Laboratório de escrita

O abismo

   Porquê, não olhar para o abismo? Porque, normalmente, quem olha para ele tem vontade de cair.

    Por algum motivo os suicidas dão voltas e voltas ao sítio onde vão dar esse "salto de fé" de quem já não tem fé de que as coisas vão dar certo. Para irem lentamente aceitando essa realidade, para poderem explorar essa segunda hipótese, assim como exploraram a vida e perceberam que iriam falhar em controlá-la. Porque a sensação de controlo é a única coisa que prende o ser humano à vida.

    Não são as boas memórias, pois essas não são nada mais do que sussurros de felicidade nas orelhas de um surdo. Não é o amor, pois este com a mesma força com que floresce, facilmente morre nas mãos de um jardineiro inexperiente. Nem se trata de uma questão de vontade, porque nenhum de nós escolheu estar aqui em primeiro lugar.

    E algum desse controlo que podemos ter é sobre o nosso fim. Podemos antecipá-lo da maneira que quisermos. Porque, lá no fundo, o ser humano é fraco e, perante a adversidade, escolhe sempre o caminho mais fácil.

    E quando esse único vínculo que nos une à vida se parte, o abismo abre-se perante nós como uma bóia salva-vidas.

   A outra saída seria tomar novamente controlo da nossa vida, mas o nosso psicológico é como um maratonista que desiste a meio da corrida, mesmo tendo consciência de que a meta não se encontra muito longe. Porque lá no fundo o ser humano é fraco, pois não percebe a sua força. E tal como um aluno que nunca foi ensinado, vai achar que é inútil e que nunca conseguirá aprender e desiste.

    No mundo, existem alunos que facilmente aprendem por si mesmos e há outros que necessitam de um suporte. Necessitam de alguém que os ajude a perceber a sua força. Mas nem todos podemos ter esse suporte e enfrentamos a vida apenas com as nossas mãos, esperando arranjar alguma experiência que nos ajude a manter o controlo.

    Que ajude a afastar-nos do abismo.

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   Este texto devia ir para o "Mudança de Perspectiva"? Não. Ainda não está preparado para isso. Um dia talvez.

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