Contos do De La Cruz 18+

Um Lugar Chamado Dunfermline

LEMBRO-ME COMO se fosse ontem...

Ah, minha linda Escócia! Bons tempos que não voltam mais. Saudade dos amigos, da escola, da vizinhança e de toda Dunfermline, minha cidade natal. Lembranças de alguém que já viveu tempo suficiente para saber que o passado pareça mais feliz do que o presente, mesmo sem os luxos que hoje tenho, já que eu tinha tudo o que precisava.

E daí que, aos 30 anos, já sou um rockeiro que muitos não conseguiram ser aos 60? E daí que tenho várias mansões ao redor do mundo? E daí que, apesar da grana, não pago por praticamente nada, já que o showbiz é infestado de bajuladores e puxa-sacos que ficam alegres só por terem vendido (dado) seus produtos para Dan Agnew?
Dan Agnew, primeiro no ranking da Billboard e último no ranking da felicidade. Irônico, não? Mas você entenderá minha frustração.

Desde os 12 anos eu toco guitarra. Meu pai era um saudosista de Woodstock, sempre me incentivou, e embora nunca tenha sido um especialista no instrumento, sempre fui dedicado, e Deus me deu uma voz rouca que combinava com o som que meu pai e eu apreciávamos. Não demorou muito para eu me tornar o frontman da banda da escola, inicialmente animando os bailes do ginásio e, tempos depois, também os barzinhos da cidade.

Com 15 anos eu tinha uma namorada, Laura, e alguns rolos também, qualquer garoto com um pouco de fama, mesmo branquelo, com espinhas, magro como um palito e cabelo ruim como eu se torna um Don Juan, mas Laura sempre foi a única que amei. Era da minha idade, pele branquinha e cabelo ruivo que mostrava sua origem irlandesa, e acredito que ela gostava mesmo de mim, pois nos conhecíamos desde o primário.
Confesso que era imaturo, sempre fui, e, hoje, por imaginar que ela sabia das minhas puladas de cerca, tenho certeza de que ela não apenas gostava de mim, mas me amava.

Por razões óbvias nosso namoro não foi adiante, você deve imaginar. Em 2003, após a banda abrir um show para o Paul McCartney, o empresário gostou do nosso som, mas como na época apenas eu era maior de idade, só pode me contratar.
Tive de deixar meus amigos, namorada, meu pai e meus parceiros em Dunfermline e mudar para Londres. Ainda hoje me pergunto se valeu a pena.
Laura chorou muito, não queria me deixar e também não queria deixar a Escócia. Era muito apegada à família, sobretudo aos irmãos Victoria, de 8 anos, e Edward, recém-nascido. No final nos separamos, com dor no coração, mas prometi voltar a Dunfermline quando pudesse. Só vi Laura dez anos depois.

Você deve estar se perguntando porque só Laura me fazia feliz, se eu vivia rodeado de beldades, certo? Bem, minha carreira você conhece, desnecessário dizer. Sabe das turnês que fiz nestes dez anos e, sinceramente, sem modéstia, comi mais garotas do que vendi discos. Mas, a medida que você vai envelhecendo e se tornando mais 'sábio', vai vendo que a melhor foda que você dá não é nem de longe tão boa quanto fazer amor com a mulher que quer você pelo que você é e não pelo que você tem, a mulher que você ama. Parece brega falar isto, ainda mais para um rockeiro, mas não posso mentir. Principalmente para mim mesmo.

Durante esta década eu falava com Laura quase sempre, seja por email ou por redes sociais, no curto tempo livre que tínhamos. E para meu azar nenhuma turnê passou pela minha cidade. Nem mesmo por Glasgow. Em 2006 me mudei para Manhattam, trouxe meu pai, já aposentado, para morar comigo, mas mesmo assim não consegui uma pausa para ir a Dunfermline ajudá-lo com a mudança e rever minha amada. Cantor não tem vida fácil, ao contrário do que muitos pensam!

Mas 2014 chegou, e, após intensas discussões, a gravadora aceitou minha ideia de produzir o DVD 'Dan Agnew - Long Road Home' em Dunfermline. Claro, paguei metade dos custos, mas dinheiro não é nada perto da emoção de poder rever minha Laura.
Tive pouco tempo livre para falar com ela, mas mandei um email confirmando o dia e horário e um cartão VIP via FedEx, pois a queria ver antes e depois do show. E quem sabe trazê-la comigo para os EUA.