CAPITULO 2 - ANTES DELE APARECER

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                                                            ANTES DELE APARECER

Um, dois, três, quatro. Ordens médicas! Não sou amarga! Sou salgada! Sou solitária. Sou uma mulher irada! Uma mulher com raiva do mundo. Uma mulher com raiva dos homens, querendo matar a todos! Monstros! Canalhas! Shakespeare disse: "Temeis menos as tempestades do que a ira de uma mulher". Até que estou calma, eu deveria aplicar a Lei do Talião, olho por olho, chifre por chifre, mas eu sou uma  mulher de respeito.

Um, dois, três, quatro! Ontem pensei em Luís Alberto, meu ex amor. Quando nos separamos ele "estranhou" a minha decisão de ficar só. O filho da puta me botou três chifres! Mas eu acho isso tão óbvio partindo de um homem. Os homens estranham tudo que vem de uma mulher. " Querida Maria Isabel, eu não entendo você! " Ora, francamente, você nunca me entende! Durante dez anos você nunca me entendeu. Por que iria me entender agora? Ora, me poupe Luis Alberto!

Os homens são insensíveis! Não possuem o menor respeito pela mulher. Os homens são decepcionantes. Tiro desta lista o meu tio Juliano. Que homem lindo, bonito por dentro e por fora. Como minha tia escolhera tão bem? De fato, ela era merecedora. Era igualmente linda, parecia uma atriz de cinema. Mas eu nunca fui muito bonita. Demorei para ter autoestima.

Quando nos conhecemos o Luís Alberto era muito engraçado. Tinha bastante humor. Ele ao me ver fez um fiu-fiu tão ridículo que eu acabei achando graça. Achei originalíssimo. Um fiu-fiu de hipopótamo! Aquele fabricante de filtros de água tentando imitar um lobo urbano, ardente e selvagem. Totalmente ridículo.

Totalmente ridículo! Já possuía sim, uma ligeira barriga. Era ridícula. Como ele! Ora, seriam homens se não fossem ridículos? Tenho certeza que Fernando Pessoa aprovaria a minha licença poética. Alguma mulher ainda discorda que os homens são ridículos? Talvez algumas, com a cabeça ainda machista. Não? Aprovação geral das minhas companheiras? Estou orgulhosa. Estamos mudando, avançando.

Certo dia assim meio chuvoso e sem graça, igual a ele, o Luís Alberto partiu numa nave espacial para a Argentina, junto com a Ana Paula, que se dizia uma das minhas melhores amigas. Coisas do Mercosul!

Fiquei felicíssima. Já não aguentava mais a possibilidade de um novo chifre. Fiquei com meu filho Guilherme, junto com meu Tio Juliano, os dois homens da minha vida. Luís Alberto ficaria como uma lição amarga e engraçada da vida. Como me deixei enganar tanto. Acho que na escola poderíamos aprender também sobre pessoas. Aprendemos tantas coisas sem utilidade futura.

Na escola eu era a legalzinha! Aquela que as outras meninas imaginam pela qual o namorado delas jamais irá se interessar. A referência é manjada. Não quero ser a musa da baixa autoestima. Sou a personagem principal, então quero um romance¹ A legalzinha é aquela conhecida coadjuvante em todas as histórias de amor. O dramático é que ela pode estar assinando a sua própria sentença de coadjuvante eterna e poderá de fato terminar em com um futuro infeliz e sozinha. Sina ou maldição? Secretamente eu vinha alimentando a vontade de mandar para o inferno a legalzinha. Cansei! Achava-me esperta quando conheci a tranqueira do Luís Alberto. Melhor pensar na escola! Opção mais saudável.

Eu não era feia. Eu não era folgada. Eu não era antipática. Eu era sem graça! Eu era a flor da família para os meus pais, para os meus tios. Para o resto do mundo eu era uma menina comum. Tinha qualidades intelectuais. Gostava muito de ler, minhas notas eram boas em física, química e matemática, como em português, história e geografia. Inglês, meus pais pagavam cursos particulares e a meninas me procuravam para traduzir músicas. Não havia a facilidade tecnológica de hoje. Máquinas fotográficas também eram raras entre a classe pobre, então nas festinhas escolares eu me destacava, trazendo a máquina fotográfica. Mas nada era suficiente para atrair um olhar jovem de um adolescente interessado em mim.

Um dia, um rapaz alto para os seus quinze anos, mostrou se interessado em mim. Quinze minutos depois ele falou que estava sem graça de pedira a máquina fotográfica emprestada. Os homens na minha vida sempre seriam assim, pequenos interesseiros e também grandes interesseiros.

