Capítulo 04- Nos braços das Trevas

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Senti uma presença em minhas costas e vi a mulher de rosto pintado se ajoelhar ao meu lado e agarrar o meu pulso. Aquilo me trouxe bruscamente de volta ao momento.

A igreja escureceu como se um eclipse tivesse pairando sob nós. Permaneci olhando para a mão dela agarrada em meu pulso. Eu não conseguia me mexer e não era apenas modo de dizer. Eu realmente não conseguia.

— Você está perdido, mas este não é o seu caminho.

Permaneci olhando seus dedos fechados em mim. Ela também tinha números grafados no pulso. Assim como aqueles que apareceram em mim quando sai da mansão.

— Eu vejo as linhas se entrelaçando. Vejo os caminhos se cruzando.

— Você é uma bruxa...?— sussurrei.

Pior.

Kahina Nefertiti era uma Necromante.

Ela me olhou fixamente com os olhos verde-fluorescentes brilhando. Tudo ao redor desapareceu como névoa. Eu não sabia se estava alucinando, mas parecia real.

"Me encontre nos fundos da propriedade Borniet. Eu tenho as respostas que você precisa e você tem a influência que eu preciso".

— Influência?

Isso foi tudo o que consegui perguntar diante da situação bizarra. Afinal, que tipo de influência um jovem de 17 anos, sem propriedades e praticamente sem família, poderia ter?

Bom, quando não se tem muito a perder, se tem mais coragem para ariscar.

Eu fui. Eu apenas fui. Sem saber o porquê nem o que esperar.

Meu objetivo era não ser visto por ninguém da Mansão Borniet — definitivamente tinha algo que me atraia para aquele lugar—, o que de certa forma, era uma invasão de propriedade.

Eu não pensei nisso. Eu apenas queria respostas.

Mas tudo o que encontrei lá, foram mais perguntas.

Assim que cheguei no casebre onde os escravos da mansão se reuniam, nos fundos da propriedade, tive a visão mais bonita e igualmente horrenda da minha vida.

Me abaixei atrás do amontoado de caixotes e mantive os olhos na cena, num misto de encanto e pavor. As escravas estavam nuas em volta de uma fogueira, assim como na festa dentro da mansão. Mas parecia ter algo mais poderoso ali, mais genuíno. Talvez os de dentro da mansão tivessem apenas reproduzido o que viam ao redor dela, nas noites nebulosas como aquela.

Mas o que era aquilo, afinal? Algum tipo de ritual africano? Um teatro?... Bruxaria?

Eu não sabia o que era, mas sabia que era lindo.

As mulheres nuas dançavam e entoavam palavras desconhecidas, cada vez mais alto. O fogo aumentava progressivamente, ao ponto deu achar que o casebre inteiro seria consumido pelas chamas.

Vi um homem branco entre as mulheres. Sua cabeça estava tapada com uma espécie de touca branca que cobria-lhe todo o rosto, mas não abafava seus gritos de súplica. Pela batina e a enorme cruz no pescoço, não tive dúvidas de que era um jovem padre.

Eu devia ir embora. Sim, eu devia.

Mas quando vi a mesma mulher que entrou na igreja abrir espaço entre as outras e cravar um enorme espeto no coração do homem, pouco antes de descartá-lo como um pedaço de carne na fogueira... Eu acabei me entregando.

Cambaleei para trás e derrubei algumas caixas. Meus olhos encontraram os da mulher. Rastejei para trás, assustado, quando ela veio em minha direção.

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⏰ Last updated: Apr 07 ⏰

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