Capítulo 12 - Lembra de Mim (Ivan Lins)

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Tudo depende de como vemos as coisas e não como elas são.

Dizem por aí que você não sabe o quanto é forte, até você precisar ser forte. Eu admito que as palavras de Lídia calaram fundo brigas internas e deram vazão e abertura a outras. Eu sinto que vou sufocar com tanto sentimento preso dentro de mim e eu já não tenho mais certeza de nada na minha vida.

Mas eu preciso tentar. De alguma forma. Mesmo que, lá no fundo, eu saiba que está fadado ao fracasso.

Pode ser que não esteja.

Pode ser que, dado ao último grande relacionamento que tive, eu esteja projetando.

Pode ser muitas coisas e eu que lute para sair desse mar de dúvidas.

Por mais que eu entenda as palavras de Lídia, que eu saiba e agradeça sua preocupação, Nello é minha felicidade possível. É a que posso ter nesse momento. Nosso acordo funciona para mim, mesmo sendo disfuncional.

Mas chega! Eu tenho que dar um basta nisso. Eu levantei do caixão mais vezes do que qualquer um possa imaginar. Mas não há fotos, vídeos ou qualquer outro registro porque o papel de vítima é algo que jamais quis desempenhar. Esse papel não me pertence. Não me cabe. Sempre estive mais preocupada em me reerguer do que em fazer alguém entender o que eu passava.

Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é.

Essa sou eu.

Rapidamente me recomponho. No espelho desse banheiro deixo as palavras de Lídia e a fraqueza momentânea que fez com que os muros que tanto batalhei para erguer, apresentasse rachaduras. Eu tenho um noivado para comemorar.


***


Minha conversa com Iolanda não será nada fácil. Não depois do que eu ouvi aqui. É real o que ouvi minha filha dizer? Até que ponto eu baguncei tanto minha vida, a ponto de perder o controle, que minhas filhas decidem o que é melhor para mim? O que há de errado comigo?

– Pai. Pai, me escuta. – Ela tenta me parar, segurando meu braço. Bodanski se despede e volta para festa. Resta agora eu e minha filha, alguém que não reconheço.

– Agora não, Goretti. Agora não. – Solto o braço. – Eu não sei onde você estava com a cabeça, mas chega. Esse não é o lugar nem o momento. A hora disso passou. Suas explicações vão ficar para outra hora. Não posso ser irresponsável, eu sou o adulto mais velho aqui.

– Me escuta, pai, por favor! – Ela implora e, por mais que meu coração de pai sinta sinceridade em suas palavras, essas e as que ouvi mais cedo, não é a hora de ceder.

– Não, me escute você e me escute com atenção, porque eu não vou repetir. – Mal espero seu aval. – Nós ainda vamos conversar sobre isso, eu ainda quero entender como seu ódio pela Hélia te levou a fazer isso. Suas ações tiveram consequências, Goretti, e consequências desastrosas, que podiam ter acabado com a vida de uma pessoa. Mas aqui não é hora de falar sobre isso. E chega, chega de se intrometer. Essa é minha vida, é meu caminho, e se tenho que ver a mulher por quem meu coração ainda bate, se casar e declarar amor por outro, é algo pelo qual tenho que passar. Antes mesmo de vocês fazerem o que fizeram, eu já tinha tomado uma decisão. Eu já tinha decidido deixá-la ir, sabe por quê? – Ela negou, lágrimas escorrendo por seus olhos. – Porque não se destrói quem ama e era isso que eu estava fazendo com ela. Nosso relacionamento não estava bom, não nos fazia bem. Isso não exime o que fez e você vai consertar isso sozinha. Antes de tomar essa decisão, você devia ter vindo até mim. Como seus irmãos fizeram. – Puxei minha filha chorosa para meus braços. – Eu te amo, Goretti, mas eu luto pelas minhas batalhas. Eu vou lidar com meu coração partido, consciente de que a culpa maior por ele estar assim é minha. Eu estou colhendo os frutos dos meus atos. Eu a amo e sei que vou amá-la para o resto da minha vida. Mesmo que doa saber que a felicidade dela não está ao meu lado. Agora vamos.

Tempos Modernos - A VoltaWhere stories live. Discover now