Parte 2 - Anarriê

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— Chega, Nêga, Seu Manel tá chamano pra quadrilha já

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— Chega, Nêga, Seu Manel tá chamano pra quadrilha já. — Tetê puxou Malu pela manga bufante do vestido amarelo ao escutar Seu Manel chamar os dançarinos da quadrilha ensaiada pro centro da Praça da Matriz. Elas estavam um pouco distantes, andando pelas barracas de comida espalhadas ao longo da rua.

— Vôte, tô terminano o espetinho ainda, tô namorano o Churrasco do Gordo desde que cheguei, nem venha. — Malu puxou o segundo coração de galinha do espeto contendo cinco, já querendo comprar 2 milhos cozidos que Dedé tava vendendo mais pra frente, com aquela manteiga da terra que Soinha fazia em casa e ficava especialmente gostosa no mês de junho.

O cheiro da panela quente e salgada borbulhava no ar e puxava Malu pela venta. Na mesma barraca, Dedé e sua esposa vendiam pipoca, canjica e pamonha, que eles faziam em casa e vendiam todos os dias nas pracinhas de Extremoz. Todo mundo era louco pela pamonha de Soinha.

As comidas de milho geralmente ficavam em cima de balaios, o que deixava tudo com um certo clima e um cheiro específico que em lugar nenhum, Malu sabia, iria ver igual.

Malu tinha passado o dia inteiro sem comer, o buxo gemia só pensando no São João, e não havia se decepcionado.

— Pois avia, mulher, a comida num vai sair correno não. — Os olhos de Tetê desceram até o busto de Malu, ao que ela pegou um guardanapo da Barraca do Gordo e começou a limpar uma mancha de gordura. — Sabe mais nem comer, óia, vai encruar isso.

— QUEM FOR PARTICIPAR DA QUADRILHA AGORA DAS 18:00, FAVOR COMPARECER À FRENTE DA PARÓQUIA, TÁ FALTANDO GENTE, AINDA! — Seu Manuel esgoelou.

— Chega, Nêga, bora. — Tetê puxou Malu pela mão que não estava escorregando na gordura dos 4 espetinhos de coração de galinha que ela havia comido desde que Seu Manuel a havia dispensado do posto que ocupou provisoriamente.

Um fato sobre Malu é que ela adorava coração de galinha e pamonha, especialmente essas duas coisas dentre tudo que era vendido durante a festa junina. Já tinha inventado de comer os dois ao mesmo tempo, o que não foi exatamente uma má ideia, por mais que ela nunca fosse admitir que não tinha sido boa.

Outro fato sobre Malu é que, durante os tempos de escola, ela só dançava com a peneira em todas as quadrilhas porque a quantidade de meninos e meninas na turma era desigual e nenhum garoto queria ser seu par.

Maria Luiza, Malu, ou Nêga, filha de dona Neném e seu Lourenço, do Restaurante Benfica, e neta de dona Felicidade, a costureira ali da Rua São Jorge, odiava dançar com a peneira.

Malu puxou o último coração, arrastando pelo espeto de madeira com os dentes cravados na carne enquanto era puxada entre as barracas pela amiga agoniada, e jogou o palito ainda morno no lixo.

Malu não queria dançar com a peneira, Malu queria comer queijo de coalho e banana assada com canela.

— Arra, bixiga! TETÊ, PERAÍ, MISÉRA! Vô ficar toda bamba desse jeito. Chega aqui preu me escorar em tu. — Malu puxou Tetê pra se encostar no ombro dela e ajeitar a alpercata que quase tinha destrambelhado o couro quando ela tropeçou num paralelepípedo mal posicionado na rua.

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