Alessa me pegou pelo braço e começou a nos levar para a saída do museu. Ao chegarmos na rua, uma mulher se aproximou. Tinha os cabelos cacheados e aparentava estar na casa dos trinta, vestia jeans e uma jaqueta azul, e usava luvas de couro. Alessa sorriu para ela, porém, a moça não retribuiu, me olhava de um jeito estranho.
― Marcelo, essa é a Rita. Ela precisa muito da nossa ajuda.
Eu disse um oi, e Rita apenas maneou a cabeça, apreensiva.
Pouco depois, chegamos ao Café e escolhemos uma mesa nos fundos, distante das pessoas e perto das sombras. O lugar era bem aconchegante, meia-luz, paredes de tijolinhos repletas de pequenas esculturas sacras. O garçom jurou que eram obras do Aleijadinho, vai saber. Pedimos, e assim que o homem virou as costas, comecei a falar.
― Como diabos você sempre me encontra? É o remédio?
Alessa nem piscou, e Rita continuou séria e com os olhos grudados em mim.
― Não sei o que nossa amiga gótica aqui te disse, mas eu não mordo ― falei para a jornalista.
― Me desculpe. É que... É que é difícil de acreditar; isso que você faz... ― Rita finalmente falou, aparentando relaxar um pouco.
― Me fiz a mesma pergunta um ano atrás. Mas se Alessa te encontrou, então imagino que você também deva ter alguma... habilidade, certo?
Rita anuiu, e eu comecei a imaginar o que ela poderia fazer.
― Fala com os mortos? Lê mentes? Projeção Astral, talvez?
― Clarisciência ― Alessa adiantou.
Franzi a testa. O garçom voltou com nossas bebidas, nos serviu, e o agradecemos. Assim que ele saiu, Rita prosseguiu:
― Eu consigo ver o passado.
― Ual! Por essa eu não esperava. Mas assim, do nada?
― Não. Preciso tocar antes, tocar em qualquer coisa. Pessoas, carros, essa xícara de café, um inseto, qualquer coisa.
Olhei para as mãos dela, reparando novamente nas luvas.
― Ah, entendi. Então ainda está aprendendo a controlar?
― Sim. Alessa está me ajudando. Não sei o que faria sem ela.
Senti uma conexão com aquela moça, foi a primeira vez que encontrei alguém na mesma situação que eu.
― Marcelo, Rita é jornalista investigativa, das boas, e ela está fazendo um trabalho de suma importância para nós.
O 'nós' se referia a organização sinistra para a qual Alessa trabalha. Só os vi uma vez, e foi o suficiente.
― Agora estão atrás dela e não vão parar até que a matem ― continuou.
― E vocês não tem como protegê-la?
A gótica me encarou, estreitando os olhos.
― Esse é o seu papel.
Eu sabia que não tinha outro jeito, trato é trato, mas precisava tentar.
― Não precisa ser um dos grandes, um dajjal vai servir ― ela prosseguiu ―, mesmo porque, estamos enfrentando humanos.
― Bom saber.
― E você trouxe suas coisas?
― Sim, sempre ando com elas, nunca sei quando você vai aparecer. Só preciso de um corpo.
― Isso é comigo, como de praxe.
Reparei que Rita não tocou na bebida, ela ainda me encarava com os olhos arregalados.
― Posso perguntar qual é o problema ?
― Ela é católica, e praticante ― Alessa respondeu. ― Ainda está na fase da aceitação.
― Entendi. Pois bem, Rita, não se preocupe, será cem por cento seguro. E talvez você até goste.
Ela balançou a cabeça em uma negativa, moveu o tronco para o encosto da cadeira. Alessa terminou de beber seu cappuccino e, com calma, olhou para Rita:
― Será exatamente como lhe expliquei. Nem mais, nem menos.
Rita pareceu entender, concordando sem falar. Terminei meu suco, cruzando olhares com Alessa.
― Marcelo, vou te passar um endereço, é lá que você vai pegar o corpo. Nós vamos para o mesmo lugar, deveremos chegar por volta das dez. Hoje a gente resolve isso, então amanhã você já pode voltar para suas férias, que tal?
Era a terceira vez que ela me procurava, e como em todas as outras, sempre que ela terminava seu briefing, meu coração começava a bater mais rápido.
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O Artesão das Trevas
FantasiaUm freelancer consegue uma semana de férias. Animado, vai para Ouro Preto na esperança de curtir o Festival de Inverno da cidade. Mas nosso pacato profissional não é exatamente uma pessoa normal, e quando uma sinistra conhecida aparece, ele precis...