II
Micanor estava com uma terrível crise de tosse. Os médicos da corte já haviam tentado de tudo para aplacar a violência da gripe, mas nada surtia efeito. A voz do rei saía rouca, de tão machucada que estava sua garganta, e a rainha não parecia melhor.
– Micanor... – murmurou ela. – Eu acho que não vou resistir muito mais a essa gripe – e espirrou.
O rei coçou a barba, ainda muito cansado de tanto tossir.
– Ora, minha cara Adélia – espirrou –, então acho que seremos dois.
E, de fato, não duraram muito.
Três dias depois, quando Liarlinde e Guer repetiam seu ritual de flutuar no lago, um silencioso Empírico apareceu entre as sombras da gruta. Ele encostou-se à parede da caverna e admirou os dois jovens por algum tempo. Formara um belo casal e estava orgulhoso disso. Infelizmente, agora só os deuses sabiam que rumo tomaria aquela história. Quando Liarlinde notou a presença do conselheiro, o velho tinha lágrimas nos olhos.
– O que houve, Empírico? – perguntou a princesa, ainda rindo de uma peça que pregara em Guer.
O homem não conseguiu transformar a dor em palavras. Correu para dentro d'água, encharcando sua túnica branca até a cintura, e envolveu a menina em um forte abraço. Liarlinde congelou sob seus braços finos.
– Você está perdendo a razão? Quem pensa que é para me tratar com tanta intimidade? Vou dizer pro meu pai te jogar em um campo de concentração!
O velho soltou um suspiro e abanou a cabeça em negativa.
– Seu pai está morto! – falou de repente. – Sua mãe também!
E correu para longe, deixando as duas e assustadas crianças a sós.
Breve comentário sobre o silêncio constrangedor
Conhecido dos humanos terráqueos, e também dos marcianos, é aquele em que você sabe que tem muito a dizer, mas não pode. Ou em que não tem nada a dizer, mas sabe que precisa se manifestar.
Esse foi o sentimento do jovem Guer.
Liarlinde parecia petrificada. Seus lindos olhos verdes estavam muito abertos, ela quase não respirava. De repente, lágrimas raivosas começaram a escorrer pelas bochechas da princesa, rosadas de cólera. Tudo em um silêncio profundo, fúnebre. O famoso silêncio constrangedor.
Guer acompanhava o sofrimento da amiga e, mais uma vez, não sabia o que fazer. Não preparavam os homens para esse tipo de situação no exército. Em uma decisão não muito sábia, o jovem falou:
– Ah, Lia, pelo menos agora você vai ser rainha.
Essa colocação estupidamente insensível serviu ao menos para acabar com o silêncio. Liarlinde soltou um grito gutural e correu para fora do lago. Recolheu as roupas de qualquer jeito e correu até sumir de vista. Guer não a seguiu. Apenas vestiu suas roupas, recolheu uma fitinha de cabelo vermelha que a menina deixara para trás e voltou para casa.
O enterro dos Arcandoff seguiu as milenares tradições marcianas. Os corpos foram limpos e cobertos com penas de zebra da montanha, animais muito raros somente encontrados na Planície Utopia. Segundo Empírico, as penas (três, entre as orelhas) eram sensores usados para detectar a aproximação de predadores. Ou seja, a cada governante humano morto, muitas e muitas zebras também partiam desta para outra melhor.
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Soberana - a ascensão da rainha de Marte
Fantasy"O caminho de uma verdadeira líder passa pelo coração e pela espada" Quando os reis de Arcádia morrem por uma terrível doença e o reino é invadido pelas raças menores, nada resta à jovem princesa Liarlinde Arcandoff a não ser fugir para o deserto ma...