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Hope acordou de manhã, esperando mais uma manhã como qualquer outra. Mas não era uma manhã como qualquer outra. Olhou pela janela e viu os mesmos pássaros de sempre a voar, a piar. Viu o mesmo sol, as mesmas nuvens a tentar escondê-lo. Com atenção, viu o seu reflexo. O mesmo reflexo de sempre. Levantou-se finalmente, aproximou-se e abriu a janela, sentindo a doce brisa do inverno a chegar. Estava um dia lindo de Outono. Um dia demasiado lindo para ser o dia.

                -Hope? – Duas batidas na porta.

                -Sim, mãe?

          -Posso entrar? – Sem esperar pela resposta, entrou, espantando-se com a filha quieta. Normalmente a esta hora estaria a tomar banho, mas hoje era um dia especial e isso não tinha importância. – Parabéns! Parabéns! – Correu a abraçar Hope, esta limitou-se a um sorriso forçado. – Nem acredito que já tens 18 anos… Nem acredito que… que já podes… encontrá-lo.

                -Nem eu, mãe… Nem eu.

                -Ansiosa? – Encolheu os ombros em resposta.

                -Tento não pensar nisso…

                -Sempre foste tão diferente das outras meninas… - Hope sentiu a amargura na voz da sua mãe. A ponta de desilusão.

                -Só não acho que faça sentido ter alguém programado para me amar… Por que é que preciso de alguém sequer? Estou bem sozinha, sempre estive…

                -Ele deve estar ansioso do outro lado de sabe lá deus onde, a preparar-se para te conhecer. E tu devias fazer o mesmo. Portanto veste-te com elegância, hoje é o teu dia. Nada de botas, calças rasgadas ou casacos desportivos, ouviste menina?

                -Sim… - Acenou ligeiramente, sem olhar para a mãe. Hope e a mãe eram completamente diferentes. Ela era tão despreocupada, mas a mãe era rígida, sempre pontual, sempre impecável com os seus saltos e o seu cabelo perfeitamente penteado com camadas de laca para que nem uma ponta se soltasse. Hope só queria aproveitar a vida. Não tinha tempo, ou paciência, para esse tipo de formalidades. Mas hoje teria de ter. Hoje era o dia.

                -Não te preocupes, filha… Ele vai ser bem escolhido, garanto-te.

                -Como podes ter tanta certeza?

                -Os testes ditam. Ele será a tua alma gémea.

                Hope andou até ao roupeiro e reparou que tinha um cabide com um conjunto devidamente preparado. Decidiu ignorá-lo e vestir-se à sua maneira, bem, mas à sua maneira. Tinha despensa de aulas pois teria de ir até Londres fazer os testes. Tomou banho e desceu para comer o pequeno-almoço. Hoje a mãe tinha-se esmerado e feito panquecas com chocolate.

                -Não estás com a roupa que escolhi… - A mãe disse-lhe ao vê-la descer as escadas. – Mas estás muito elegante… Gosto de te ver de saltos. – Sorriu, um sorriso pequeno, mas agradável, que fez com que Hope sorrisse também.

                -Cheira bem… Panquecas? Obrigada, mãe. – Esforçou-se para retribuir o elogio da mãe.

                Depois de comer, a mãe deixou-a na estação para que esperasse pelo comboio que a levaria até ao seu destino. Era uma linha especial, só para fazer este trajecto todos os dias, para carregar as pobres vítimas da lógica mais falhada de que Hope se lembrava. Mal o comboio chegou, reparou que havia outro rapaz da sua cidade a ir. Ela conhecia-o de vista. Niall Horan. Entrou, a carruagem do distrito ainda estava vazia, pelo que conclui que deveria ser a primeira paragem. Sentou-se à janela e esperou. Niall sentou-se no banco do outro lado do corredor. Perto, mas longe. O comboio andou uns minutos até voltar a parar. Entraram três raparigas que se sentaram afastadas de Hope. Olhou pela janela e tentou não pensar no que estava prestes a acontecer, mas falhou. O nada da paisagem lembrava-a ainda mais do nada que sentia. Do vazio. Era um vazio estranho esse, era um vazio preenchido. Mas o vazio não pode ser preenchido…

18 [Versão Portuguesa]Onde histórias criam vida. Descubra agora