PRÓLOGO

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A passagem do asteroide gigante XG67 pela Terra em janeiro de 2005 quase não foi noticiada pelos meios de comunicação. Algum escândalo político qualquer voltou todas as atenções das câmeras e microfones para o congresso nacional, mas os cientistas foram unânimes: quem tivesse a sorte de ter um telescópio, poderia enxergar o corpo espacial de 2 quilômetros de diâmetro passar raspando pela atmosfera.

Helena Ventura não se importava com asteroides, muito menos com escândalos políticos; a única coisa que queria era se livrar do desconforto que sentia há oito meses. A verdade é que ninguém havia lhe dito que gerar uma criança seria tão difícil; suas irmãs e sua mãe romantizavam o "momento mais especial da vida de uma mulher" e os livros de maternidade não chegavam nem perto de prepara-la para o desafio – deitada eternamente em berço esplêndido, ela e sua gestação de risco, a única distração que não fazia com que a Sra. Ventura quisesse vomitar a bile para fora era observar o céu e acariciar Tonico, o cachorro da família, um velho e cego poodle amarelado.

Fernando Ventura estava atrasado mais uma vez; era comum agora que ele passasse as noites no banco, principalmente quando a chegada do bebê estava tão próxima – Helena só não saberia dizer se ele queria o dinheiro extra ou apenas passar o máximo de tempo longe dela e dos seus hormônios.

Antes da gravidez, Helena era uma mulher jovem, ativa e muito bonita, com o corpo moldado pelas aulas de ioga e longas caminhadas todas as tardes. Tinha cabelos castanhos brilhosos e o rosto comprido e simétrico. Agora, porém, ela se sentia como um balão prestes a explodir, os pés inchados, os braços três vezes o seu tamanho normal e o cabelo caindo em tufos todos os dias no ralo do box. Olhava-se no espelho e sentia que havia envelhecido 10 anos em alguns meses... O seu sonho sempre fora ser mãe, mas ali, jogada no sofá da sala, produzindo gases e suor, ela se perguntava se valia mesmo a pena.

"Que pensamento mais egoísta de uma futura mãe", ela se policiou, no exato momento em que algo riscou o céu.

Helena se ajeitou desajeitadamente, acordando Tonico, que resmungou. Ela colocou os óculos de grau e, quando começou a pensar que o brilho não havia passado de fruto da sua imaginação, um segundo rastro cortou a atmosfera.

Pai! — Helena gritou, levantando-se e jogando Tonico no chão, que saiu trotando com certa mágoa. — Pai, vem ver!

José Moreira apareceu na porta da sala instantes depois, segurando um pano de prato e respirando como se tivesse corrido uma pequena maratona. Quando viu que a sua filha não estava jogada no chão em cima de uma poça de sangue, suspirou aliviado – o senhor de 70 anos, corpo roliço e cabelos grisalhos preocupava-se com a gravidez de risco da caçula, e, mais ainda, com a sua teimosia em querer caminhar pela casa de tempos em tempos.

José estava prestes a dar uma bronca em Helena pelo susto, quando viu diversos rastros de clarão no céu escuro, iluminando todo o horizonte pela janela da gelada sala de estar.

— O que está acontecendo? — ele perguntou de maneira curiosa, aproximando-se da filha.

Helena não teve tempo de responder, sentindo o chão tremer sob os seus pés – ela se agarrou ao pai, que a segurou com firmeza. Instantes depois, os dois observaram passivamente enquanto um dos riscos brilhosos se aproximou zunindo e atingiu o solo, abrindo um buraco no jardim da frente da chácara dos Moreira.

Fumaça saiu da cratera e o céu escureceu de vez.

— Vamos lá ver o que é! — Helena exclamou, desvencilhando-se do pai e atravessando a porta de entrada enquanto segurava a barriga.

— Helena! — ele exclamou, indo atrás dela. — Pode ser perigoso!

Mas Helena o ignorou, e os dois só pararam quando alcançaram o buraco – Helena fez menção de colocar a cabeça dentro da fumaça, mas o Sr. Moreira conseguiu evitar que ela assim o fizesse.

Zodíaco - O Signo PerdidoWhere stories live. Discover now