Capítulo 3

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— Delegado Siqueira!! Delegado Siqueira!!

— O que é, Nelito?

O dia estava particularmente quente e o delegado já havia se instalado, literalmente, na frente do ventilador de sua sala na esperança de se refrescar um pouco. Mas o vento proveniente do equipamento parecia tão quente ou ainda mais do que o ar parado ao redor.

No auge de seus cinquenta e poucos anos, Tenório Siqueira sentia o peso da idade, sobretudo, os quilos a mais que havia acumulado durante sua carreira na polícia. Há trinta era o delegado em Aurora do Norte e resumira a maior parte de sua carreira em solucionar brigas entre vizinhos, casais e alguns ladrões de galinhas. Nada muito grande ou muito excitante, assim como a vida na pacata cidadezinha que aprendera a amar e a chamar de lar. Recém-casado, viu a família aumentar em meio àquelas pessoas; também viu outras que aumentaram e algumas que diminuíram, gente que chegou e os que se foram em busca de novas oportunidades nas cidades maiores. Durante muito tempo acalentara o sonho de ser promovido a delegado regional e se instalar em Ribeirão Preto, a maior cidade da região, porém, a politicagem era tamanha que seu estômago não suportou. Preferia noites de sono tranquilas do que entrar naquele jogo para o qual não havia volta. E ali estava ele, suando como um porco, passando o lenço na testa pela milésima vez no dia enquanto observava o guarda, que ofegava com as mãos nos joelhos.

— Fale  logo, homem de Deus!

— O Massatomi...

— Vai me dizer que o Dr. Cezar e o Massatomi andaram brigando outra vez por causa da cerca? – Siqueira estava vermelho como um pimentão, pelo calor e pela raiva ao imaginar que teria de apartar mais uma briga entre os antigos vizinhos. — Mas que Diabos! Esses dois só ficam me arrumando para a cabeça!

— Não, delegado. Não é a cerca... – informou o rapaz, parecendo se recompor aos poucos.

Siqueira parou de passar as mãos pelos cabelos grisalhos já ralos e fixou seus olhos no rapaz que se arregalaram a medida em que ele prosseguia em seu relato. Levantou-se e, pegando o chapéu e o paletó que jaziam sobre o cabide atrás da porta, passou pelo jovem guarda a passos rápidos em direção à rua.

— Cadê o Pimentel? – indagou de mau-humor, entrando na viatura enquanto Nelito o observava do lado de fora, dando de ombros. — Ahhh...deixa prá lá. Eu pego ele no caminho. Pede para o pessoal da pedreira o barco emprestado! – gritou Siqueira, manobrando o carro com agilidade.

Nelito apenas concordou com o gesto de cabeça, observando o chefe que saía a toda pelas ruas da cidade atraindo a atenção de quem estava no comércio ali perto. Antes que seu Zé do Empório pudesse perguntar qualquer coisa, o rapaz voou para dentro da delegacia. Após contatar o dono da pedreira que ficava em uma das margens do Lago da Moça, o guarda fez uma ligação que certamente desagradaria o chefe, porém, assim como o delegado, o rapaz tinha consciência de que não poderia deixá-la de fora daquilo.

— Alô? – ouviu do outro lado da linha.

— Dona Violeta? É Nelito. – Um silêncio se fez do outro lado da linha, rompido apenas pela respiração da mulher. — Preciso falar com a... com a Tenente Venturini.

Frustrada. Com raiva. Um sentimento de impotência tomava conta de Cecília e que somente havia piorado com a tempestade que assolara Aurora do Norte por três dias. Enquanto tomava seu café alheia ao falatório entre dona Violeta e os dois outros hóspedes, a tenente observava os raios de sol que incidiam sobre a parede oposta e que prenunciavam o primeiro dia seco. Poderia, enfim, retomar a investigação. Mas, retomar o que? Não havia nada a ser retomado e aquilo talvez fosse o pior.

A Árvore dos Frutos Envenenados - Degustação Where stories live. Discover now