A mais louca viagem de van

23 5 2
                                    


# Malásia/ Tailândia, 2006

– Deal?

– hsfsjaiagsns – não entendia nada do que ela falava com aquele sorriso permanente que tanto podia significar simpatia como sarcasmo. Entregou-nos um papel amarelo rasgado de um caderno comum com "" escrito à mão. Mostrou também as duas mãos, uma aberta e outra com o dedão levantado – chxwzzzz!

– Six? Ok.

Saímos da pequena loja que vendia jornais, revistas, vasos sanitários, radinhos de pilha e bolachas variadas com o nosso ticket de viagem, um pedaço de papel rasgado, de , Noroeste da Malásia, até Koh Lanta, no sul da Tailândia.

– Imagina, assim é mais fácil – sempre fui mais otimista do que o Miguel. Ok... e do que a maioria das pessoas . Além disso, confiava – e ainda confio – plenamente no Rough Guide (sério, sempre que viajo de mochila para qualquer lugar, tem dois guias que eu utilizo e confio: O e o . Em outro post conto mais histórias sobre eles e o porquê dessa confiança toda). E, ainda, a volta que teríamos que dar para ir de avião era insana: Penang para Kuala Lumpur de ônibus, Kuala Lumpur para Bangcok de avião, de Bangkok para Koh Lanta sabe-se lá como. Não fazia sentido. De van era melhor e era a indicação do Rough Guide. Estava confiante no nosso pedaço de papel.

Voltamos para o hotel, ansiosos pela próxima etapa da nossa viagem de mochila pelo sudeste asiático, arrumamos as coisas e fomos jantar.

– Eles vêm mesmo nos buscar no hotel?

– Vêm sim. Foi o que ficou combinado, não foi?

– Foi. Acho. Mas onde isso ficou escrito? – Não estava escrito em lugar nenhum.

– Rough Guide... – tinha que dá certo.

6 da manhã em ponto a van apareceu na porta do nosso hotel. Aqui, vale dizer, que nosso hotel era na verdade uma pousadinha numa rua sem saída distante do centro e pouco conhecida. Ainda assim, lá estava a van. Com dois filipinos que não falavam inglês e gritavam pela janela "Koh lanta? Koh lanta?". Tinha que ser a nossa van. Mostramos o pedaço de papel, eles guardaram no bolso e nos empurraram para dentro com as nossas mochilas no colo. Estávamos sozinhos por isso meio que nos esparramamos no banco e colocamos a mochila ao lado. Mesmo sem entender o que eles falavam, percebemos que eles estavam nos dando uma bronca: colocamos a mochila de volta no colo.

A van era confortável, eles tinham sido pontuais, os filipinos não cheiravam mal e não entendiam o que a gente falava: a viagem não seria ruim afinal, certo? Errado! Tão errado....

Nas duas horas seguintes, andamos por todas as ruas de pegando passageiros com diferentes formatos e cores de papeis rasgados e carregando e descarregando caixas em ruas obscuras para personagens que pareciam ter saído de um filme de máfia coreana. Quando pegamos a estrada, éramos 10 passageiros assustados, e suas bagagens, numa van para 9 pessoas. Ok. Provavelmente não faríamos a viagem mais confortável do mundo mas, na lojinha, o papel datilografado preso na parede dizia que o percurso duraria entre 3 a 4 horas. Já tinham passado 2. Por isso, não seria tão ruim assim, certo? Tão errado...

Talvez por causa do balançar da estrada ou da paisagem verde e do som de música exótica no rádio, fomos ficando mais tranquilos. Tudo daria certo, tinha que dar, o Rough Guide sempre tem raz...

– So... is it your first time in Surat Thani?

– Surat Thani? But I'm going to Krabi. Puket. Koh Phi Phi. Koh Lanta.... What's happening??!!!

Ninguém sabia. Estavam e estávamos na van certa? E se não estavam/ estávamos, para onde estávamos todos indo? Dos 10 passageiros, ninguém, a não ser aqueles que viajavam juntos, ia para o mesmo lugar. E os destinos não eram próximos nem estavam num mesmo percurso lógico, como um senhor alemão fez questão de nos mostrar no celular várias vezes. Tentamos falar com os filipinos, mas ninguém na van falava alguma língua que eles pudessem compreender. Ou seja, filipino!

Histórias de ViagemOnde as histórias ganham vida. Descobre agora