Meu Tio com o tempo adquirira a farmácia em que ele trabalhava e depois mais uma. Eu ficava admirada com o Tio Juliano. Bonito, inteligente, próspero e honesto! Precisava ver a decepção do meu então noivo, o Hipopótamo, quando soube que eu tinha mais dois irmãos pequenos, adotivos e não era nem herdeira das farmácias. Era um teste para ver a reação dele. Tem coisas e sinais na vida que a mulher ignora por uma conveniência e necessidade social. Eu estava meio apaixonada e já com medo de ficar solteira. Os tempos eram um pouco mais rígidos. As mulheres casavam-se ainda mais cedo. O filho da puta era interesseiro. Nenhum homem era perfeito como o tio Juliano.

Depois de quase cinco anos casada com o hipopótamo Luis Alberto tomei ojeriza por homens. Passava a ver em todos eles o meu marido. Chato, muito grosso e tremendamente mal-educado. O homem do fiu-fiu engraçado se tornou uma mala. Ficava cantando dentro de casa com uma voz horrível. Não participava em nada, não colaborava para lavar uma louça. No começo eu pedia, conversava, falava da importância da ajuda dele. Deitava no sofá, ia ver um noticiário, um jogo e tomar a sua geladinha. Homem quando dá para ser canalha, a sala, o prédio, o mundo inteiro é pouco para ele. Folgado! Folgado! Folgado.

Amor, dá para você pegar o salame na geladeira? Fui levando a vida de casada meio ao Deus dará, porque nunca fui uma mulher muito intensa. A falta de sexo com ele não me incomodava mais. Nem por isso iria tolerar chifre. Lia muito mesmo e as leituras me compensavam. Eu tinha receio de magoar meus pais,na verdade meus tios que me criaram desde os nove anos e me aconselharam tanto a repensar este casamento. Principalmente quando soube que ele não era dono da Fábrica de Filtros de água e sim representante de uma loja!

Eu era mesmo uma mulher frustrada. Tinha me transformado numa mulher mãe , com vocação apenas para a maternidade e que me esforçava para não desapontar o meu filho com o meu vazio, a minha insatisfação pessoal e sexual. Sim a falta de afeto e atenção, estava me levando a condição de bicho, prestes a ceder aos instintos mais baixos. Calma, este não é um livro pornográfico! Mas não tenta me podar. Eu não suporto mais ser podada!

Quero ficar sozinha! Também não quero muita visita, não quero bicho. Bicho é falso. São como homens. Uma semana com outra pessoa e já não balançam mais o rabo direito para a gente! Mentira minha. Amo os bichos, mas o medo de se apegar foi ficando muito forte em mim. Tinha tendência a gostar mais de bichos do que de pessoas. Só a minha amiga pornográfica é que me visita de ves em quando. Fala suas bobagens sexuais, mas eu nem ligo mais. Estou morta para o amor, para o sexo e para a felicidade.

A vontade de ficar sozinha foi se avolumando dentro de mim. Mas pudera, qual a mulher que consegue raciocinar em cima de tantos chifres. Eu me sentia olhada, debochada, humilhada. A sensação era quando eu entrava em um lugar, as pessoas cochichavam. A chifruda chegou. A cornuda está na área! Em alguns casos pareciam que as pessoas saboreavam o fato. Eu vinha da classe média, era um pouco tímida, o que passava para alguns que eu fosse uma pessoa metida. Na verdade, eu era reservada.

Impressionante como a traição devasta uma mulher. Talvez não todas, mas aquelas que ainda acreditam no amor, no sonho de uma felicidade. Vi o meu mundo descer mundo abaixo. Os dois últimos chifres doeram menos, já eram parte de um processo. O primeiro jogou um caminhão de cinzas quentes na minha esperança de salvar meu casamento. Eu adiei a maternidade por que havia lido que tínhamos que esperar um filho completar sete anos para encomendar o segundo. Ainda bem que li isso. Evitei ter mais de um filho senão estaria com dois filhos e divorciada. Mas me apavora a ideia de que ouço a qual quem tem filho não tem nenhum. Meu filho Guilherme é tudo para mim. Pensar que eu não gostava da idiea de ser mãe. Associava a ideia de mãe a um ser sofrido.

                                                              Fim do capítulo 02

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⏰ Last updated: Aug 15, 2018 ⏰

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A MULHER QUE DESEJAVA FICAR SÓ!Where stories live. Discover now