Capítulo 4 - Parte 1

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Indignada e enfurecida, Cecília deixou a delegacia caminhando apressadamente em direção à hospedaria. Planejava ficar no quarto e se distrair com alguma leitura até a hora do jantar, porém ao chegar ao local, dona Violeta a esperava para um lanchinho da tarde.

— Venha, cara mia! Fiz um bolinho de fubá que está quentinho! – argumentou a senhora ante às negativas da moça. Seria ela a única hóspede?

Com relutância, a tenente deixou o quepe sobre a mesinha da sala e juntou-se à idosa na mesa posta com capricho. Uma toalha branca com flores coloridas bordadas contrastava com a madeira escura da mesa que cheirava a óleo de peroba. Duas xícaras de porcelana com detalhes dourados, um bule de café, dois pratinhos e um belíssimo bolo fofinho e quentinho a esperavam. Cecilia teve de admitir que, desde a adolescência, não tomava um lanche da tarde como aqueles e um sentimento de saudade apertou-lhe o peito. Eram lembranças que ela fazia questão de guardar em um canto longínquo da mente e de onde não tinha intenção alguma de retirar, como aqueles arquivos de aço que vira na delegacia. Felizmente, dona Violeta gostava muito de conversar e não lhe deu tempo para pensar mais sobre aquilo, questionando-a sobre sua viagem, a vida em São Paulo, a ida à delegacia. Cecília, por sua vez, respondia da forma mais neutra e educada que encontrava. Não era dada a falar muito de si, muito menos, sobre a investigação.

Desta forma, tentou virar o jogo lembrando-se do que Nelito lhe dissera sobre a dona da pensão e assim, começou a perguntar sobre a cidade, as pessoas, tudo na tentativa de entrar sutilmente no assunto "Clarice". Porém, a conversa foi interrompida quando ambas ouviram a porta da rua se fechando. Dona Violeta olhava para o corredor às costas de Cecília, aparentemente também surpresa com aquela visita fosse de quem fosse. Em instantes seu semblante se iluminou enquanto exclamava.

— Dudu! Que surpresa boa!

— Oi, mama... – respondeu uma voz masculina em um tom de evidente constrangimento ante o apelido carinhoso.

Cecília viu quando o dono daquela voz se inclinou para beijar a mãe na face, lançando-lhe um olhar de esguelha em um misto de espanto e curiosidade.

— Essa é a nossa nova hóspede, tenente...

— Venturini. – completou Cecília levantando o rosto na direção do recém-chegado.

A curiosidade no semblante do visitante restou ainda mais acentuada ao deparar-se com o aperto firme da tenente, algo tão incomum para uma mulher. O filho de dona Violeta era um homem na casa de seus trinta anos, com cabelos e olhos castanhos-claros em um rosto ligeiramente comprido. Diferentemente dos demais homens com quem estava acostumada a lidar, Cecília notou que ele não usava terno e gravata, ao contrário: usava calças jeans e sua camisa branca tinha as mangas enroladas até os cotovelos revelando braços entre o avermelhado e o bronzeado.

— Muito prazer. Eduardo.

— Não sabia que viria hoje! Venha, sente-se e tome um café conosco! – dona Violeta levantou-se para buscar mais uma xícara e um pratinho onde depositaria uma fatia generosa do bolo.

— Vim até a cidade buscar alguns suprimentos para a fazenda e pensava em retornar mas então... – iniciou Eduardo, depositando o chapéu que trazia nas mãos em cima da pia da cozinha onde lavou as mãos. — Não se fala de outra coisa na cidade que não seja a chegada da policial vinda de São Paulo!

Eduardo secava as mãos e encarava Cecília com um ar divertido. A tenente, por sua vez, tomava um gole de seu café com o olhar fixo no bule à frente, inexplicavelmente constrangida. O homem sentou-se ao seu lado, entre a genitora e a hóspede, servindo-se de café enquanto a mãe falava.

A Árvore dos Frutos Envenenados - Degustação Onde histórias criam vida. Descubra agora