Meu avô", ela pensou, refletindo o quanto aquelas palavras eram parecidas ao protestos de Haj e de Armim para o avô. Quantas vezes ela não os ouviu discutindo sobre isso? Quantas vezes o avô dela apenas disse que eles davam conta dando uma piscadela para os dois assassinos dele? Na época ela se sentia especial, por que agora não?

Naquela dia, Jean conseguiu se aproximar dela o suficiente para dar um beijo em sua bochecha, prometendo que ela ia ficar bem. Nadja quase acreditou naquilo pela forma que ele falava.

Distância. Era algo que ela tinha achado que tinha aprendido a criar, mas olhou para Khaili deitado na areia e torceu a boca, ela tinha o deixado entrar em algum momento daquela viagem. Se viu rindo com ele a medida que ele contava historias engraçadas, se viu falando coisas sobre si que não queria, se viu sendo honesta até demais na sua presença. Não sabia se tinha sido a forma honesta e alegre dele de agir ou se tinha sido a forma leve dele de levar a vida. Ele era uma pessoa boa e ela sentia falta de ver pessoas assim.

Algo na areia se movimentou. Nadja se piscou várias vezes, poderia ser o vento movendo as dunas, como era constantemente, mas era diferente. Ela se levantou e forçou a vista para tentar entender o que tinha visto, mas uma vez movimentou algo. Algo diferente da cor da areia, era branco, sujo por essa cor, mas era branco. Talvez fosse um nômade, mas eles sempre andavam em grupos familiares grandes e não sozinho.

Foi então que ela entendeu aquela forma humanoide, era um homem. Mesmo distante ela conseguiu perceber o quanto ele era bonito e estranhamente não ali, como se ele estivesse transparente sumindo e aparecendo na areia constantemente. Ele viu ela.

O sangue de Nadja gelou, de alguma forma naquele calor ele conseguiu sentir frio. Ele tinha olhos de fogo, sorriso de brilhante e a pele bronzeada, longe de ser prejudicada pelo Sol. Um vento novo passou e todo um oásis cheio de pessoas como ele surgiu como uma miragem. O vento passou de novo e tudo, menos o homem sumiu.

Ele manteve o sorriso e desapareceu lentamente.

Nadja sentou na areia, assustada e tremendo. O que foi aquilo? Uma loucura da sua mente sóbria e castigada pelo Sol e calor ou... nem havia explicação lógica para tudo aquilo que ela havia visto além de insolação e desidratação. Mas era tudo tão real e vivido, uma certeza daquilo tudo ser verdadeiro a atingiu com força.

Ela poderia ter problemas com a sua cabeça, mas não tinha criatividade o suficiente para criar aquilo tudo. Pelo menos, nenhuma das suas viagens ela tinha sido capaz de criar toda uma cidade ou um povo. Aquilo era real!

Nadja sentiu o impulso de acordar Khalil e tentarem ir para outro lugar o mais longe dali o mais rápido possível, mas percebeu que aquilo era inútil. Aqueles seres eram mágicos, feitos de pó e calor, seus pais haviam falado sobre eles, os verdadeiros descendentes do Reino dos Dragões, os únicos que descobriram formas de manter o antigo estilo de vida e, possivelmente , toda a magia passada.

Os joelhos dela tremeram e teve de ajoelhar no chão, a sua sorte era que se aquilo não fosse uma grande ilusão, nenhum deles tinha feito nada desde o momento que eles pararam ali. Não tinha razão deles tentarem fazer algo agora. Nadja não era louca o suficiente para tentar verificar se era verdade e desencadear na sua morte e na de Khalil.

Olhou mais uma vez naquela direção e o vento passou várias vezes sem que nada mudasse. O coração dela não parava de bater em seu ouvido e a vontade de vomitar aumentava. Talvez fosse melhor encarar seus pesadelos. Se aquilo fosse verdade e quisessem matar ela, era melhor está dormindo.

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⏰ Última atualização: Sep 15, 2020 ⏰

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