Capítulo 2 - Cadê os modos, Alice? ៚

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[Tadeu]

             Quando se possui um sonho é preciso ir até o fim, seja ele qual for, e ainda assim fazer o necessário e o impossível para realizá-lo. Sendo assim, cá estou eu pegando outro voo para o Rio de Janeiro.
             Estou dando tchau a Bahia e a faculdade de Administração na UNICSUL, depois do meu pai descobrir que filei algumas aulas para fazer uns sons nas casas de shows acompanhado de alguns amigos. O seu jeito de tentar resolver isso foi me transferindo de Salvador para o Rio, acho que por minha mãe ter dito que longe da "má influência" eu irei me interessar mais. Ah! Pelo amor, né mãe?
            Se ela acha que eu vou desistir da música, enganada.
            Estava procurando meu assento no avião quando descobri que a minha companheira de viagem mais parece um pimentão de tão vermelha do que uma garota. Sento-me do seu lado procurando uma posição confortável para a viagem. Escuto o fungar da loirinha no assento ao lado e a dúvida surge: eu falo com ela ou não?
            Vai que é coisa passageira.
            Ou será que ela pode mesmo estar precisando de alguém?
            Mas com certeza essa pessoa não seria eu.
           — Tá tudo bem?
           Se ela está chorando é porque não está nada bem né, Tadeu!
           
— Vai ficar. — responde. Seu olhar antes preso às nuvens volta-se para mim. — Me desculpe se te deixei desconfortável.
          — Oxe, que nada. — Inspiro fundo. — Eu não sei o que é ou quem é que te fez chorar, mas ponha a angústia pra fora. Às vezes chorar pode fazer bem, mas não se demore muito nessa, sabe?
         Com um movimento delicado a garota limpa a região abaixo dos olhos e ri. Não é um riso tímido como eu esperava, mas um em que parece que contei algo engraçado — o que não deixa de ser um sorriso bonito. Eu retribuo.
          — Isso garota. — parabenizo. — Aposto que a sua mãe nunca te disse para conversar com estranhos. — brinco.
          — Ah, com certeza. — ela ri.
          — Vamos resolver isso então. Qual o seu nome? — pergunto fitando-a e cruzando as pernas.
          — Alice — responde. — E o nome do poeta qual é?
          — Tadeu. — digo rindo — Então... Alice, você quer desabafar? Conversar sobre o que está sentindo? Não precisa dar detalhes.
         — É complicado. — Ainda sorrindo, Alice solta um suspiro estremecido.
         — Falar sobre o problema não vai complicá-lo mais. Saudades de alguém? – pergunto. Ela confirma com a cabeça — Do nego?
         — Quem?
         — Namorado.
         — Não, não! — respondeu determinada. — Da minha família.
         — Então você não tem namorado ou não sente saudades dele? — Miro na brincadeira.
         — Terminamos há algum tempo.
         Mas acabo acertando em um ponto delicado.


[Alice]

            Tadeu não me pareceu ser uma pessoa ruim. Admito que ele me assustou quando analisou o meu rosto milímetro por milímetro, mas ao menos tentou ser engraçado e me distraiu de alguns problemas boa parte da viagem. Sou grata por seu esforço.
            Ainda acompanhada por ele, saímos do avião e entramos juntos no Aeroporto Santos Dumont para pegar as nossas malas na esteira. O lugar estava simplesmente lotado, o que já era de se esperar, mas puts! Uma correria danada, tics e plins por todos os lados, voos sendo anunciados... Eu precisava de silêncio e espaço para me acalmar e então enviar uma mensagem para uma pessoa.
          Já afastados da área de embarque fiquei próxima das bancas de revistas, DVD e CDs. Eu já podia sentir o silêncio e o ar-condicionado lá dentro. Avisei ao Tadeu que eu precisava fazer uma ligação para que viessem me encontrar e educadamente ele perguntou:
           — Quer que eu vá com você?
           — Não precisa, imagina. — Pensando mais um pouco acrescentei — Obrigada. Para o que seria só um colega de poltrona, você fez muito por mim nessa viagem. Acredite.
           Tadeu maneou a cabeça sem jeito. Eu solto um riso baixo relembrando nossas conversas.
           — Estou te devendo uma! — Se não fosse ele minha viagem teria sido mais chorosa do que bebê sem chupeta.
           — Que nada! Se posso ajudar uma pessoa, por que não fazer isso? Espero que fique bem e que se estabeleça logo aqui no Rio. — Aproximando-se, Tadeu me deu um abraço daqueles com ar de conforto e eu tentei retribuir na mesma intensidade. Acho que nós dois estamos precisando. — Aproveite para conhecer a cidade. Se precisar de um guia...
             Tadeu também deixou os pais e o irmão mais velho para trás. Lá na Bahia para ser mais clara. Longe pra porra, como diz ele, e nem por isso estava choramingando feito eu. Mas no caso dele, parece que há mais vantagem em estar longe do que perto.
             — Obrigada mesmo. — agradeço.

Todas as coisas que (não) deveriam ter acontecidoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora