Capítulo 2 - Edgar

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Diretor de uma das filiais brasileiras da mais renomada empresa de iluminação mundial, Edgar é o tipo de pessoa que dedica a vida e a morte ao trabalho. Ao contrário do que muitos pensam, o empenho com a empresa não era algo nocivo, tampouco o incomodava: ele havia dedicado seus estudos à administração privada, conseguiu a oportunidade única de estar no comando de um grupo respeitado, quantos colegas de faculdade haviam conquistado tamanha dádiva? Por isso, ele era imensamente grato pelo lugar que ocupava. No entanto, até mesmo o mais fiel e dedicado funcionário precisa de férias. E foi após cinco anos de integral dedicação à sua função que Edgar percebeu isso, após descobrir em uma consulta médica que estava no caminho para o colapso mental.

Foi então que o jovem decidiu que usaria o fim de ano para uma bela viagem, afinal, sua empresa era uma das protagonistas do cenário natalino, com a decoração luminosa dos mais famosos destinos turísticos, mas ele próprio nunca havia conhecido pessoalmente a maior parte dos cenários que arquitetava.

Escolher o destino não foi uma tarefa tão fácil quanto Edgar imaginava. Enquanto analisava as possibilidades selecionadas pela sua secretária, se deu conta de que existiam muitos lugares incríveis pelo mundo. Lugares esses muito maiores e mais exploráveis que as quatro paredes brancas de seu escritório, onde passara a maior parte da vida até então. Como uma reação em cadeia, ele tinha certeza de que aquelas férias não seriam apenas um breve descanso para voltar à rotina monótona de preencher papéis: a partir de então, Edgar sentiu crescer dentro de si uma vontade enorme de desbravar o mundo e aproveitar aquilo que de fato lhe valeria como experiência de vida.

Mas ainda era preciso decidir qual seria o ponto de partida. Depois de alguns dias pensando incansavelmente naquela viagem dos sonhos, seja no sono, enquanto dirigia e até mesmo em algumas reuniões tediosas da companhia, finalmente decidiu: Suíça. Os Alpes Suíços, especificamente. As outras cidades, por mais que tivessem atrações fantásticas para a noite de Natal, não se equiparavam às mágicas experiências propostas pelo clima natalino das tradicionais vilas suíças. Além disso, o país era famoso pelo chocolate, e não seria má ideia para Edgar, um nato gastrônomo, conhecer os sabores prometidos pelo destino.

Para além da pausa da rotina, aquela viagem funcionou também como um combustível para o empresário. Os três últimos meses do ano passaram de uma forma que ele nunca havia percebido: estava mais motivado no trabalho - o que era excelente, já que habitualmente o zelo com as questões da empresa já era enorme - e a ansiedade para embarcar com destino ao novo país fez surgir em seus olhos um brilho perdido há tempos.

A apreensão triplicava a cada dia, e na véspera do embarque, que seria no dia 20 de dezembro, Edgar precisava apenas resolver algumas poucas questões burocráticas na empresa antes de partir para o aeroporto. Quando assinou o último papel, sentiu como se estivesse rubricando a própria liberdade: nos próximos dias, estaria desimpedido de qualquer obrigação empresarial, poderia ser única e exclusivamente o Edgar normal, um jovem adulto cuja única preocupação seria reverter todo o tempo de vida perdido.

O restante da viagem, apesar de cansativa, ocorreu de forma tranquila, apesar do tumulto nos aeroportos lembrarem o rapaz de como ele odiava multidões quando era mais novo. Mas, no fundo, já era esperado, afinal, vésperas de feriados sempre são assim: familiares e amigos correndo contra o tempo para conseguirem encontrar as pessoas que amam.

De certa forma, esse pensamento instalou em Edgar uma reflexão que durou boa parte da viagem. Há quanto tempo ele passava a noite de Natal sozinho, sem a companhia de ninguém especial? Sua família nunca foi muito grande, geralmente, as ceias eram compostas apenas por ele, seus pais e o irmão mais novo. Depois da morte dos progenitores, o irmão passou a frequentar a confraternização da família da esposa, e ele, deixou de ver o feriado como um dia importante.

