A Vendedora de Calcinhas Usadas

1.3K 45 38
                                    


Seu nome não era Renata. Renata era o nome que utilizava nos anúncios. Tinha cabelos curtos, era franzina e aparentava menos que seus vinte e um anos. Estirada no sofá-cama de sua quitinete, hesitava em pegar o celular que apitava na mesinha lateral. Suspirou entediada e esticou o braço para alcançar o aparelho. Três mensagens.

Oi Renata gatinha, ela leu, desgostosa. Cultivava o prazer secreto de dar descontos a quem sabia usar a vírgula após o "oi". Esses eram tão poucos que não balançavam seu orçamento. Prosseguiu com a leitura. Li seu anúncio e quero comprar uma calcinha sua. Impaciente, pulou para a mensagem seguinte sem concluir a primeira: Blz Renatinha? Hum... Abreviaturas como "blz", "flw" e "vlw" custavam uns dez reais aos incautos. E esse também não sabia separar o vocativo por vírgula. Zapeou inquieta para a terceira mensagem. Preciso que você me envie uma foto sua agora, vestindo a calcinha que eu escolher, para eu ter certeza de que você não é uma velha gorda ou um macho cabeludo.

Céus! Alguns dos que lhe escreviam não pretendiam comprar nada. Desses, a maioria se encaixava em duas categorias: os desocupados que queriam passar trotes e os que queriam se aproveitar do anonimato da internet para serem grosseiros com uma "puta" e se sentirem muito machinhos e briosos com isso. Em geral, não se negava a mandar uma foto com a calcinha escolhida (nunca mostrando o rosto, e de praxe cobrando por isso — às vezes, como cortesia para aqueles que julgava merecedores; e os critérios de merecimento eram diversos), mas os grosseiros não ganhavam foto nem pagando em dólar.

Para este último, decidiu não enviar resposta. Duvidava de suas boas intenções, e, de todo o modo, recusá-lo não lhe faria falta: já tinha uma razoável lista de espera, a ponto de considerar não aceitar nenhum cliente novo que não fosse indicado pelos antigos. Era um escudo — não infalível, mas algum escudo — contra aborrecimentos.

Começara aquele comércio para não ter que trabalhar. Não se sentia compelida a aceitar nenhum vínculo empregatício. Aliás, nem havia tanta oferta deles. Tinha apenas o ensino médio completo, mal chegara à metade da faculdade. O que faria, seria balconista de loja ou garçonete? Não via sentido algum nessas tarefas, nem em vender por uma ninharia horas e horas diárias dos supostos melhores anos de sua vida. Chegara a fazer algumas traduções e dar umas aulas particulares de inglês, mas a sensação era a mesma: desperdício de tempo, ora com textos sensaborões, ora conjugando o verbo to be pela milésima vez sem qualquer recompensa, fosse financeira — ganhava tostões —, fosse por meio de uma abstração qualquer como "autorrealização", que ela nunca sentira nem fazia a menor ideia de onde buscar. Se precisasse ser caixa de padaria, manicure ou assistente de almoxarifado para poder comer, não teria que pensar no assunto, o que seria um alívio. Mas não era o caso. Suas ambições de consumo eram modestas, e, bem ou mal, o dinheiro que ganhava estava bastando.

No entanto, seu métier, ela logo deu-se conta, incluía uma boa carga de trabalho diário, não se limitando a vestir peças de lingerie. Afinal, era uma atividade fácil de realizar. "Não requer prática nem tampouco habilidade," ela sussurrou para si mesma, com um risinho sarcástico. Consequentemente, a concorrência era enorme. Se não fosse solícita, diligente nas respostas às mensagens, e, sobretudo, se os potenciais interessados não tomassem conhecimento de sua existência, seriam fisgados por outras fornecedoras. E ela acabaria com uma gaveta cheia de calcinhas sujas e nenhum dinheiro na carteira. Ao menos trabalhava apenas para si mesma e não recebia ordens.

No início, anunciava em sites como Mercado Livre, mas se deparou com vários inconvenientes. Além da comissão cobrada, não podia falar às claras com os interessados, pois a seção de perguntas e respostas dos anúncios era pública, aberta a todos os usuários. Os e-mails do comprador e vendedor só eram divulgados um ao outro para que se falassem em privado depois de efetivada a compra, mas não poder explicitar os detalhes limitava aqueles que se arriscavam a fechar a transação. Ainda assim, ela conseguiu alguns clientes e começou seu trabalho de formiguinha. Depois percebeu que o comércio era mais vantajoso através de um blog pessoal: escrevia como e o quanto queria, divulgava seu e-mail à vontade e não devia comissões a ninguém.

A vendedora de calcinhas usadas e outros profissionaisOnde as histórias ganham vida. Descobre agora