INTRODUÇÃO (EPÍSTOLAS)

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EPÍSTOLA 1/ 21 de junho de 1968

Durante toda minha carreira jornalística, nunca vi figura tão impressionante como Dmitri Ivanovich, sobre quem decidi narrar a vida.

Nesta manhã, fui a seu apartamento em Ipanema. Dona Maria das Dores, sua empregada, recebeu-me com café e biscoitos, enquanto eu, sentado no sofá branco e olhando para sua coleção de discos, com nomes que iam de Tchaikovsky até Beatles.

Eis que, uma figura velha, corpulenta, bastante rechonchuda e com alguns fios de cabelos brancos sobre a cabeça adentra a sala. Apesar de muitos poderem olhar com uma pitada de desprezo aquela criatura, senti que estava perante a um rei. Via-me já curvado, prestando reverencia àquele nobre homem.

Ele sentou na poltrona igualmente branca e acendeu um cigarro. Todas suas ações a mim pareciam majestosas. A maneira como qual ele fumava e depois como tomou a xicara de café associavam-se as de um aristocrata europeu.

Não sabia como dar início a conversa que tanto desejava. Tirei de dentro da minha maleta um  bloco de anotações e uma caneta. Minhas intenções para com a sua vida já eram de prévio conhecimento.

O resto de nossa conversa deu-se de forma bastante natural. Fiquei aproximadamente quatro horas e vinte cinco minutos ouvindo aquela maravilhosa história de vida. Diferente de muitos outros, Dmitri Ivanovich não escondeu o lado obscuro de sua carreira, e nem os mecanismos políticos que usou para se alçado a posição onde está.

Dei saída de seu apartamento como todas as anotações e fotos que julguei serem uteis para o desenvolvimento de meu trabalho.

Por enquanto, isto é tudo.

Paulo Mendonça

EPÍSTOLA 2/ 26 de junho de 1968

Este é um dia que ficara marcado para sempre na história deste país. Á tarde, logo após voltar do almoço, observei da janela de meu escritório as ruas da Cinelândia serem tomadas por manifestantes.

Intelectuais, artistas, políticos, intelectuais e estudantes, lideravam a passeata, que se tornava uma das maiores de nossa história republicana.

Quando observei a faixa com o dizer "Abaixo a ditadura. O povo no poder", percebi logo sobre o que se tratava. Veio a minha memória as imagens das prisões arbitrarias promovidas pelo governo.

Em 1964, quando dava meus primeiros passos na carreira jornalística, apoiei ferrenhamente a tomada do poder pelos militares. Mas, hoje, vendo cada vez mais o abismo em que estamos prestes a cair, arrependo-me de tê-los apoiado.

Saindo do trabalho, uma confusão tomava conta do edifício logo a frente. Era a redação do jornal pertencente a Dmitri Ivanovich. Um furor de pessoas desesperadas tomava conta da porta principal. E eu, com minha insaciável curiosidade, fui ver do que se tratava.

Quanto mais me juntava àquele pandemônio, mais desorientado ficava. Eis que um homem alto, usando um chapéu panamá e utilizando óculos redondos, aproximou-se de outro homem e a ele disse.

- É oficial, Dmitri Ivanovich está morto!

Ao ouvir esta frase, fiquei bestializado. Há não muito tempo atrás, tive um encontro com aquele homem, o qual narrei em uma de minhas epístolas.

Voltei para casa nele, e no que este homem representou para nossa história. Meu interesse em biografa-lo era enorme, e com sua morte, ela só cresceu.

Penso eu, que a biografia do Paulo Martins da vida real será ainda muito mais bem vinda em nosso contexto político. É necessário que o cidadão médio brasileiro tenha o mínimo do conhecimento da história de sua terra, para assim entender que a solução adotada para resolver a crise ocorrida a quatro anos não foi a melhor disponível.

Contando a vida do homem que moldou o jornalismo e as comunicações no Brasil, vejo que os objetivos que quero atingir poderão ser alcançados.

Por enquanto, está é minha deixa.

Paulo Mendonça

Memórias Dmitri IvanovichΌπου ζουν οι ιστορίες. Ανακάλυψε τώρα