A partir de então, era apenas mais uma data comemorativa que utilizava como desculpa para uma pausa no trabalho e aproveitar a própria companhia em um bom restaurante. Ele não saberia explicar ao certo, mas aquela experiência de introspecção parecia revelar um desejo novo e intenso em seu íntimo: a necessidade de uma companhia. Não qualquer companhia, pois dessas ele poderia arranjar aos montes. Precisava de alguém especial, daquele tipo em que muito se fala nos livros e novelas: uma pessoa para amar intensamente, dividir as tristezas e alegrias, e, claro, aproveitar a vida - sua mais nova projeção que em pouco tempo já estava infiltrada em todos objetivos pessoais do empresário. De forma alguma isso significava negligenciar o trabalho, mas, no auge de seus 30 anos, Edgar concluiu que precisava de um propósito de vida além de acumular méritos e capital.

Seus pensamentos foram interrompidos pelo aviso de aterrissagem, que, felizmente, foi rápida e bem sucedida. Como o desembarque ocorreu em Zurique, foi necessário ainda uma viagem de trem para que chegasse à região dos Alpes Suíços. Mesmo antes de alcançar o destino final, o simples fato de estar em outro país, com línguas e pessoas tão diferentes, novos cenários e a promessa de fantásticas descobertas já serviu para aliviar grande parte do estresse de Edgar, que parecia uma criança de tão radiante.

Ao contrário do que esperava, no momento em que desceu na estação final não estava

nevando - uma pequena decepção, já que fazia tempos que não via a neve. No entanto, o chão coberto de branco e a temperatura extremamente baixa indicavam que não ia demorar para que os flocos de gelo começassem a cair novamente. O caminho até o hotel não era grande, pois apesar do destino escolhido ser consideravelmente badalado nessa época, a cidadezinha era pequena, mais similar a uma vila. Assim, Edgar optou por caminhar até a hospedagem, aproveitando para visualizar brevemente as atrações da cidade que encontrava pelo caminho, arquitetando mentalmente como utilizaria bem o seu tempo para conhecer com calma todos os encantos daquela fascinante região da Suíça.

Após cerca de vinte minutos, finalmente chegou ao imponente casarão que o hotel estava instalado. A fachada retratava uma construção antiga, mas muito bem conservada, em contraposição ao interior, que mesclava a estrutura arquitetônica clássica com o requinte e a modernização de um estabelecimento renomado. Depois de concluir todos os procedimentos obrigatórios de check-in, por fim, pegou o cartão eletrônico que destrancava a porta de seu quarto e seguiu pelo elevador até o último andar, onde encontrou, depois de um longo corredor, uma bela instalação, com lareira, cobertores quentinhos e uma enorme banheira. No Brasil, não era comum ter esse tipo de apetrecho nas casas, tampouco em apartamentos, como era seu caso.

Empolgado, a primeira coisa que fez foi tomar um reconfortante banho, com a água tão escaldante que sua pele habitualmente clara ganhou uma coloração avermelhada em pouco tempo. Por estar no ponto mais alto do prédio, a janela acoplada à banheira possibilitava uma vista fenomenal, com as montanhas cobertas de gelo ao fundo e, mais próximo, a cidade iluminada pelas lâmpadas amarelas e coloridas de Natal. Na região central, também conseguia ver uma longa feira, que presumiu ser uma das atrações de sucesso que seu guia turístico anunciava.

Quando a água começou a esfriar, Edgar se deu conta de que passara um bom tempo ali, admirando aquela paisagem tão diferente da selva de pedras que costumava ver da janela de seu escritório. Já sentindo o cansaço da viagem pesar, o jovem sequer desceu para o jantar. Naquela noite, deitou-se entre os inúmeros cobertores que bloqueavam o frio intenso do inverno nebuloso e não teve nem tempo de sonhar: apagou em um sono profundo que só foi interrompido na manhã do dia seguinte.


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